Na semana que amanhã começa, milhares de alunos das nossas escolas básicas e secundárias regressam à escola. Depois de três meses de férias, o entusiasmo não abunda e alguns reagem mesmo com manifestações de tédio ou protestos vários.
Como se chegou até aqui? É verdade que sempre custou deixar o divertimento e a ausência de horários rígidos do Verão, para começar a levantar cedo e a preparar testes, mas agora a situação está diferente. Educados com pouca exigência por pais indulgentes, os jovens de hoje privilegiam cada vez mais a cultura do descanso e do lazer. Centrados na Internet, vivem sempre conectados, recebendo e trocando informação a cada instante. A imagem ocupa agora o primeiro plano: preocupam-se com a sua aparência, fotografam-se a si mesmos várias vezes por dia, enviam esses retratos a amigos e colegas e não largam as redes sociais, atentos às diversas notícias e mensagens que não param de chegar. A clássica leitura de um livro é hoje uma ocupação rara em adolescentes e, se ainda é utilizada por bastantes crianças, não se prevê que assim continue por muito tempo.
É bom não esquecer, no entanto, que esses mesmos jovens têm uma grande curiosidade pelo mundo à sua volta, vibram cada vez mais com novas experiências no campo da música, defendem os seus pontos de vista com grande entusiasmo e convicção e, em regra, são mais frontais e verdadeiros do que foram os pais na mesma idade. Para conseguirmos que estudem e trabalhem mais, temos de compreender que o seu mundo mudou muito e que o esforço de aproximação tem de ser recíproco.
Infelizmente, as nossas aulas não acompanham estas mudanças. Embora esteja a haver uma evolução em certas escolas, muitas “lições” continuam a ser dadas de forma tradicional, ou seja, o professor a falar sem parar e os alunos a ouvir. Esta vivência escolar é, para os mais novos, totalmente oposta ao seu quotidiano, porque na família, junto dos amigos e na Internet, a sua voz é cada mais ouvida e respeitada, mesmo quando a mensagem não é respeitosa ou criativa.
Também a noção de disciplina na sala de aula não faz sentido para muitas crianças ou jovens, o que não podemos deixar de lamentar. Junto do grupo de colegas, são elogiados (às vezes invejados) os alunos capazes de ridicularizar o professor, ou aqueles que não aceitam as suas recomendações e castigos. A indisciplina na sala de aula é um signo desta geração de estudantes, que agora até atinge os primeiros anos do ensino superior.
A visão da escola defendida pela actual equipa do Ministério da Educação (ME) não promove o improvável entusiasmo dos estudantes. Ao privilegiar os testes e os exames, o ME contribui para matar a natural curiosidade dos jovens em aprender, ao mesmo tempo que liquida o gosto para inspirar o futuro dos alunos, ainda existente em muitos professores. A educação será cada vez menos estimulante se apenas se centrar em adquirir “estratégias” para ter sucesso nos exames.
Como já foi estudado no Reino Unido, a insistência nos exames tem duas consequências negativas: diminui a auto-estima dos alunos com dificuldades académicas, porque não conseguem obter bons resultados; e afecta a qualidade do ensino, porque “estreita” os horizontes dos programas e o interesse dos alunos por outros temas.
Espero que o regresso às aulas possa trazer de volta o entusiasmo que tanto tem faltado nas nossas escolas.
Daniel Sampaio
In: Público
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