Quando somos pequenos dizem-nos que podemos ser tudo o que quisermos. No mesmo dia eu podia ser bailarina, astronauta, leão, lagarto... era só dar largas à imaginação! Quase tudo parecia infinito e cada dia era uma aventura. Lembro-me que com uma caixa de chocolates e uns lápis de cor eu tinha um mundo novo nas mãos; a caixa era um aparelho do futuro que alterava a forma dos objetos e pessoas, ou ainda um laboratório super secreto onde um vilão criava criaturas minúsculas que viriam a dominar o mundo.
E depois vamos para a escola. O feitiço quebra-se. De um momento para o outro deixamos de poder pensar por nós (ao contrário do que nos fazem crer). Não somos mais seres criadores, mas sim seres que têm de ouvir factos, debitados numa sequência viciada, sem margem para questionar seja o que for. De repente, há que guardar "a criança" num baú, para nunca mais a voltar a ver.
Começa assim um longo processo de formatação e selecção. Atribuem-nos um número, fecham-nos em salas e vão, pouco a pouco, restringindo os nossos interesses, para que no final escolhamos um caminho único, de preferência que nos proporcione estabilidade económica no futuro. Ao fim e ao cabo o que tentam fazer connosco não é muito diferente do que se faz com as sardinhas em lata. Agrupados por grupos, todos apertadinhos, ciências, artes, humanidades, e dentro dessas categorias é de toda a conveniência que haja uma espécie de cânone, pensamento e aceitação cega do que nos é transmitido.
Cada vez mais a preocupação com a realização pessoal é irrelevante. E se eu quisesse ser palhaça? Se fosse essa a única maneira de eu me sentir verdadeiramente feliz? Não podia seguir o meu sonho? Porque a profissão que escolhemos não pode trazer prazer, pois nesse caso não seria trabalho, mas lazer.
Para onde caminhamos? Querem formar algum exército de robôs? Pequenas máquinas industrializadas de gerar dinheiro? Sinceramente não consigo compreender.
Quero continuar a ver a caixa de chocolates com os olhos que eu quiser. Não quero ver só um bocado de cartão, com x proporções e marca y. Quero ver para lá do que se vê, sem que tenha de me sentir mal com isso. Não peço que me deixem ser pequena para sempre, não tenho quaisquer aspirações a ser um Peter Pan. Peço apenas que me deixem ter tempo, para explorar, criar, pensar! Eu quero, simplesmente, ver o mundo a cores.
Sou a Maria Costa, tenho 16 anos e sou de Évora. O meu mundo é a arte, seja a fazer música, a dançar, a pintar ou a escrever, é aqui que me encontro.
Fonte: Público
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