Mais autonomia, mais concorrência entre modelos diferentes de escola pública. Esta é a linha de sempre do ministro da Educação e Ciência, Nuno Crato, cujo aprofundamento faz parte do programa da coligação para a próxima legislatura. O ministro defende o trabalho feito nesta frente e considera que os directores das escolas - que estão mais perto dos alunos do que a máquina do ministério - devem ter mais autonomia na contratação de professores e na gestão orçamental.
Uma das matérias que está nas orientações gerais do programa da coligação é o aprofundamento da autonomia das escolas. Até que ponto está disponível a ir?
Autonomia o mais possível para as escolas. Uma das primeiras coisas que me aconteceram quando cheguei ao ministério foi receber um pedido de uma escola que queria mais 15 minutos de hora de almoço. Achei a coisa extraordinária, um ministro não tem nada a ver com o assunto. Outro exemplo: as aulas até ao momento em que entrámos eram de 45 minutos ou múltiplos de 45 minutos. Tudo isso estava completamente determinado [centralmente]. O número de minutos para cada disciplina semanal também. O que fizemos primeiro foi dizer que as horas em cada disciplina são da responsabilidade da escola, desde que se cumpra o mínimo. A duração de cada aula é da responsabilidade da escola. Passámos para as escolas uma série de responsabilidades que lhes dá maior liberdade. Queremos ter muito maior autonomia. A bolsa de contratação, por exemplo, dá grande autonomia à escola para definir critérios de contratação de professores para certas necessidades.
Mas se já avançou tanto, o que é que pode fazer mais nesta área?
Há muito a fazer.
Dê-me um exemplo.
No aspeto curricular já determinámos isso. As escolas deviam ter maior papel ainda na gestão dos seus professores, na escolha dos professores que vão para as suas aulas. As escolas deviam ter um maior papel ainda na gestão orçamental. Deviam ter certos limites e, depois, maior liberdade de gestão. A descentralização das competências, com o apoio das autarquias, é parte desse trabalho. Um processo em que nada é retirado das escolas, mas em que há coisas que são retiradas do Ministério da Educação.
As autarquias têm capacidade para determinar o número de alunos por turma. Essa descentralização dá às autarquias poderes que se calhar não deviam ter...
O número de alunos por turma tem máximo e mínimo definidos. Havendo recursos é possível fazer desdobramento de turmas e gerir outras ofertas, outros aspetos da escola, como o ‘curriculum'. O princípio é: liberdade na gestão, liberdade nos métodos, avaliação de resultados. Queremos avaliar os resultados e dar às escolas a liberdade para utilizarem os melhores métodos para obterem resultados para os seus alunos. Dá-me licença para mostrar a primeira página de um jornal?
Faça favor.
Não vou mostrar o jornal, só este título: "Escolas: professores oferecem aulas antes dos exames" [manchete do Diário de Notícias de 2 de Junho]. O subtítulo: "alunos do 9º, 11º e 12º vão ter aulas extra para se preparem para os exames. Escolas públicas estão a planear esses apoios com recurso a crédito de horas ou à boa vontade dos professores". Isto mostra um país diferente. Mostra da parte dos jornalistas uma atenção a estes problemas, da parte das escolas, dos pais, uma atenção aos resultados que não existia até há algum tempo. Queremos que os alunos tenham sucesso. E há liberdade nas escolas, que antigamente não existia, para ter as horas extra. Para utilizar essas horas que fazem parte das horas letivas dos professores para dar um apoio especial. Como há a boa vontade dos professores. Os professores em Portugal, na sua esmagadora maioria, estão interessados no sucesso dos seus alunos. E todos os diretores estão interessados em gerir os recursos para o sucesso dos seus alunos.
Sobre modelos de gestão e professores, uma das propostas que consta do programa da coligação são as escolas independentes [de propriedade e gestão dos professores]. A medida já estava no programa em 2011. Concorda com a medida? Porque não avançou nesta legislatura?
Vivemos durante estes anos momentos excecionais, de que já nos esquecemos um pouco. Há quatro anos, quando houve intervenção da troika, estávamos em pré-bancarrrota. Estivemos num período de vigilância, em que fomos obrigados a seguir determinado programa com grande atenção aos gastos. Na educação também foi necessária contenção de custos muito grande, sobre as contratações, a constituição de turmas. Um controlo centralizado, porque foi preciso imediatamente fazer com que os custos não disparassem.
Não havia condições para haver tanta autonomia?
No momento em que nós entramos no Governo estávamos preocupadíssimos em controlar todas as fontes de acréscimo de despesa.
Mas agora há?
Agora estamos um pouco melhor. Não estamos completamente à vontade, temos uma dívida pública ainda muito grande e temos ainda défice. Mas estamos muitíssimo melhor do que há quatro anos. Temos mais liberdade para pôr em prática outras medidas de descentralização.
Como esta especificamente?
Sim. Julgo que se pode avançar já para uma autonomia de escola que seja progressiva e que existam modelos concorrentes. É muito difícil de compreender, pelo passado de grande centralização, que possam existir modelos concorrentes. Escolas onde há um grande apoio das câmaras municipais. Escolas em que os professores a possam gerir. Em que o orçamento seja determinado de forma global e em que os professores, através dos seus diretores, através de órgãos de gestão, giram esses fundos. Pode haver vários modelos concorrentes e esses modelos todos beneficiam a escola pública. Esse tipo de concorrência podem empenhar mais as pessoas e tornar a escola mais sua, mais eficaz e mais virada para os alunos.
Fonte: Económico
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