Os pais de deficientes mentais adultos confessam viver atormentados com o dia em que deixarão de poder ajudar os filhos, porque sabem que não existem lares suficientes no país para acolher todos os que precisam de cuidados especiais e permanentes.
Para responder a esta necessidade, um grupo de pais que se via a envelhecer e não encontrava respostas para os filhos uniu-se e formou, em 1994, a CEDEMA - Associação de Pais e Amigos dos Deficientes Mentais Adultos com o objetivo de criar um lar.
Dez anos depois, o sonho concretizou-se e no dia 22 de abril a associação vai inaugurar um lar em Odivelas, com capacidade para 24 utentes, que já está esgotada, disse à Lusa a presidente da associação.
"Infelizmente só estamos a responder a 10% das inscrições que temos", lamentou Maria Antónia Machado, comentando que "os pedidos são muitos" e há "muito poucas respostas".
A responsável desabafou que lhe faz "muita confusão" quando aparecem na associação "pais desesperados com filhos que saíram da escolaridade obrigatória, com paralisia cerebral e outras patologias, e não têm nenhuma resposta para eles".
Com um filho adulto com trissomia 21, Maria Antónia disse que o "grande terror" destes pais é "fecharem os olhos" e não saberem como será o futuro dos filhos.
Este medo também a "aflige": "Embora tenha outros filhos e esteja convencida que não deixarão o irmão para trás, também me pesa pensar no dia em que vou desaparecer e ele não vai ter o que teve até hoje, os carinhos, os cuidados médicos, os cuidados de toda a ordem, porque os irmãos têm as suas vidas profissionais".
"As pessoas têm o seu trabalho, os filhos vão para a escola, e o que vão fazer com este familiar com 40 ou 50 anos com deficiência mental? Não o podem levar para o trabalho, não o podem levar para a escola, fica sozinho? Contrata uma pessoa a tempo inteiro? Sai caro. Fica numa instituição? Não há", elucidou.
As soluções passam muitas vezes por os colocar em lares de idosos, que não têm uma estrutura adequada para os acolher, ou por ficarem em casa fechados à chave.
Perante esta realidade, o "grande anseio" destes pais é saberem que, quando desaparecerem, os "filhos ficam bem", numa resposta adequada às suas necessidades não só em termos de alojamento, alimentação e cuidados básicos, mas também em termos de ocupação e reabilitação.
Voluntária na associação, Rosa Carreto lamentou a "falta de visibilidade" deste problema e a "falta de apoios" para esta população.
"Há uma série de atenções" viradas para as causas das crianças, dos sem-abrigo, "mas depois há outras tão nobres como esta que são completamente esquecidas porque não são visíveis", sublinhou Rosa Carreto.
Salientou ainda o facto de a maior parte das instituições ao nível da deficiência apenas apoiar crianças.
"As crianças crescem e precisam de um sítio especial e diferente do que os lares tradicionais podem oferecer, porque são pessoas com 20, 30, 40 anos e que têm necessidades diferentes dos idosos", justificou Rosa Carreto.
O dia-a-dia destes pais também é complicado, como conta Rosa Carreto: Não é fácil para pais com 50, 60 anos "lidar fisicamente" com os filhos adultos e com dificuldade de mobilidade.
"Há muitos casos em que as famílias desistem de tudo e ficam em casa com eles", acrescentou Maria Antónia Carvalho.
"Sabe o que são 20, 30, 40 anos a ter de se ocupar de uma pessoa a tempo inteiro sem poder sair", questionou, lamentando que a sociedade "faça de conta" que este problema não exista para "não ter de agir".
Na sua opinião, o Estado devia ter um papel mais interventivo: "Embora ultimamente se tenha falado muito em novos apoios e novos reforços para esta área, o facto é que as coisas não andam com a celeridade que deviam andar".
Oito a 10% da população sofre de problemas do foro mental e cerca de 2% tem perturbações de deficiência cognitiva.
In: DN por indicação de Livresco
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