As crianças sujeitas a muitas restrições no uso das novas tecnologias tendem a desvalorizar os benefícios destas perante os adultos. É este o alerta deixado por Ana Francisca Monteiro, recém-doutorada do Instituto de Educação da Universidade do Minho, que acompanhou durante dois anos o dia-a-dia de duas dezenas de crianças.
Conselhos como “não fales com estranhos”, “não publiques fotografias pessoais”, “não percas muito tempo no computador” podem até ser contraproducentes para os mais novos, dada a sua conotação negativa, explica a autora da tese de doutoramento “Tem é de ser de mim: Novas tecnologias, riscos e oportunidades na perspetiva das crianças”.
O trabalho sugere que os mais novos sejam incluídos na promoção da segurança e dos benefícios da Internet, no sentido de compreender o papel que esta desempenha nas suas vidas e negociar estratégias compatíveis. “É necessário perceber e reconhecer a importância que as novas tecnologias têm para eles no contexto dos grupos de amigos. São muito mais do que ferramentas de lazer”, salienta a investigadora. E acrescenta: “São realmente poucas as formas de diversão, comunicação e convivência que, hoje, nas sociedades mais tecnológicas, são exclusivas das crianças, autónomas e privadas face ao mundo dos adultos. Elas valorizam muito esta autonomia, daí quererem protegê-la”.
Por outro lado, o estudo demonstra que esta autonomia beneficia o seu desenvolvimento. É quando está por sua conta que a criança aprende a considerar as dicas transmitidas pelos educadores, e isso acontece cada vez mais nos espaços mediados pela tecnologia. “As crianças em quem os pais confiam, a quem dão liberdade e orientação, crescem de forma mais saudável. Hoje, isso passa por deixar usar as tecnologias livremente”, realça a colaboradora do Centro de Investigação em Educação da UMinho.
A pesquisa suporta, ainda, a ideia de que as crianças mais novas estão menos expostas aos riscos, devido a uma utilização limitada, mas são também as mais sensíveis a determinados conteúdos. Os mais velhos preocupam-se principalmente com as questões de privacidade: “Contudo, fazem-no à sua maneira, reajustando as estratégias à forma como percebem e lidam com as novas tecnologias autonomamente”, contextualiza a investigadora.
Segundo Ana Francisca Monteiro, cabe às famílias ou instituições educativas decidir e negociar o uso de tecnologias de acordo com os seus valores e expetativas, sem esquecer, contudo, que este é um espaço central da vida e do desenvolvimento das crianças. Para os pais que não dominam estas ferramentas, fazem falta estruturas de apoio, sensíveis a esta perspetiva centrada na criança, afirma, para acrescentar: “Há um conjunto de ideias feitas que afasta os adultos dessa realidade, dos desafios que as crianças enfrentam no seu dia-a-dia. Os discursos excessivamente críticos e moralistas isolam os mais novos nos seus mundos”. A tese de doutoramento foi desenvolvida sob orientação de António José Osório, professor do Instituto de Educação da UMinho.
In: Braga TV por indicação de Livresco
1 comentário:
Estranha tese esta que coloca a tecnologia no centro do mundo e desloca as relações humanas para a margem...
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