sábado, 16 de maio de 2015

“A escola tradicional está colapsando”, entrevista a Noemi Paymal, antropóloga

A nova geração de crianças inquietas que chegam às escolas de todo o mundo necessita de uma escola nos antípodas da tradicional. Ou, o que é o mesmo, uma instituição que não confunda crianças agitadas com hiperatividade ou com défice de atenção, que motive os alunos, que não os entedie nem os disperse. Uma escola vital, “biointegral” que baseie as técnicas de ensino nas emoções sem descuidar o intelecto. Em traços gerais, esse é o desejo de Noemí Paymal, antropóloga francesa que trabalha há anos na América latina.

A especialista em educação alternativa e diretora do Centro de Investigação Pedagpogia 3000 La Paz, na Bolívia, assegura que existem ferramentas muito fáceis e efetivas para lidar com as crianças do “terceiro milénio”. Fala de uma pedagogia holística que entenda e atenda as necessidades das crianças e dos jovens de hoje.

- Muitas vezes, os professores dizem que não têm ferramentas para incluir as crianças hiperativas. O que podem fazer?
- As investigações demonstram que 80 por cento das crianças de agora mudaram a sua forma de aprendizagem, o seu nível afetivo, o seu interesse emocional; o hemisfério direito é mais rápido, pode fazer várias coisas ao mesmo tempo, é autodidata e tem múltiplos interesses. Existem muitas ferramentas desde o físico, o intuitivo, o emocional, o multicultural, o ecológico, o ético.
Existem muitas ferramentas pedagógicas atualmente que visam o desenvolvimento de várias áreas do ser humano, desde o físico até ao intuitivo, emocional, o multicultural, o ecológico, o ético...
Antes apontava-se apenas para o intelectual, o cognitivo. E já sabemos que não funciona.

- Algum exemplo?
- Por exemplo, podemos começar por recuperar todos os níveis de desenvolvimento do corpo. A criança tem de se mover a cada 20 minutos no ensino primário e, se for mais pequeno, tem de fazê-lo o tempo todo. Dizer-lhes para não se moverem é como pedir à planta não cresce ou ao sol que pare; é a sua natureza e há que ancorar o conhecimento com o movimento.

- Isso vale para todas as crianças?
- Em 80 por cento das crianças de agora é assim. Não são hiperativas, apenas têm necessidade de se mover, têm múltiplos interesses. Eles precisam de jogar quase todo o tempo até aos 10 anos. A criança de hoje não é linear, é holístico, vê tudo de uma vez. Se o hemisfério direito não é usado atrofia e depois chega-se a uma sociedade intelectual como a nossa, que não é equilibrada.

- Essas características são as mesmas em todo o mundo?
- É igual nos 15 países que temos investigado. Como antropólogos estamos propondo uma mudança da humanidade no seu conjunto, a mudança é muito rápida. Tem ocorrido nos últimos 40 anos, o que não é nada em comparação com a evolução da humanidade.

- Como se adaptaram as escolas a essa mudança tão rápida?
- Não se adaptaram. Eu não culpo qualquer professor ou sistema porque foi mais rápido do que a capacidade de lidar com o assunto. Antes, as mudanças eram lentas, havia ligeiras diferenças entre gerações. Agora são tão rápidas que a criança ultrapassou o pai e os professores. Há que reconhecer e atender a esta velocidade.

- O que gera a falta de adaptação?
- Que as crianças a passam mal, daí as altas taxas de suicídio nos adolescentes e depressão infantil no mundo. Também o professor a passa mal porque não tem ferramentas, porque na sua época não era assim. E a passam mal os pais. Bem, toda a sociedade sofre.

- Que ferramentas pedagógicas se podem usar?
- Ferramentas cognitivas, e também ferramentas emocionais, biointeligentes ou biolúdicas, as "intuitivas" e as ferramentas que trabalham na conexão mente-coração.
É claro que vamos continuar a ensinar com ferramentas cognitivas, mas lúdicas e com desafios. A criança vai fazer o seu processo até encontrar a solução. Um bom professor não deve dar a solução, tem que esperar para a criança a. Outra ferramenta é a emocional. Há que trabalhar sempre a autoestima, reconhecer os seus sentimentos e o do outro. Isso previne os problemas de violência. Há ferramentas biointeligentes ou biolúdicas com que se trabalham todos os aspetos do ser humano. Não se deve concentrar tanto no intelectual e não importam as notas. Estão também as ferramentas sensíveis e intuitivas, com as quais a criança pode realizar jogos para sentir a energia. As crianças são muito sensíveis, embora sejam inquietos e teimosos, que é muitas vezes uma fachada para proteger a sensibilidade. Nas investigações que fizemos, 80 por cento dessas crianças têm hiperestesia, uma sobreativação de todos os sentidos físicos. Se alguém grita, ele sente-o mais forte. A sua visão é mais aguda. As ferramentas biointeligentes funcionam por si sós (tricotar, cozinhar, jardim). Há também ferramentas que trabalham na conexão mente-coração, de onde se afiança a força pessoal.

- Por que se crê que as crianças de hoje são como são?
- A lógica fala de meios mais estimulantes nos meios de comunicação, do bombardeamento de informação desde o nascimento. São tecnologicamente mais avançadas, mas também emocionalmente maduras, com uma perceção precoce e uma sensibilidade que não tínhamos pensado. Cremos com a chegada do computador teriam uma visão individualista, mas nascem com uma suprassensibilidade, uma perceção elevada, o que nos dá muito incentivo. As crianças são uma manifestação desta mudança maciça. E porque é maciço, a escola está em colapso.

- Quanto potencial é desperdiçado quando não há o estímulo necessário?
- Mais da metade (para dizer algum número). O fator emocional é mais importante do que o intelectual. Se uma criança não está tratada na sua parte emocional retém apenas 20 por cento dos dados da turma. Quase não vale a pena ensinar.

- A educação alternativa é aplicada em pequenos grupos?
- O ideal é ter grupos de oito a onze crianças e dois adultos. Se não for possível, o professor pode dividir a classe em vários grupos, fazer ilhas com mesas e trabalhar em grupo. Eu gostaria de ver os pais a ajudar por turnos, a oferecerem-se como assistentes. Há que pensar que é um desafio ao qual devemos dar uma solução agora. Procurar ferramentas para as quais a criança possa canalizar a sua tremenda energia e criatividade.

- Um sistema assim é muito difícil de implementar massivamente. Existe outra alternativa?
- Sim, por exemplo, realizar atividades extracurriculares. Basta uma vez por semana, a criança ou o jovem tem um lugar "seguro emocionalmente" onde pode fazer o seu processo pessoal, recuperar a sua autoestima, "conectar-se". Ou proporcionar técnicas anti-stresse para professores e pais, porque se eles estão bem, as crianças estarão bem nas aulas.

- Quais são os resultados desde o académico?
- A criança atendida a todos os níveis de desenvolvimento terá conhecimento mas, também, para além disso, será equilibrada como cidadã, como um ser humano.

Para um melhor conhecimento, consultar Pedagooogía 3000Noemi Paymal

Nota: Tradução livre pelo autor e editor do blog.

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