Em 6 e 7 de novembro decorreu, na Fundação Calouste Gulbenkian, um Fórum Internacional, destinado a promover os direitos das crianças com perturbação mental ou deficiência intelectual. Organizado em parceria com a Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, o Fórum reuniu técnicos de diversos países e ativistas dos direitos humanos, com experiência do terreno na luta por esses direitos.
Foi uma reunião muito interessante e mobilizadora, a que infelizmente poucos portugueses assistiram. Trata-se de um tema difícil e, em Portugal, é costume fazer de conta que certas questões não existem. Um dos principais focos deste fórum consistiu na denúncia das situações de institucionalização de crianças. Em muitos locais do mundo, crianças e jovens são institucionalizados porque têm problemas de doença mental e não encontram o tratamento adequado. O afastamento da família e da escola ocorre, em muitos casos, porque o estigma, a discriminação e o desconhecimento das melhores formas de tratamento conduzem a essa solução.
Infelizmente e apesar do esforço dos técnicos que lá trabalham, muitas instituições acolhem demasiadas crianças, a intervenção técnica é intermitente e os cuidados limitam-se às principais rotinas do quotidiano, com a das refeições e a da higiene.
Em Portugal, cerca de oito mil crianças e jovens estão institucionalizados por ordem dos tribunais. Em muitos casos, a colocação numa determinada casa de acolhimento obedece apenas a um critério de vagas e a escolha não é direcionada para a solução dos principais problemas de quem é acolhido. Trabalha-se muito pouco com as famílias de origem e se o retorno a casa pode ser impossível em certos casos, outros haverá em que a preparação desse regresso deveria ser a prioridade desde o primeiro dia de institucionalização.
O fórum demonstrou como as crianças institucionalizadas sofrem consequências negativas pelo facto de estarem privadas de um meio familiar adequado. A ausência de cuidados de qualidade, a pouca estimulação e a interação humana com muitos problemas relacionais contribuem para o aparecimento ou agravamento de doenças físicas e perturbações mentais, bem como para o aumento de comportamentos autodestrutivos. O número de mortes de crianças e jovens em instituições é superior à dos jovens da mesma idade que vivem com as suas famílias.
O fórum pretendeu aumentar a informação e o conhecimento sobre este problema e, ao mesmo tempo, propor estratégias para prevenir a institucionalização de crianças, através de um conjunto de serviços sediados na comunidade que possam fornecer cuidados a crianças, pais e cuidadores. Como exemplos foram citados a importância de uma intervenção precoce nas crianças com dificuldades nos primeiros anos de vida, a criação de serviços e programas de apoio aos pais, a educação inclusiva que evite a marginalização de crianças com dificuldades, o apoio financeiro e social às famílias em risco, o desenvolvimento da adopção e a monitorização rigorosa dos cuidados nas instituições de acolhimento de jovens.
O fórum concluiu que a institucionalização de crianças com perturbações psicossociais constitui uma violação dos direitos humanos, baseada na crença falsa de que essas crianças não podem ser tratadas com sucesso, de modo a que a sua qualidade de vida melhore e se possam tornar membros válidos da sociedade.
Daniel Sampaio
In: Público
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