A escola centrada na aprendizagem tem que saber fazer, inevitavelmente, três coisas, entre muitas outras. A primeira foi o grande debate francês dos últimos dois anos, baseado na ideia de um patamar comum de conhecimentos. Os franceses deram o título à sua nova reforma de “fazer com que todos os alunos tenham verdadeiramente sucesso”. A chave dessa reforma são as palavras “todos” e “verdadeiramente”. Isto é, não se pode continuar a apregoar, como se tem feito nos últimos cem anos, uma escola única, obrigatória, inclusiva, que no fundo está permanentemente a excluir. É importante que as crianças saiam da escola com um patamar comum de conhecimentos.
Mas será isso possível? Sim, se os professores mudarem suas práticas e identidades profissionais. Durante muito tempo nas escolas normais foi ensinado que numa turma há sempre um terço de crianças boas, um terço de crianças “assim assim” e um terço de crianças más. Portanto, um terço estava condenado ao insucesso inevitavelmente. Isto é impossível de aceitar dentro de um processo de inclusão. A ideia de que se pode alcançar um patamar comum de conhecimentos, que se pode atingir verdadeiramente sucesso, deve ser uma exigência dos docentes, é uma exigência civilizatória conseguir isso. Não se consegue isso por várias razões históricas, de resignação ou por questões de identidade da profissão. Falar de um patamar comum de conhecimentos é também falar de um compromisso ético dos professores, compromisso ético com esse sucesso. E os professores muitas vezes, infelizmente, não tiveram esse compromisso ético. Ainda hoje em Portugal, a profissão de professor muitas vezes reconhece como os melhores aqueles que reprovam mais alunos.
Cabe falar também da importância dos resultados escolares. Não há patamar comum de conhecimento se não houver a avaliação dos resultados escolares. Uma escola centrada na aprendizagem é aquela que o professor dá a melhor atenção aos resultados escolares dos alunos.
É também uma escola capaz de colocar em prática mecanismos de diferenciação pedagógica, a descoberta mais importante da pedagogia moderna, feita no princípio do século XX, quando se saiu da ideia da pedagogia simultânea, que era a pedagogia tradicional mais básica, isto é, tratar todos os alunos como se fossem um só, como uma massa uniforme, e passar a dizer que é preciso que cada aluno receba um tratamento diferenciado, específico. Mas as práticas dos professores continuam a ser excessivamente homogéneas e uniformes, e a considerarem pouco a capacidade de diferenciação pedagógica. Isso porque muitas vezes os professores têm dificuldade em recorrer ao elemento central da diferenciação pedagógica: a possibilidade (grifo do autor) do trabalho em cooperação dos alunos dentro da sala de aula. Se não houver o trabalho de cooperação entre os alunos mais e menos avançados, entre os alunos que têm maior predisposição para certas disciplinas e os que têm para outras, enfim, se não houver a possibilidade do professor não ser o único ensinante dentro da sala de aula, é impossível conseguir práticas de diferenciação pedagógica. A experiência da Escola da Ponte, em Portugal, que tem sido muito divulgada no Brasil, é um exemplo do trabalho de diferenciação pedagógica. Na sala de aula, o professor é mais um organizador das diversas situações de aprendizagem. Trata-se de uma escola extraordinariamente focada na aprendizagem.
Por fim, uma escola focada na aprendizagem deve ser um local onde as crianças aprendem a estudar, aprendem a trabalhar. Hoje há um défice claro: as nossas crianças aprendem pouco a estudar e a trabalhar. É um problema que se pode verificar nos países do sul da Europa, nas escolas portuguesas, italianas, gregas, em parte das francesas, e também nos países da América do Sul, diferentemente do que se vê nos países do norte da Europa, cujas escolas estão bastante focadas na aprendizagem do estudo, do trabalho, do trabalho autónomo, em grupo, no trabalho cooperativo. É central dispormos dessas ferramentas, principalmente quando se discute a importância da aprendizagem por toda a vida.
António Nóvoa (2007) "Nada substitui o bom professor".
In: Terrear
Nota: Foram efetuadas algumas adaptações ao texto original de acordo com o português nacional.
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