terça-feira, 26 de setembro de 2017

REMODELAÇÃO DO DECRETO-LEI N.º 3/2008, DE 7 DE JANEIRO

4.º PONTO EM ANÁLISE: MEDIDADAS DE SUPORTE À APRENDIZAGEM E À INCLUSÃO
Sobre este ponto vou realçar, essencialmente, dois parâmetros que me parecem essenciais. O primeiro parâmetro prende-se com o facto de me fazer alguma confusão considerarem-se medidas que são, simultaneamente, de suporte à “aprendizagem” e à “inclusão”. Na minha ótica, dever-se-iam ter considerado separadamente. De certo modo, o Regime Legal para a Inclusão Escolar (RLIE) faz essa separação ao inserir um artigo (Artigo 5.º – Linhas de atuação para a inclusão) em que são explicitadas medidas que façam com que as escolas se preocupem com “a criação de uma cultura de escola onde todos encontrem oportunidades para aprender…”. É também importante que se anote que os conceitos de inclusão e de aprendizagem são bastante díspares. O primeiro diz respeito a um movimento que pediu a inserção das crianças e adolescentes com necessidades educativas especiais significativas (NEES) nas escolas das suas residências e, sempre que possível, nas classes regulares dessas mesmas escolas. O segundo, afirma-se como um conceito que, embora tenha sido definido por vários investigadores ligados à psicologia educacional de formas diversas e com significados divergentes, do ponto de vista humanístico deve focalizar-se na resolução pragmática de problemas com base nas experiências anteriores de um indivíduo, tendo em conta as características, capacidades e necessidades desse indivíduo.
O segundo parâmetro diz respeito ao Capítulo II do RLIE (Artigos 6.º a 10.º) onde se consideram, no que concerne às “Medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão”, “Objetivos”, “Níveis” e “Medidas” propriamente ditas. Este Capítulo pretende, a meu ver, estabelecer, como é dito no preâmbulo do documento, “uma tipologia de intervenção multinível”. Se realmente for esse o caso, então o preceituado nos artigos mencionados acima parece-me algo palavroso, repetitivo, pouco esclarecedor e até confuso. Dou apenas um exemplo que diz respeito ao designado “Relatório técnico pedagógico”(RTP). Considero que o uso do termo pode eventualmente levar a confusões, dado que no DL 3/2008, de 7 de janeiro, que este documento pretende alterar, no seu Artigo 6.º (Processo de avaliação) o RTP era elaborado depois da referenciação do aluno e dele deviam constar “os resultados decorrentes da avaliação, obtidos por diferentes instrumentos de acordo com o contexto da sua aplicação, tendo por referência a Classificação Internacional da Funcionalidade, Incapacidade e Saúde, da Organização Mundial de Saúde, servindo de base à elaboração do programa educativo individual.” Ora, O RLIE, a meu ver, com o pedido de elaboração do RTP não pretende nem uma coisa nem outra. Realmente, o que ele pretende é o que está estipulado no Artigo 21.º. Ainda sobre o RTP, não me parece de todo curial, caso as medidas universais, seletivas e adicionais correspondam respetivamente aos níveis I, II e III, que se considere a sua implementação em dois níveis diferentes (níveis II e III) fazendo apelo, em ambos os níveis, aos serviços de uma equipa multidisciplinar.
Explicando-me melhor. O nível I (Medidas universais) corresponde, grosso modo, ao preconizado pela investigação, ou seja, os apoios consubstanciam-se nos recursos e estratégias disponíveis para todos os alunos que deles necessitem. O nível II (Medidas seletivas), já mais individualizado, resume-se aos apoios que não estão disponíveis para todos os alunos, mas sim, são orientados para os alunos que apresentem problemas acentuados de teor académico ou comportamental (socioemocional). Neste nível, os apoios prestados por técnicos (psicólogos, terapeutas, etc.), para além dos prestados pelos professores (de turma e de educação especial), devem ser de consultadoria, o que não corresponde ao preceituado no artigo 9.º, ponto 4, em que se diz que, “A monitorização da implementação das medidas seletivas é realizada pela equipa multidisciplinar de acordo com o definido no relatório técnico pedagógico”. No nível III (Medidas adicionais), considerado o mais intensivo, os apoios devem incidir nos alunos com problemas severos que geralmente requerem uma diversidade de serviços de caráter mais intensivo (serviços de educação especial) existentes na escola ou nos centros de recursos que lhe estão adstritos. É neste nível que deve ser elaborado um programa educativo individual (PEI), se for caso disso.
Chegado aqui, sou da opinião que nos níveis que incorporam as medidas consideradas no RLIE, tendo por base os apoios referidos acima, seria mais adequado, no caso de um aluno ter de transitar do nível menos intensivo para o mais intensivo, que, no final de cada nível, se elaborasse um relatório que eu designaria de Relatório Educacional para todos os níveis, embora lhe acrescentasse “Inicial” para o Nível I, “Intermédio” para o Nível II e “Final” para o nível III. Do Relatório Educacional Final derivaria o PEI, quando fosse necessária a sua elaboração.
Para finalizar, vou tecer ainda mais uma consideração que se prende com o conceito de Relatório versus o de Programa. Um Relatório é um documento que descreve o resultado de determinado trabalho (no caso presente, da narração escrita e mais ou menos circunstanciada dos factos ocorridos e/ou dos dados recolhidos) adaptado ao contexto de uma determinada situação (de sala de aula e/ou fora dela), cuja estrutura, embora possa ser variável, deve conter, para além do cabeçalho (Ex.: Relatório Educacional Inicial), uma introdução onde se descreve o que se vai relatar, um corpo central em que são descritos os procedimentos, os resultados e feita uma análise, em termos académicos e comportamentais, dos aspetos que influenciaram a aprendizagem de um aluno, tendo em conta as suas capacidades e necessidades. O relatório deve conter ainda uma componente dedicada à síntese dos procedimentos e resultados, bem como eventuais recomendações, comummente designada por conclusão. Assim, nos dois primeiros níveis, os relatórios (Inicial e Intermédio) deveriam servir de transição para o nível seguinte, se for caso disso, informando os agentes educativos envolvidos na educação do (s) aluno (s) sobre o que já foi feito e, deste modo, dando-lhes pistas para a elaboração de novas intervenções. No caso do nível III (Relatório educacional final), as conclusões do relatório, caso necessário, devem dar lugar à elaboração de um PEI.
Por seu turno, um Programa pode, a meu ver, ser descrito como um plano de ação com o fim de atingir um determinado objetivo ou objetivos, devendo conter informação detalhada sobre o que deve ser feito, quando, por quem e que tipo de meios e/ou recursos são necessários para atingir esse objetivo ou objetivos. No caso do PEI, e tendo como referência o conceito acima, ele deve incluir um conjunto de objetivos educacionais específicos de forma a responder aos problemas de aprendizagem significativos que o aluno apresenta.
De certa forma, a interpretação que aqui é dada corresponde à filosofia contida no Modelo de Atendimento à Diversidade/MAD (Correia, 1997), um modelo de tipologia multinível. O MAD tem sido alvo desde final dos anos 90 de um caudal de investigação considerável, tendo sido os resultados dessa investigação muito favoráveis à sua aplicação em contextos escolares.
Luís e Miranda Correia

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