Especialistas defendem que o horário escolar deve ser adaptado ao relógio biológico dos alunos para melhorar o rendimento.
Quem lida com adolescentes, provavelmente, já os ouviu queixarem-se da hora a que começam as aulas. Demasiado cedo, na opinião de muitos, que reivindicam mais horas de sono. Esta reclamação ganhou força esta semana, depois de um grupo de cientistas do Reino Unido, que se prepara para testar a ideia, ter dito que seria mais benéfico para os adolescentes que as aulas começassem às 10.00. (...) o que pensam pais, diretores de agrupamento e especialistas na área da saúde em Portugal e a maioria aplaude a proposta, embora considere que já seria razoável se as aulas tivessem início por volta das 09.00.
Os padrões de sono tornam-se mais irregulares na adolescência. "Há na maioria dos adolescentes um atraso na hora de dormir, que tem que ver com aspetos biológicos (o sono chega mais tarde e o cansaço diurno é melhor tolerado) e sociais, como ver programas que dão a horas mais tardias, maior rendimento no estudo noturno ou estar preso a qualquer ecrã, num ritmo muito diferente do de uma criança", explica o pediatra Mário Cordeiro.
Como os adolescentes se deitam mais tarde, "o sono precisa de se prolongar também até mais tarde. O ritmo circadiano já não produz "pardais madrugadores" como em idades infantis". Por isso, começar as aulas mais tarde é, para o pediatra, uma boa proposta. " Todavia, ter horários só da parte da tarde já é errado, porque não sobra depois tempo para estudar, ter atividades desportivas ou culturais ou simplesmente "estar", ao fim do dia. Defendo que as aulas comecem às 10.00 e terminem o mais tardar às 17.30, 18.00", afirma, lamentando que "quem desenha os horários raramente pense nas diferentes necessidades de saúde e características dos vários grupos etários".
Enquanto esteve no ensino, Adalmiro Fonseca propôs várias vezes que as aulas começassem mais tarde. "Mas quem fazia os horários dizia-me sempre que não dava. Para o fazer, seria necessário alterar a carga letiva", esclarece o presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP). Na sua opinião, os atuais horários escolares, que começam geralmente entre as 08.00 e as 08.30, "não estão adequados ao relógio biológico dos adolescentes". Nove e meia seria "uma hora razoável, pois estavam mais sensíveis às matérias e rendiam mais." Para isso, destaca, "era preciso pensar mais nas crianças e menos nas matérias". Também os professores ganhariam com esta alteração. "Muitos corrigem testes e preparam aulas à noite", frisa.
A mesma opinião é defendida por Adelino Calado, diretor do Agrupamento de Escola de Carcavelos: "De manhã, os adolescentes estão adormecidos, com défice de sono. No secundário, pôr as disciplinas com maior necessidade de concentração de manhã não é a melhor opção." Este assunto ainda não chegou aos conselhos pedagógicos, diz Adelino Calado, mas já se discute nas salas de professores. "Se se diminuir a carga curricular, faz sentido começar às 10.00, porque os alunos estão mais despertos. Era bom olhar para as matrizes curriculares", destaca.
Já Filinto Lima, diretor do Agrupamento de Escolas Dr. Costa Matos e vice-presidente da ANDAEP, não vê com bons olhos a sugestão do investigador Paul Kelly. Este diz, citado pela BBC, que insistir num início precoce das aulas leva a privação de sono, problema com consequências para a aprendizagem e saúde dos adolescentes. "Não me parece que começar mais tarde seja a solução para aprenderem melhor. Considero que se deve trabalhar para que vão para a cama a horas", refere Filinto Lima. Reconhecendo que há professores que se queixam que os alunos estão sonolentos de manhã, o responsável diz que "é por estarem até altas horas nas redes sociais."
Paul Kelley vai coordenar o estudo "TeenSleep", no qual vão participar cem escolas, divididas em quatro grupos: um vai iniciar as aulas às 10.00 (dos 14 aos 16 anos), outro vai dar "educação do sono" aos alunos, o terceiro conjuga as duas medidas e o quarto não fará qualquer alteração. Segundo as previsões dos investigadores, os resultados deverão ser apresentados em 2018. A ideia já não é recente e há movimentos, nomeadamente nos EUA, para começar as aulas mais tarde. Segundo Paula Fonseca, especialista em Medicina do Adolescente do hospital CUF Porto, um Estado atrasou o início das aulas uma hora, há alguns anos, e houve uma melhoria no rendimento escolar.
"O ritmo biológico dos adolescentes é diferente do das crianças. Há um atraso de fase, que faz que entrem mais tarde no sono e, consequentemente, acordem mais tarde. Por isso se defende este atraso", explica Paula Fonseca. Para a especialista em Medicina do Adolescente, este é um assunto "pertinente e que deve ser levantado. Devemos pensar nisso e gerir horários em função dos ritmos biológicos". No entanto, a médica considera que "seria interessante ter estudos para perceber qual a melhor altura para começar".
O presidente da Confederação Nacional de Associações de Pais (Confap), Jorge Ascensão, reconhece que "devido à organização social, a organização das famílias não permite, muitas vezes, o devido descanso". "Se começar mais tarde for mais rentável, pode ser benéfico", refere. Mas questiona até que ponto "os adolescentes não se iam deitar tendencialmente mais tarde." Por isso, diz que apenas esta medida "não chega", pois é preciso "pensar na forma como está distribuído o tempo ao longo do ano".
Numa sociedade ideal, as aulas começariam mais cedo para uns e mais tarde para outros, consoante as necessidades de cada aluno. Quem o diz é Teresa Paiva, neurologista e especialista em sono. "Começar às 08.00 é uma violência para quem for noctívago. Entre as 08.30 e as 09.00 parece-me razoável para muita gente", indica a especialista. Se o início das aulas passasse para as 10.00, teria diversas implicações sociais, lembra, nomeadamente nos horários de trabalho dos pais.
Fonte: DN
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