Mais de um terço dos estudantes que frequentam o ensino obrigatório já chumbaram pelo menos uma vez e o fenómeno tem um custo de 250 milhões de euros anuais para os cofres do Estado. Os números são avançados no Atlas da Educação, promovido pela associação Empresários pela Inclusão Social (EPIS) e pelo Centro de Estudos de Sociologia da Universidade Nova de Lisboa (Cesnova), que é apresentado esta quarta-feira. A investigação traça um retrato da escola em Portugal com uma comparação a nível concelhio.
De acordo com o Atlas da Educação, 35% dos alunos do básico e secundário têm pelo menos uma retenção ao longo do seu percurso escolar. Tendo em conta que o custo médio por estudante no ensino obrigatório andará à volta dos quatro mil euros anuais, os autores deste estudo concluem que o desperdício “nunca será inferior a 250 milhões de euros anuais”. A estes valores teriam ainda se ser somados os custos de médio e longo prazo de uma saída antecipada do sistema de ensino sobre os quais não existem dados.
“A solução não passará necessariamente por proibir a retenção ou de a iludir pela busca de sucesso a qualquer custo”, defende a equipa do Cesnova, que foi liderada pelo sociólogo e antigo ministro da Educação David Justino. Os investigadores propõem que o combate ao insucesso escolar passe pela prevenção, mas, sobretudo, por “contrariar a cultura dominante” que aceita as reprovações dos alunos como algo “natural”. O sistema de ensino português “não está concebido para promover o sucesso e a equidade”, lê-se nas conclusões do documento.
O Atlas da Educação parte de uma investigação conduzida entre 2012 e 2013 por David Justino e será apresentado na tarde desta quarta-feira na Escola Secundária Camões, em Lisboa. O estudo faz uma análise de base nacional, mas também ao nível dos concelhos, estabelecendo uma espécie de cartografia do desempenho da Educação em Portugal nos últimos 20 anos.
Os autores cruzam três dimensões – retenção escolar, o abandono e os resultados dos exames do 9.º ano e do ensino secundário – permitindo agrupar os concelhos com características semelhantes, definindo cinco grupos. No ensino básico, entre os 308 municípios nacionais, apenas um quarto consegue atingir resultados indicadores de sucesso escolar (bons resultados nos exames, reduzido abandono e seletividade próxima da média nacional). Há 80 (25% do total) concelhos neste grupo, onde estão Porto e Lisboa, mas também capitais de distrito do interior como Portalegre. No extremo contrário, em 10% dos concelhos o dado mais significativo é insucesso escolar (por exemplo, Almada, Setúbal ou Lagos).
No entanto, a maioria dos casos (37%) destaca-se pela baixa retenção de alunos (casos de Braga, Coimbra ou Aveiro), ao passo que em 12% dos municípios, entre os quais estão Beja, Faro ou Espinho, o elemento distintivo é a incidência do abandono escolar. De acordo com o Atlas da Educação, há ainda 16 concelhos em que o sucesso dos resultados e o reduzido abandono são conseguidos à custa de uma “enorme seletividade” escolar através da retenção dos alunos (Amadora, Olhão ou Vinhais são disso exemplo).
O mesmo exercício para o ensino secundário sem alterações muito significativas. O sucesso escolar é o traço distintivo de 27% dos concelhos (entre os quais já não estão Porto e Lisboa, mas surgem Braga e Évora, por exemplo) e o insucesso manifestasse em 9% dos municípios (Bragança e Vila Real são duas das capitais de distrito que constam nesta lista).
Partindo desta análise concelhia, a equipa do Cesnova preconiza que a aposta na prevenção do abandono e insucesso escolar deve assentar num princípio de descentralização e de mobilização das escolas e das comunidades locais. De resto, os investigadores concluem que o sistema de ensino português apresenta “características muito marcantes de gestão centralizada”, o que poderá explicar “o insucesso dos grandes planos de reforma”.
O Atlas da Educação aponta ainda uma “manifesta contradição” entre o alargamento da escolaridade obrigatória para os 12 anos e a legislação laboral que permite o início da atividade laboral aos 16 anos. Por isso, os investigadores do Cesnova antecipam que “uma das soluções possíveis” seria a regulamentação do trabalho a tempo parcial entre os 16 e os 18 anos, que permitisse aos estudantes conciliar a escola com a integração no mercado de trabalho.
In: Público
Nota: Destacados da responsabilidade do editor do blog.
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