quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Reflexão sobre o Regime Legal da Inclusão Escolar – Proposta de alteração ao Decreto-Lei nº 3/2008, de 7 de janeiro

Após leitura cuidada do documento acima referido, em consulta pública, enquanto docente de Educação Musical, com especialização em Educação Especial e grau de doutora em Didática e Formação, no ramo da Supervisão, apresentam-se as seguintes sugestões, questões e considerações:
O Artº 4º, no ponto 3, refere que “Quando, comprovadamente, os pais ou encarregados de educação não exerçam os seus poderes de participação, cabe à escola desencadear as medidas apropriadas em função das necessidades educativas identificadas”. De que medidas estamos a falar quando no ponto 7, do artº 21º é referido que “A implementação das medidas previstas no relatório técnico pedagógico depende da concordância dos pais ou encarregados de educação” e no artº 22º que: “o relatório técnico pedagógico é submetido à aprovação dos pais ou encarregados de educação do aluno” (ponto 1), que o devem “datar e assinar” (ponto 2), e no “No caso do relatório técnico pedagógico não merecer a concordância dos pais ou encarregados de educação, devem estes fazer constar, em anexo ao relatório, os fundamentos da sua discordância” (ponto 3)?
Num e noutro caso (pais ou encarregados de educação que não exerçam os seus poderes de participação ou não concordem com as medidas sugeridas pela equipa multidisciplinar) que medidas apropriadas cabe à escola implementar se aquelas que foram consideradas necessárias pela equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva para o sucesso na aprendizagem e inclusão não podem ser aplicadas por falta de concordância dos pais ou encarregados de educação?
Sobre medidas universais, lê-se no artº 8º, ponto 2, alínea c), “O enriquecimento curricular”. Coloca-se a questão: em que contexto é realizado? Pelo professor do ensino regular no âmbito da sua disciplina ou extra horário letivo do aluno, por exemplo, num clube?
Neste mesmo artigo/ponto, na alínea e), refere-se “A intervenção com foco académico ou comportamental em pequenos grupos” – Pergunta-se, em que contexto? Em sala de aula com o grupo/turma, ou extra horário letivo? E com quem (docente do ensino regular, docente de educação especial, psicólogo, técnico, …)?
Sobre medidas seletivas, o artº 9º, no ponto 2, alínea a), menciona “os percursos curriculares diferenciados” – de que percursos estamos a falar?
No mesmo artigo/ponto, na alínea c) sugere-se que sejam referidos outros apoios para além do psicopedagógico, pelo que a redação desta alínea poderia ser: Os apoios de cariz psicológico, terapêutico, social ou médico.
A alínea d), indica “A antecipação e reforço das aprendizagens”. Coloca-se também a questão: esta antecipação/reforço realiza-se na modalidade de apoio em contexto de sala de aula com o grupo/turma ou fora do contexto de sala de aula e do grupo/turma?
E quem é que realiza este apoio? O professor do ensino regular/disciplina ou o professor de educação especial?
Na alínea e) deste artigo, “As adaptações ao processo de avaliação” são as que estão definidas no artigo 25º? Se sim, falta fazer essa referência pelo que se sugere a seguinte redação: “As adaptações ao processo de avaliação previstas no artº 25º”.
Na alínea f), o “Apoio tutorial” deve ser especificado, à semelhança do que se fez, por exemplo, com o “Apoio Tutorial específico” no artº 12º, do Despacho Normativo nº4-A/2016.
No artº 9º, ponto 3, lê-se que “ (…) compete às escolas decidir a mobilização e a operacionalização das medidas seletivas” – a quem se refere este ponto? À direção, ao conselho de turma, ao diretor de turma, ao docente titular do grupo/turma, à equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva, …?
Sugere-se ainda que se complete este ponto do seguinte modo: “No uso da sua autonomia (…) de acordo com o relatório técnico pedagógico produzido pela equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva”.
No artº 9º, ponto 4, o que se pretende com “A monitorização da implementação das medidas seletivas” pela equipa multidisciplinar? Esta deverá indagar se estão a ser implementadas a medidas apontadas no relatório; averiguar do sucesso alcançado com a implementação dessas medidas, …? Em síntese, qual/quais é/são o(s) objetivo(s) da monitorização que aqui é referida?
No artº 10º, no ponto 4, alínea c), a questão que se coloca é a mesma da alínea e) do ponto 2, do artº 9º: “As adaptações ao processo de avaliação” são as que estão definidas no artigo 25º? Se sim, falta fazer essa referência pelo que se sugere a seguinte redação: “As adaptações ao processo de avaliação previstas no artº 25º”.
Sugere-se ainda neste ponto, a introdução de duas alíneas, a saber: 
alínea h) Os apoios de cariz psicológico, terapêutico, social ou médico; 
alínea i) O transporte e deslocações em equipamentos específicos, tal como carrinha adaptada, cadeiras de rodas, andarilho, poney, elevador e rampa.
Também no artº 10º, no ponto 5, se coloca a questão apresentada no ponto 3, do artº 9º: a quem compete decidir a mobilização e a operacionalização das medidas seletivas? À direção, ao conselho de turma, ao diretor de turma, ao docente titular do grupo/turma, à equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva, …? Pela mesma ordem de ideias, sugere-se a mesma redação para este ponto: “No uso da sua autonomia (…) de acordo com o relatório técnico pedagógico produzido pela equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva”.
No artº 11º, no ponto 1, entende-se que se deve explicitar a alínea b) “Os técnicos especializados do foro terapêutico, psicológico, social e clínico.
Ainda neste ponto, dá-se a opinião de aditar como recursos humanos específicos de apoio à aprendizagem e à inclusão, uma alínea d) Docentes de diferentes áreas/disciplinas com formação em educação especial e que não estão colocados/lecionam no grupo de Educação Especial.
No artº 12º, no ponto 3, sobre elementos permanentes da equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva, aponta-se na alínea a), “um dos docentes que coadjuva o diretor”. Tendo em consideração os estudos desenvolvidos por Cole (2005), na Inglaterra e no País de Gales, sobre o papel do SENCO e Correia (2015), em Portugal, sobre o perfil de competências do coordenador da educação especial, entende-se que este docente deverá possuir uma especialização em educação especial, pelo que a redação deveria passar para: “Um dos docentes que coadjuva o diretor com formação especializada em educação especial”.
No ponto 6 do artigo anteriormente citado, sugere-se que se retire desta frase a expressão “o respetivo coordenador” e acrescente um ponto neste artigo sobre a eleição, o perfil, e as competências do coordenador da equipa multidisciplinar. Sugere-se assim:
Ponto 6 – Cabe ao diretor do agrupamento ou escola não agrupada designar os elementos permanentes da equipa multidisciplinar, o local de funcionamento e os tempos conjuntos disponibilizados para esse efeito.
Ponto?, alínea a) O coordenador da equipa multidisciplinar de apoio à inclusão deve ser eleito pelos elementos permanentes, devendo ser detentor de formação especializada em Educação Especial e formação especializada ou contínua em supervisão, ter uma larga experiência profissional na coordenação de uma estrutura de coordenação e no apoio/trabalho com alunos com necessidades educativas especiais;
alínea b) Além das competências estipuladas nos dispositivos legais para o coordenador de departamento, o coordenador da equipa multidisciplinar deverá possuir competências de comunicação, entre as quais as capacidades de saber ouvir, ler intenções e desejos e usar uma linguagem comum que conjugue o discurso de técnicos especializados e o discurso educativo para criar condições para uma intervenção educativa conjunta que envolva a escola, a família e os diversos serviços de atendimento (médico, terapêuticos e sociais);
alínea c) O coordenador da equipa multidisciplinar tem assento de pleno direito no conselho pedagógico.
No ponto 9, alínea b, sugere-se acrescentar a esta alínea o texto em itálico a azul: “Identificar medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão a mobilizar para responder a necessidades educativas”.
Na alínea c) do citado ponto 9 é referido “Acompanhar e monitorizar a aplicação das medidas de suporte à aprendizagem”. Considerando que a monitorização é o “acompanhamento sistemático de processos e programas baseado na observação e recolha de dados, visando determinado fim” (Alarcão e Canha, 2013, p.18), como e quando faz a equipa multidisciplinar estas intervenções?
Ainda no ponto 9, sugere-se a introdução de duas alíneas/competências à equipa multidisciplinar, a saber:
alínea g) interagir com os recursos específicos existentes na comunidade (equipa local de apoio à intervenção precoce, equipa de saúde escolar dos ACES/ULS, comissão de proteção de crianças e jovens, centros de recurso para a inclusão, instituições/serviços de atendimento e acompanhamento social do sistema de solidariedade e segurança social, serviços de emprego e formação profissional, serviços da administração local e estabelecimentos de educação especial com acordo de cooperação com o Ministério da Educação;
alínea h) organizar e coordenar a distribuição de recursos e outros suportes de apoio à aprendizagem e à inclusão;
No ponto 10, onde se lê “plano educativo individual” deve passar a ler-se “programa educativo individual”.
No artº 13º, no ponto 7, lê-se que cabe à equipa multidisciplinar acompanhar o funcionamento do centro de apoio à aprendizagem. Pergunta-se o funcionamento de quê, como, quando, e de quem?
No artº 19º, relativamente à constituição de turmas, sugere-se a redação de mais um ponto com a seguinte redação:
ponto 3 – Os/As grupos/turmas dos ensinos pré-escolar, básico e secundário que integrem alunos com relatório técnico pedagógico que fundamentem a necessidade de os inserir num grupo ou turma com número reduzido de alunos, são constituídas, no máximo por 20 alunos, não podendo incluir mais de dois alunos nestas condições.
No artº 21º, ponto 2, alínea c), sugere-se que apenas seja exigido no modo de operacionalização de cada medida a definição de objetivos, ou seja, excluir a necessidade de estabelecimento de metas uma vez que estas apenas são a tradução do objetivos em termos de quantidade e prazo e, tendo em consideração o que são as medidas seletivas e adicionais esta definição parece irrelevante.
Ainda neste artigo/ponto, na alínea d) sugere-se em vez de “O responsável pela implementação das medidas (…)”, O(s) responsável(eis) pela implementação das medidas (…).
Também neste artigo, no ponto 8, sugere-se a seguinte alteração à redação: “O relatório técnico pedagógico e, quando aplicável, o programa educativo individual, deve(m) ficar concluído(s) no prazo máximo de 20 dias …”.
No artº 22º, sugerem-se as seguintes redações/alterações:
ponto 1 - “O relatório técnico pedagógico e, quando aplicável, o programa educativo individual, é submetido à aprovação dos pais ou encarregados de educação do aluno (…)”;
ponto 2 – “(…) datar e assinar o relatório técnico pedagógico e, quando aplicável, o programa educativo individual”;
No ponto 3, do artigo citado (22º), se o relatório técnico pedagógico não merecer a concordância dos pais ou encarregados de educação, as medidas apontadas não são aplicadas conforme é referido no ponto 7, do artº 21º. Então como contrariar o insucesso do aluno na aprendizagem e/ou as suas dificuldades de inclusão se essas foram as medidas apontadas pela equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva?
No ponto 4, do mesmo artigo, não se entende o que é solicitado ao conselho pedagógico! A aprovação? Um parecer?
No ponto 6 do artigo 22º, sugere-se a seguinte alteração à redação: “O relatório técnico pedagógico e, quando aplicável, o programa educativo individual, devem ser revistos pela equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva no final de cada ano letivo, de modo a garantir que no início do ano letivo seguinte as medidas são imediatamente mobilizadas”.
No artº 25º, no ponto 2, sugerem-se as seguintes alterações à redação/acrescento:
alínea b) “Os enunciados em formatos acessíveis, nomeadamente, braille, tabelas e mapas em relevo, daisy, digital, e em suporte papel ampliados em formato A3”;
alínea d) “A utilização de produtos de apoio, designadamente, equipamento ergonómico, sistemas de lentes para ampliação, produtos para expandir e direcionar o ângulo de visão, pranchas para escrita, equipamentos de escrita em Braille, computador e periféricos, e máquina de calcular”;
alínea k) “A dispensa de prova oral ou prática se a sua incapacidade assim o exigir, sendo, neste caso, a classificação final da área disciplinar/disciplina a obtida na componente escrita da prova”.
Ainda neste artigo, no ponto 5, alínea c) “A adaptação do espaço ou do material, sempre que as condições aplicadas possam perturbar os restantes alunos, nomeadamente a aplicação de enunciados em Braille, em formato DAISY ou digital, a utilização de computador, o recurso a leitura orientada de enunciados ou outras”;
alínea f), sugere-se a explicitação desta alínea: “A realização de provas adaptadas de acordo com as necessidades de cada aluno, tendo por referência as condições aplicadas ao nível da avaliação interna ao longo do ano letivo e contempladas no programa educativo individual”.
Também neste artigo 25º, no ponto 6, explicitar a alínea b) “Acompanhamento por um docente para leitura orientada de enunciados, escrita das respostas ditadas pelo aluno, reescrita de respostas, ou auxílio no manuseamento de equipamento ou folhas de prova”.
Sugere-se ainda a inserção de um ponto no artº 25º, que seria o ponto 8 – Para os alunos que seguem o percurso escolar com adaptações curriculares significativas, independentemente do ano em que se encontram matriculados, deve-lhes ser dada a possibilidade de realizarem provas de aferição, provas de equivalência a frequência dos 1º, 2º e 3º ciclos, e provas finais de 9º ano de escolaridade na(s) área(s) disciplinar(es)/disciplina(s) onde o aluno revele interesse e a sua aprendizagem tenha como referência os conteúdos dos documentos curriculares em vigor, beneficiando para tal das adaptações ao processo de avaliação enunciadas no artigo 25º, nos pontos 2, 3 e 4”. A título de exemplo, dar a possibilidade a um aluno que está a frequentar o oitavo ano de escolaridade com adaptações curriculares significativas, fazer o exame na(s) área(s) disciplinar(es) de Português e Estudo do Meio, e Expressões Físico-Motoras do 4º ano de escolaridade e, no ano letivo seguinte realizar as provas de Matemática e Estudo do Meio, e Expressões Artísticas.
Finalmente, é-se da opinião de que neste Regime Legal da Inclusão Escolar falta definir as competências do professor de educação especial, assim como do coordenador da equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva. Nesta ordem de ideias e apoiada em Correia, 2005, sugere-se incluir no Capítulo III o seguinte:
Artº? – Competências do professor de Educação Especial As competências do professor de educação especial nas equipas multidisciplinares e no trabalho com diretor, professores, alunos e outros profissionais residem em:
a) colaborar na conceção e concretização do regulamento interno, do projeto educativo, do plano anual de atividades e do processo de autoavaliação da organização escola;
b) diagnosticar necessidades educativas, designadamente as dificuldades acentuadas e persistentes ao nível da comunicação, interação, cognição ou aprendizagem que exigem recursos específicos de apoio à aprendizagem e à inclusão;
c) definir as medidas a mobilizar para aumentar a participação do aluno na aprendizagem, na cultura escolar e na comunidade educativa e promover a sua evolução em termos académicos e comportamentais;
d) adequar o currículo às necessidades educativas do aluno ao longo do seu percurso escolar, nas diferentes modalidades de educação e formação;
e) efetuar planificações em conjunto com professores do grupo/turma;
f) apoiar os professores do ensino regular na elaboração de instrumentos de avaliação adequados ao processo de funcionalidade do aluno;
g) colaborar/coadjuvar o professor do grupo/turma (ensino em cooperação);
h) prestar ensino individualizado para desenvolvimento de competências específicas do aluno;
i) trabalhar diretamente com o aluno com necessidades educativas no contexto do grupo/turma ou no Centro de Apoio à Aprendizagem;
j) prestar aconselhamento a professores do ensino regular sobre diferenciação pedagógica, diversificação de estratégias e métodos educativos;
k) efetuar trabalho de consultoria (a professores, pais, e outros profissionais de educação);
l) orientar os assistentes operacionais no apoio à mobilidade e autocuidados dos alunos, nomeadamente no desenvolvimento de tarefas rotineiras (vigilância nos recreios e nas saídas ao exterior da escola, supervisão nas refeições e na higiene, deslocação à casa de banho e/ou para/de sala de aula/ginásio/pavilhão desportivo, e nas transferências), assim como na execução de tarefas instrucionais visando a realização de atividades programadas pelo(s) professor(es) que acompanham o aluno, no Centro de Apoio à Aprendizagem;
m) intervir na melhoria das condições e do ambiente educativo da escola numa perspetiva de fomento da qualidade e da inovação educativa;
n) detetar e apoiar a formação contínua de professores de ensino regular.

Bibliografia
Alarcão, I., & Canha, B. (2013). Supervisão e Colaboração: Uma relação para o desenvolvimento. Porto: Porto Editora.

Cole, B. A. (2005). Mission impossible? Special educational needs, inclusion and the reconceptualization of the role of the SENCO in England and Wales. European Journal of Special Needs Education, 20(3), 287-307.

Correia, L. M. (2005). Inclusão e Necessidades educativas especiais. Um guia para educadores e professores. Porto: Porto editora.


Correia, I.M.E. (2015). Contributos para a construção de um perfil de competências do coordenador da Educação Especial. Tese apresentada à Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Doutor em Didática e Formação, ramo Supervisão.


Isabel Maria Eufrásio Correia

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