Em 14 anos de rankings das escolas secundárias nunca as públicas tinham sido tão ultrapassadas pelos colégios como agora — para se encontrar a primeira no ranking geral é preciso descer até ao 34.º lugar, que é ocupado pela Raul Proença das Caldas da Rainha, com uma média de 12,41, numa escala de 0 a 20.
Já a secundária que costuma liderar as públicas, a Infanta D. Maria, de Coimbra, caiu da 32.º para a 36.º posição. O 1.º lugar pertence ao Colégio Nossa Senhora do Rosário, no Porto — lugar que já tinha ocupado mais duas vezes.
Não é que os resultados nos 8 exames com mais inscritos — que ditam a ordenação no ranking dos estabelecimentos de ensino, da melhor para a pior performance — tenham derrapado. Pelo contrário. Em 2014, em média, os alunos até se saíram melhor. Tanto no ensino público (onde a média passou de 9,27 para 10,25 valores) como no privado (onde subiu de 10,73 para 11,64). De resto, mais escolas conseguiram chegar a uma média positiva (216 no ano passado, 458 este ano).
A questão é: muitas escolas subiram as notas, mas os colégios privados que geralmente ocupam os primeiros lugares da lista subiram mais. As razões serão muitas (...). Mas há um aspeto em particular que parece continuar a ditar muito do sucesso: o contexto social e económico dos alunos.
Veja-se este caso: a congregação Salesiana na região de Lisboa tem três colégios, os Salesianos do Estoril, as Oficinas de São José, em Lisboa e a Salesiana de Manique, em Cascais. A diretora pedagógica da escola do Estoril, Paula Baptista, diz que nos últimos anos têm “tentado criar uma harmonização de procedimentos para que haja ‘escola salesiana’ e não ‘escolas salesianas’”. No entanto, os Salesianos do Estoril e as Oficinas, escolas essencialmente frequentadas por crianças de meios favorecidos, têm presença recorrente nos lugares cimeiros do ranking do secundário (este ano, são 4.º e 5.º). Já a escola de Manique, onde na maioria das turmas a frequência é gratuita por serem financiadas pelo Estado e que acolhe muitos alunos de meios mais desfavorecidos, não alcança este feito (embora permaneça na primeira metade da lista que ordena as 620 escolas do secundário, ficou em 204.º).
Em suma: estas três escolas privadas que têm em comum um projeto, um corpo docente estável, que “comunica entre si as boas práticas”, com “meios idênticos”, têm... resultados diferentes. “As diferenças de classificação devem-se, sobretudo, ao nível socioeconómico e cultural ser diferente. Diferentes poderão ser as expectativas das famílias e dos próprios alunos, o tipo de investimento feito nas atividades escolares, alguma instabilidade familiar”, diz a diretora.
O papel da escola
Maria José Nunes, presidente da comissão administrativa provisória do agrupamento de escolas públicas de Alter do Chão, a que pertence a secundária que este ano tem a pior média de exames do país (a Escola Padre José Agostinho Rodrigues), não tem dúvidas: o contexto social pesa mais do que tudo.
No seu agrupamento “a importância que os alunos dão aos estudos é pouca, as expectativas que têm são baixas, as famílias não são muito escolarizadas e não conseguem ajudar os filhos”. No ano passado, muitos alunos fizeram questão de não ir às aulas de apoio (uma espécie de reforço nas disciplinas básicas, extra-horário-obrigatório).
A professora garante que as turmas não são grandes, que a escola tem meios, que os professores do secundário são todos do quadro, que as metodologias são diversificadas (“workshops, seminários, espaços para apoio...”). Não tem sido suficiente, os maus resultados nos rankings não são de hoje.
“Os resultados dos exames dependem, em grande medida, dos próprios alunos e dos objetivos que eles e as famílias traçam”, diz José Eduardo Lemos, presidente do Conselho das Escolas, o órgão que representa os diretores. “Tradicionalmente, as escolas privadas priorizam a sua atenção e ação na obtenção de bons resultados nos exames. Muitas têm uma procura superior à capacidade de oferta, pelo que podem selecionar os alunos que têm maior potencial, os quais por sua vez obterão melhores resultados, reiniciando-se o ciclo de atração.”
Já as escolas públicas, prossegue, têm de dar resposta não só aos exames, mas também a “outras dimensões da formação e da educação dos jovens, as quais não são despiciendas no seu desenvolvimento ao longo da vida, enquanto profissionais e cidadãos”. Ao mesmo tempo, “procuram contrariar e mitigar o peso dos fatores sociais adversos”. Mas, remata, “a sociedade contém na sua natureza elementos de desigualdade que geram, eles próprios, diferentes oportunidades para os cidadãos” e “não se deve esperar que seja a escola a redistribuir essas oportunidades pelos jovens”.
Mais alguns números: em todos os anos de escolaridade onde se realizam exames nacionais, só no 4.º o ensino público está representado entre as 20 escolas melhor classificadas no ranking geral (no caso do básico feito a partir das notas dos alunos nas provas de Português e Matemática).
56% aquém do valor esperado
(...) Com base em dados fornecidos pelo Ministério da Educação e Ciência (que o faz apenas para os agrupamentos das escolas públicas do continente), os investigadores da Católica definiram 3 tipos de contextos socioeconómicos — do 1, mais desfavorecido, com mais alunos abrangidos pelo escalão A de ação social escolar e famílias menos escolarizadas, ao 3, o mais favorável. Os professores da Católica analisaram como é que as escolas de cada contexto se saem e em que medida ultrapassam a média de exames que seria de esperar delas, tendo em conta também a proporção de provas feitas a cada disciplina. Não é possível fazer o mesmo exercício para o ensino privado, porque para esses o ministério não disponibiliza dados.
Mais de metade (56%) das 466 escolas secundária para as quais foi possível determinar o tipo de contexto em que se inserem ficaram aquém do valor que seria de esperar. Por exemplo, de novo a escola de Alter do Chão. Pertence ao contexto 1, o mais desfavorecido. Valor esperado: 9,64 valores. Ficou-se pelos 5,92.
O lugar que cada escola ocupa no ranking geral (nas listas deste “especial” identificado como "Ranking 1") tem em conta apenas as médias nos exames. No “Ranking 2”, limitamo-nos a ordenar as escolas com mais provas (pelo menos 50). Este ano, introduz-se ainda um “Ranking 3”. Segundo Joaquim Azevedo e Conceição Portela trata-se de “uma forma mais justa” de ordenação, que tem em conta o leque de exames feitos em cada escola — para cada é calculada uma média nacional e as escolas são ordenadas não pela nota média das 8 disciplinas, como no ranking 1 e 2, mas pela diferença entre esta nota média e a média nacional (calculada, como se disse, caso a caso tendo em conta o número de exames da escola). Isto evita que uma escola que tem mais alunos a fazer exames “mais fáceis”, ou seja, de disciplinas onde a média nacional é melhor, veja a sua nota inflacionada relativamente a outra que faz um maior número de exames ‘mais difíceis’”.
Nas listas deste “especial Rankings” é possível ver o impacto desta reordenação. Exemplo: no “Ranking 3”, o colégio Nossa Senhora do Rosário, do Porto, continua a ocupar o 1.º lugar. Mas o Colégio Horizonte, também no Porto, assume o 2.º lugar, quando no “Ranking 1” é 6.º — e a razão é esta, fez apenas 10 provas, mas 5 foram a Física, que a nível nacional tem a pior média (9,19), tendo este colégio conseguido, contudo, 12,26.
Fonte: Público
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