sábado, 29 de novembro de 2014

Rankings, para que vos quero?

Por pressão dos meios de comunicação social, e pela 14.ª vez consecutiva, eis mais um ano em que o Ministério da Educação (ME) faz chegar às redações dos jornais dados em bruto sobre algumas variáveis de contexto escolar que, depois de trabalhadas, são apresentados em forma de tabela classificativa a que dão o nome de "ranking das escolas". Este procedimento não é seguido por mais nenhum país europeu, apresentando uma imagem pouco rigorosa do que é uma escola.

Tremendo erro, pois trata-se de um retrato muito parcial, com inúmeras limitações, ou mesmo omissões (para o ensino privado ainda não é revelado o conjunto de dados de caracterização das escolas, fator impeditivo de maior justiça no seu tratamento).

O instrumento de avaliação em causa tem vindo a aperfeiçoar-se, mas continua longe de fazer jus à denominação. Enquanto, pelo menos, não entrarem neste trabalho fatores como a qualidade dos alunos (empenhados, estudiosos, faltosos), o efeito da escola sobre os alunos (valor que acrescenta, desde que o aluno entra até que sai da escola), o número de alunos e seus percursos escolares, a estabilidade do corpo docente, o nível socioeconómico dos pais e da região onde a escola se insere, a motivação dos alunos e famílias, o efeito das explicações, os apoios extra sala de aula, etc., o objetivo de comparação entre escolas não é alcançado ou é falsamente atingido, partindo de pressupostos errados e com dados do contexto atrasados um ano.

Na verdade, esta tabela mostra a qualidade dos alunos que fazem os exames – resultados escolares, em detrimento da ação e do mérito dos estabelecimentos de ensino. Não retrata a outra vertente (competências sociais) com que o aluno sai da escola; em muitos países, por exemplo, Estados Unidos da América, o recrutamento para emprego já se faz pela leitura do portefólio onde essas competências são valorizadas, muitas vezes mais do que as académicas.

Neste contexto, não é correto concluir que a escola que ocupa o primeiro lugar é a melhor e a que ficou em último é a pior, independentemente de ser pública ou privada. Pergunto: obteriam os alunos da escola classificada em primeiro lugar uma classificação melhor se frequentassem a escola classificada no último lugar? Conseguiriam os alunos da escola classificada em último lugar ter uma classificação melhor se frequentassem a escola classificada no primeiro lugar?...

Talvez tenha mais interesse a construção de um ranking que gradue as escolas tendo em conta, pelo menos, dois fatores: as que preparassem melhor os alunos para terem sucesso no ensino superior, e/ou as que tivessem em linha de conta a evolução do aluno desde que entra numa escola (valor acrescentado pela escola ao aluno durante o percurso escolar).

Por outro lado, é preciso não esquecer que as medidas de política educativa têm contribuído para uma instabilidade generalizada nas escolas, mesmo em termos de estabilidade dos lugares que ocupam neste ranking, num constante sobe e desce, ano após ano, com dificuldade em encontrar um rumo certo, tolhidas pelas constantes mudanças na organização da escola (sobretudo da escola pública – agregações de escolas, falta de estabilidade do corpo docente…), inexistência de efetiva autonomia (sobretudo curricular e pedagógica, mas também na contratação de professores), alterações sistemáticas da legislação educativa, onde tudo é mudado, por tudo e por nada (!)…

Este estudo deverá ser relativizado pelas instituições educativas, continuando a pugnar pela escola democrática, frequentada por todos e para todos, continuando a promover o sucesso educativo e social dos seus alunos, preparando-os para o futuro enquanto profissionais, mas também como cidadãos.

Filinto Lima

Vice-presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas

Fonte: Público

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