Como se não bastasse a completa desmotivação dos professores, a tentarem cumprir o programa em aulas preenchidas com gritos e ameaças para controlo disciplinar. Como se não fosse suficiente o tédio dos alunos, a mandarem mensagens de telemóveis escondidos, a responderem sem respeito às admoestações dos professores ou a agredirem-se nos pátios das escolas. Como se não fosse já insuportável o desinteresse dos pais, centrados no seu próprio trabalho ou a viverem o desemprego. Como se alguém pudesse esquecer a destruição da Educação para a Saúde (com realce para o completo desinvestimento na Educação Sexual) e o desaparecimento dos temas de cidadania e de formação cívica. Como se pudéssemos ignorar a confusão nos cursos vocacionais, a balbúrdia causada na prova dos professores, o fracasso na aplicação do tão apregoado Estatuto do Aluno ou o inaceitável caos da colocação de professores no início deste ano lectivo.
Para quem conhece o quotidiano das nossas escolas básicas e secundárias, o diagnóstico sobre o desempenho da atual equipa do Ministério da Educação (ME) há muito estava definido. Desde cedo se compreendeu que Nuno Crato e a sua equipa defendiam um ensino centrado nos exames, onde os bons alunos seriam permanentemente incentivados e os estudantes em dificuldades deixados para trás. A tutela desde sempre definiu como “estruturante” o ensino clássico de algumas disciplinas, abandonando à sua sorte as outras e não deixando lugar a nada que contemplasse a pesquisa e a criatividade de temas não definidos nos manuais. As turmas passaram a ser locais de confronto entre professores e alunos e, nos poucos locais em que as aulas funcionam, todos se organizam à volta da preparação dos testes e “do que vem para o exame”, sem que haja descoberta do que vai pelo mundo ou qualquer incentivo à construção do próprio saber.
Vivíamos assim neste diagnóstico sombrio do nosso ensino. A resignação de alunos, professores e pais era a regra. Havia a sensação de que a crise era profunda; e mesmo para as famílias com possibilidades financeiras para recorrerem ao ensino privado, o panorama não era animador: é verdade que ficavam à frente nas classificações das escolas, mas todos sabiam que a indisciplina imperava e a seleção de alunos era a única saída.
Veio agora o insuspeito Conselho Nacional de Educação (CNE) colocar o diagnóstico final no desempenho do ME. O CNE anunciou que, em 2012, 34,3% dos alunos tinham chumbado pelo menos uma vez; e demonstrou que a introdução recente de exames nos 4.º e 6.º anos (uma das marcas do consulado de Crato) “tem trazido, direta ou indiretamente, implicações na taxa de retenção”, que subiu, no 6.º ano, de 7,4% em 2011 para 14,8% em 2013; e no 9.º ano de 13,8% para 17,7%. Portugal, destaca o CNE, é o terceiro país da UE com maiores percentagens de chumbos, quando já se sabe que os resultados dos estudantes repetentes “são significativamente inferiores aos dos alunos que nunca foram retidos”. O CNE sublinha também os custos para as contas públicas que estas reprovações determinam, verbas que poderiam ser utilizadas no apoio aos alunos com dificuldades.
Tudo leva a uma conclusão: a equipa de Crato vai ter um triste final de mandato. As explicações dadas perante estes factos objetivos são dececionantes: ninguém defende passagens administrativas, o que queremos é que as escolas funcionem e os alunos progridam.
Daniel Sampaio
Fonte: Público
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