Em Portugal, como em toda a União Europeia, as pessoas com deficiência têm maior probabilidade de viver no desemprego e na pobreza do que as outras. Em plena pandemia de covid-19 e a antecipar uma crise económica, Rui Coimbras, representante do Fórum Europeu das Pessoas com Deficiência, pede que não se deixe estas pessoas para trás e que, pelo contrário, se consolidem as medidas antes tomadas.
De acordo com o relatório anual do Fórum Europeu, lançado esta semana, encontravam-se em risco de pobreza e exclusão 28,7% das pessoas com deficiência que em 2018 viviam no espaço comunitário, 7,1 % acima da população global. Os valores oscilavam entre os 18,4% da Eslováquia e os 49,4% da Bulgária. Portugal estava mesmo em cima da média europeia. A última crise económica teve efeitos dos quais muitos ainda não recuperaram. Estónia, Luxemburgo, Alemanha, Suécia, Irlanda, República Checa, Lituânia, Itália, Holanda, Malta e Espanha ostentam taxas piores do que em 2010.
Os motivos da pobreza não são difíceis de descortinar. Por um lado, esta população tem menos hipóteses de entrar no mercado de trabalho. Naquele ano, a taxa de desemprego variava entre os 62,15% da Estónia e os 32,3% da Irlanda - Portugal aproximava-se dos piores (56,4%). Por outro, estas pessoas suportam custos adicionais relacionados com o facto de a sociedade não estar preparada para si. Os estudos disponíveis situam esses custos extra entre os 23.012 euros anuais na Suécia e os 14.550 na Bélgica. E os apoios sociais não chegam para atenuar isso.
Na opinião de Rui Coimbras, num momento como o que a humanidade atravessa agora, é pertinente ter estes dados bem presentes. “É muito importante que isto seja dito e é muito importante que se consolide o que tem sido feito para combater a pobreza e a exclusão das pessoas com deficiência”, começa por salientar. “Tudo indica que a seguir a esta crise sanitária vem uma crise económica. Há um risco de subir a pobreza e a exclusão e é preciso prestar atenção às pessoas com deficiência para não se deitar fora tudo o que se conquistou. Tenho estado em videoconferências internacionais e o slogan é: ‘No one left behind'. As pessoas com deficiência não podem ficar para trás”.
Desemprego aumentou 41%
Em 2017, criou-se em Portugal a Prestação Social para a Inclusão (90.886 beneficiários no final de 2018). Em 2018, arrancou o Modelo de Apoio à Vida Independente. Em 2019, foi aprovada uma nova legislação que obriga empresas a cumprir quotas mínimas (um a dois por cento) de trabalhadores com deficiência. Na última década, têm crescido as vagas em centros de actividades ocupacionais (15.448) e lares residenciais (6660). Há mais alunos com necessidades especiais a frequentar escolas de ensino regular, ensino profissional e ensino superior.
A evolução no mercado de trabalho tem sido muito lenta. Como já mostrava o relatório “Pessoas com Deficiência em Portugal - Indicadores de Direitos Humanos 2019”, do Observatório da Deficiência e Direitos Humanos, “entre 2009 e 2018 o número de desempregados/as com deficiência registados/as nos Centros de Emprego [até] aumentou 41% (em 2009 eram 8622, e em 2018 eram 12.135)”. Isso mostra, também, uma ânsia de mudança.
Um caminho estava a ser trilhado: subiu o número de colocações feitas pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional (de 646 em 2009 para 1564 em 2018), cresceu o número de pessoas a trabalhar tanto no sector público, como no privado. No público, somavam 17.607 em 2018, o que significava 2,58% do total de trabalhadores da Administração Pública, muito abaixo da quota de 5%. No privado, 11.657 em 2017.
O problema não se esgota no grau de incapacidade e no preconceito. O relatório do Fórum Europeu das Pessoas com Deficiência refere outros factores, como a inexistência de assistentes pessoais ou a existência de regras restritivas sobre quanto tempo podem dedicar a prestar assistência a uma pessoa com deficiência que dela precisa para trabalhar, mas tudo começa com a educação: “A educação de qualidade é um pré-requisito para entrar no mercado de trabalho, a exclusão da educação regular coloca as pessoas com deficiência numa enorme desvantagem.”
Rui Coimbras lembra que as crianças e jovens que frequentam o ensino regular estão particularmente vulneráveis desde que as aulas foram suspensas para evitar a propagação da covid-19. “Estamos a falar de alunos com necessidades especiais. Às vezes, é muito mais complicado usar uma plataforma digital ou usar um e-mail. Os próprios pais podem não ter condições monetárias ou conhecimento para conectar o filho ao mundo. É preciso salvaguardar que não ficam para trás. Isso é muito difícil, mas tem de ser feito”, alerta. Sob pena de se comprometer mais uma geração de pessoas com deficiência.
Fonte: Público
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