A Educação e a Saúde são das principais áreas económicas dos países civilizados e, por isso, muito apetecíveis para o poder central e local, gravitando à sua volta muito dinheiro. Talvez por isso, a transferência de competências para os municípios naqueles setores volte a estar na agenda política dos nossos governantes, protagonizada pela Secretaria de Estado da Administração Local e supervisionada pelo Ministério das Finanças, mais do que pelos próprios ministérios, cujas competências/funções se querem descentralizar.
A municipalização da Educação (outros, não concordando com o termo "municipalização", usam "territorialização"), processo que não vai parar, poderá ser contraproducente, se for imposta pelo Governo, descurando os interesses e opiniões dos municípios; considera-se aceitável a tentativa de experiência-piloto durante quatro anos, embora o timing para a discussão e implementação não tenha sido bem escolhido (final do ano escolar!), adivinhando-se que o assunto venha a reboque de candidaturas aos fundos comunitários.
No entanto, e antes de mais, devem ser definidas objetivamente as competências/funções a transferir, sendo desaconselhável que, em nome da “eficácia e eficiência” e da proximidade (a principal mais valia), valha tudo. Uma correta e clara definição de competências/funções a nível central, municipal e escolas evitará posteriores conflitos de interesses e deverá ser salvaguardada.
Não se pretende que em cada município exista um mini-Ministério da Educação (ME) ou extensão, desresponsabilizando-se por completo este setor governamental e, muito menos, que se criem empresas municipais de Educação que retirariam as escassas margens de autonomia (invadindo o teor dos contratos de autonomia celebrados entre o ME e as escolas) de que os estabelecimentos de ensino dispõem, abrindo lugar à politização e dependência nefasta local de uma área, cujos profissionais bem dispensam.
As câmaras municipais já intervêm, em parte, nalguns setores (para além dos transportes escolares e outros), no âmbito da educação pré-escolar e 1.º ciclo e, por isso, têm uma experiência que não deve ser desperdiçada (embora o grau de responsabilidade seja outro). Entendo que a gestão de recursos humanos – pessoal não docente e assistentes técnicos e operacionais (a empregabilidade é um dos maiores poderes e, por isso, muito apetecível…) –, a gestão dos edifícios escolares e a ação social escolar podem ser transferidos. O ME, para além do mais, continuaria a gerir os recursos humanos (pessoal docente), os assuntos pedagógicos e a ter papel regulador. Sabemos o quão tentador seria para algumas autarquias a gestão do pessoal docente, mas julgo que nem material nem mentalmente o nosso país está ou tem condições para dar um “passo maior que a perna”.
A oferta de cursos deveria ser atribuída à autarquia e escolas, por via da articulação a nível municipal e do planeamento da rede escolar, auscultado o ME. É dos assuntos mais sensíveis e polémicos, pois todos os anos os estabelecimentos públicos apresentam queixas em relação aos privados, que acusam de serem beneficiados em relação ao número e tipo de cursos que lhes são autorizados.
O maior perigo deste processo tem a ver com o comportamento das autarquias. Na verdade, e dando como exemplo a promoção das atividades de enriquecimento curricular, se algumas foram promotoras das mesmas e realizaram um trabalho muito bom, outras subestabeleceram em entidades privadas pelos mais diversos motivos, o que, no caso em apreço, será totalmente desaconselhável e, eventualmente vedado, em contrato de execução.
Por último, proponho um debate amplo e alargado desta questão, por forma a que o consenso seja atingido, e um pacto celebrado para ser cumprido, independentemente da composição do governo que, no nosso país, é periodicamente alternado. As questões estruturantes da Educação merecem não fazer delas constantes salas de experiências que, quantas vezes bem-sucedidas, são deitadas ao lixo, sabe-se lá porquê.
Filinto Lima
Professor/director de agrupamento
In: Público
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