Revisito neste título a conhecida frase o poeta espanhol Gabriel Celaya que escreveu em 1955 no seu livro “Cantos Iberos” uma poesia intitulada “A poesia é uma arma carregada de futuro” que se tornou famosa depois de ter sido interpretado por Paco Ibañez.
À primeira vista a frase do título parece uma evidência. Claro que a Educação tem a ver com o futuro antes de mais porque se dirige a cidadãos que irão deter a capacidade de ação e decisão nos tempos que estão para vir. Mas certamente não podemos avaliar o maior ou menor compromisso com o futuro a partir das idades das pessoas. Conhecemos certamente pessoas que sendo jovens estão saudosas do passado e pessoas idosas que anseiam pelas soluções e mudanças que o futuro trará.
A Educação relaciona-se com o futuro não só pelas idades dos seus destinatários mas sobretudo pela forma como lida, cultiva e acarinha os valores de futuro. Por isso, as opções que se tomam em Educação são muito reveladoras e claras sobre a ideias que temos sobre o que queremos que prevaleça no futuro. Estas opções são numerosas e complexas mas gostaria de me referir a quatro delas.
Pensar o futuro em Educação é antes de mais pensar quem são os destinatários do sistema educativo. A resposta rápida é todas as crianças e jovens que estão em idade de escolarização. Ao dizermos todas estamos a traçar uma meta extremamente ambiciosa. Defender que a Educação é para todos independentemente das condições e situações é uma meta justa e muito estruturante. Significa que a Educação deve chegar em condições de igualdade a alunos pobres e ricos, a alunos de qualquer origem social, económica ou cultural, significa que os alunos “bons” e os “maus” têm igualmente direito a educação de qualidade que não os diminua face às suas possibilidades de sucesso. Precisamos assim de defender uma escola que seja efetivamente universal.
Pensar o futuro da escola é também pensar numa estrutura que seja inclusiva. Inclusiva, neste contexto, significa que aproveite o que os alunos sabem, o que eles sentem e o que viveram para que possam todos enriquecer-se com a experiência uns dos outros. Um futuro inclusivo parte deste respeito básico pelo que os alunos já sabem. Na verdade não é possível ensinar nada a uma pessoa que não saiba nada. Todas as boas metodologias de ensino se procuram certificar, antes de mais, dos conhecimentos que os alunos possuem para poder estabelecer pontes, relações, entre o que se sabe e o que se tem de aprender. Por isso precisamos de estar cientes que todos os alunos têm uma experiência, uma personalidade, conhecimentos e culturas que precisamos conhecer para trabalhar a partir delas. A escola do futuro não se rende aos conhecimentos eventualmente numerosos e “diferentes” dos alunos: pelo contrário leva-os em conta para poder promover os alunos a estádios mais avançados do seu conhecimento. Precisamos pois de uma escola inclusiva, isto é, que não desista dos alunos e não incense ou lance anátemas sobre o que eles sabem ou sentem.
Pensar o futuro passa certamente também por imaginar uma estrutura quês seja criativa e não somente de reprodução de conhecimentos. De certa forma a escola vive neste equilíbrio: se por um lado se espera que forneça aos alunos as bases e conhecimentos fundamentais para participar e usufruir das oportunidades – o que John Dewey chamou “o património cultural da Humanidade”, também é certo que uma escola que se foque exclusivamente no ensino do conhecido corre o muito provável risco de se tornar obsoleta e desinteressante. A escola tem de estar comprometida com a inovação, com a inovação sobre o que se aprende e como se aprende. Aqui há uma larguíssima margem de ideias e modelos de relação e de aprendizagem em que a escola pode ser supletiva e inovadora face às experiências extraescolares que estão disponíveis.
Finalmente, pensar numa escola de futuro é torná-la uma estrutura democrática e participativa. A escola tem de ser uma escola de responsabilidade e de liberdade. Isto não pode conseguir só com aulas, com conselhos, com punições, com regulamentos, criar uma estrutura democrática significa que os alunos têm que ter oportunidades – e direito – a se pronunciarem sobre a vida da escola, a serem chamados e ouvidos sobre opções, problemas e recursos da escola, a serem chamados a colaborar e contribuir para a resolução de problemas que lhes digam respeito. Muitas vezes se tem medo – porque não se tem experiência – desta responsabilização. Lembro uma assembleia de escola que assisti há alguns anos na Escola da Ponte em Vila das em que o presidente da assembleia – com 9 anos – pedia silêncio aos colegas e aos professores presentes para “depois votarem com consciência”. Uma escola que ouça e valorize a participação dos alunos será certamente uma escola que prepara o futuro.
A Educação é uma arma carregada de futuro, se for universal, se for inclusiva, se for inovadora e se for emancipatória. Por isso precisamos de influenciar as políticas falando, agindo, mostrando e convencendo. O futuro anda rápido (quando comecei a escrever este texto ela ainda era futuro) e não podemos pois esperar. Chico Buarque já cantou há muito que “quem espera nunca alcança”.
David Rodrigues
Presidente da Pró-Inclusão – Associação Nacional de Docentes de Educação Especial, Conselheiro Nacional de Educação
Fonte: Público
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