terça-feira, 2 de março de 2010

Ensino privado-público: vivências de alunos com necessidades educativas especiais

Enquanto espaço de debate, de troca de informações ede experiências, deixo o relato de uma mãe, com um filho autista, e o seu comentário acerca das diferenças entre os ensinos privado e público.
Abrindo um pouco mais "o livro das minhas experiencias": O meu filho autista de 8 anos entrou para uma creche privada aos 2,6 anos. Aproximadamente na mesma altura, sou informada, através de uma consulta, da sua problemática, mas já na creche me haviam perguntado se ele teria algum problema. Entrou facilmente no privado e a simpatia de todos, as excelentes instalações, os horários, os tempos de férias mais coadunados com a realidade, e o suposto maior cuidado individual para com cada criança, seduziram-nos para esta opção educativa.
Semanas depois: diagnóstico confirmado - o meu filho tinha Autismo em caracterização. Ele já tinha entrado na creche, como tal manteve-se por lá. Tenho até hoje a quase certeza de que a saberem previamente, ter-me-iam dito que não tinham vagas.
Percebi a incapacidade de resposta, mas principalmente o total desinteresse pelo tema, mesmo com a hipocrisia de algumas reuniões para delimitar imediatas estratégias educativas. Na realidade, o mais que sentimos inicialmente foi a pena das pessoas... e não era isso que mais necessitávamos. Depois revelou-se o incómodo que crianças diferentes começam a causar a uma empresa que tem que gerir ganhos, lucros, pessoal, interesses e um grande sucesso em todas as crianças. Senti tudo menos o que tivesse verdadeiramente a ver com a vontade de integrar um menino diferente, de lhe proporcionar algum bem estar.
Talvez o mais impressionante tivesse sido mesmo a reacção de outros pais - a meu ver os maiores ignorantes! Estavam interessados, quase que obcecados, no "Q.I" que os filhos pudessem ter, que fossem o mais desenvolvidos possível... Alguns olhavam-nos como "personas non gratas"! Chegaram a insinuar-me que a situação estava insustentável porque a maioria dos pais queixava-se.
Aguentei tudo porque não tinha onde pôr o meu filho e não podia perder o meu emprego, não podia desorientar-me. o Vasco gritava e mordia, fruto do seu problema e de certeza de um meio muito pouco acolhedor. Começaram a pô-lo a um canto... Disse-me um dia uma mãe, anos depois, que o levavam para o sótão e que achava mal... mas nunca mo disse na altura. Hoje penso que talvez tenha sido melhor que não mo tenha dito! O que sei é que o deixava lá a chorar e quando o ia buscar ao final do dia, era também assim que o encontrava.
Desesperei, no momento em que tudo me era tão dificil... Julgo que não era para menos. Consegui mais tarde, com a ajuda fantástica da professora de educação especial actual e de sempre, que uma educadora de ensino especial visitasse a creche 2 horas por semana. Na maior parte das vezes não podia ir porque estava doente, nas vezes em que ia, dizia-me que era complicado porque não lhe faziam muito caso e o menino não aderia... A meu ver, má vontade de ambas as partes (talvez mais de uma parte do que de outra, mas culpa de ambas, negligência de ambas, sobretudo grande desinteresse de ambas as partes).
A minha "salvação" e do meu filho foi a nossa querida professora de hoje e uma creche pública. Nem tudo eram rosas, mas em nada tinha a ver com aquela "miséria" onde tinhamos que pagar cerca de 300 euros/mês para deixar o nosso filho a regredir cada dia mais.
Embora não seja correcto generalizar, considerando a minha experiência, não recomendo a escola privada a neunhuma mãe que tenha um filho com necessidades especiais... e confesso que, para mim, uma escola que não acolhe bem uma determinada criança, é incapaz de acolher bem qualquer outra que seja.... No entanto, talvez seja uma boa opção para alguns pais... Penso que depende daquilo que cada um procura dar aos seus filhos. É só parar para analisar... Uma coisa garanto, as diferenças são muitas. Para mim particularmente, sem nenhuma sombra de dúvidas, a opção é a escola publica, (é um serviço prestado não é uma empresa).

8 comentários:

Mina disse...

Reiteiro, praticamente tudo o que esta mãe Cristina escreve.
E lamento profundamente, que o caminho ainda esteja assim.
Que eu tenha tido conhecimento, o meu filho nunca foi mal tratado no particular, onde só esteve a frequentar a infantil e a pré-primária, embora o colegio particular que frequentava na altura tivesse até 6ºano naquela altura, foi-nos proposta a porta da saída, para não terem trabalho com uma criança diferente, quando a nossa intenção julgavamos nós que no ensino particular estivesse mais protegido, engano nosso...
Mas este caso já tem quase 20 anos, e ao que constato pouco mudou.
Desde dos 6 anos até aos 22frequentou a escola pública, com muitos altos e baixos, com uns a integrar e outros rejeitar, até os pais acho que não mudaram e continuam ignorantes.
Nem sei que mais diga,será que quase nada mudou...
bjos

ivaneide disse...

Tive hoje a oportunidade de ler o relato dessa mãe. tenho uma filha com sindrome de down de 7 anos de idade e já experimentei os dois lados escola particular e pública. Na escola particular só deixei um ano,eram carinhosos mas não conseguiam desenvolver um trabalho satisfatório com minha filha pois na maioria das vezes ela estava sentada numa mesinha no final da sala isolada dos outros pq ela batia.Coloquei na escola pública pensando que mudaria, foi bom pq ela ficou numa turma reduzida e teve uma monitora para ela e o coleguinha que também era down, a parte de socialização foi muito boa pois os coleguinhas gostavam muito dela, o que pegou foi que a professora sempre alegava falta de recursos pr trabalhar com ela e falta de tempo suficiente ocasionando um aproveitamento não muito bom na parte cognitiva, coloquei então minha filha no Centro de Ensino especial ela está inserida numa turminha de DI com 6 alunos e tem uma professora só para ela e outro aluninho DI mais auxilio de uma monitora. Sei que houveram perdas e ganhos, coloquei na balança e até o momento acho que está atendendo as necessidades dela, eu sei que tudo na vida a gente tem que arriscar é o que estou fazendo, pretendo deixá-la dois anos no centro e depois tentar a inclusão novamente, estou lutando pelo melhor para minha filha não sei se optei pelo melhor,só o tempo vai dizer.A vc que leu meu comentário e tiver uma experi~encia semelhante entre em contato comigo e me conte a sua experi~encia o meu e mail é:ivaneide-7@hotmail.com

Rita disse...

Bom dia
O meu nome é Rita , sou Educadora de infancia e neste momento sou proprietaria de um espaço infantil .
Em Outubro do ano que passou tive o prazer de conhecer um menino muito especial que na altura não se sabia o que tinha mas revelava comportamentos que me preocupavam muito...De inicio tentamos(porque os pais sempre tiveram tempo disponivel) uma adaptação em que os pais cá ficavam ...mas não resultou! Assim que os pais se ausentavam o menino gritava e principalmente sofria ! O resto do ano a mãe acabou por cá permanecer as manhas e quando o menino dormia as sestas então esta ultima ausentava-se. Ao contrario da vossa experiencia os pais do meu espaço não reagiram mal, aperceberam-se que a criança era diferente...mas não me perguntaram nada! Profissionalmente ,eu cresci, aprendi onde e como me deslocar para ajudar crianças ditas especiais e principalmente a ter paciencia!Hoje tenho cá outro menino com a mesma problematica e corre bem ! Bem hajam todos vos !

Rita disse...

Bom dia
O meu nome é Rita , sou Educadora de infancia e neste momento sou proprietaria de um espaço infantil .
Em Outubro do ano que passou tive o prazer de conhecer um menino muito especial que na altura não se sabia o que tinha mas revelava comportamentos que me preocupavam muito...De inicio tentamos(porque os pais sempre tiveram tempo disponivel) uma adaptação em que os pais cá ficavam ...mas não resultou! Assim que os pais se ausentavam o menino gritava e principalmente sofria ! O resto do ano a mãe acabou por cá permanecer as manhas e quando o menino dormia as sestas então esta ultima ausentava-se. Ao contrario da vossa experiencia os pais do meu espaço não reagiram mal, aperceberam-se que a criança era diferente...mas não me perguntaram nada! Profissionalmente ,eu cresci, aprendi onde e como me deslocar para ajudar crianças ditas especiais e principalmente a ter paciencia!Hoje tenho cá outro menino com a mesma problematica e corre bem ! Bem hajam todos vos !

Anónimo disse...

L.Azevedo
Boa tarde
Tenho um filho com 12 anos ,com Trissomia 21 matriculado no 5º ano e frequenta apenas na turma regular Ed. Fisica, Ed. musical e EV o resto lectivo tem uma sala onde frequenta actividades funcionais . Chegou a altura de assinar o PEI e tambem nos foi dito para passar a ter o CEI, ficamos admirados nesta proposta porque o aluno poderá continuar com adquações curriculares tal como tem tido até à data, o Enc. de educação acha permaturo ate porque a criança ainda está numa fase de adaptação ao 2º ciclo , e não havia necessidade desta medida no nosso entender.
Pergunto deve-se insistir para que as medidas sejam adaptadas nas várias alineas d0 dec.3/2008, sem ser o CEI? Preciso muito que alguem me diga se a nossa opção para já nos tempos mais próximos è válida? Obrigada

João Adelino Santos disse...

Bom dia
Tenho de começar por referir que vou responder em teoria porque, em educação especial, em particular, e em educaçõ, em geral, cada resposta deve ser personalizada, tendo em consideração o perfil do aluno em causa.
Se o aluno já só frequenta algumas das disciplinas, significa que, na prática, já beneficia de um currículo específico individual (CEI). Trata-se de uma medida muito restritiva que impossibilita o prosseguimento de estudos, havendo, no entanto, outras possíveis alternativas futuras, como a frequência de formação profissional especial.
No final da escolaridade, é emitido um certificado de frequência que tem, teoricamente, o mesmo valor dos restantes para efeitos de empregabilidade.
A medida de adequações curriculares individuais pressupõe que o aluno consegue acompanhar o currículo regular, ou seja, frequentar todas as disciplinas, ainda que com ajustes ao currículo sem, no entanto, pôr em causa as competências finais de ciclo.
Na minha perspetiva, um aluno que beneficie de CEI deixa de ter adequações curriculares individuais porque, às disciplinas que frequenta e revela dificuldades em acompanhar o currículo, deve ser elaborado um currículo (programa) adequado ao seu perfil de funcionalidade.
Quanto ao caso em concreto, penso que, perante as dúvidas, deve questionar o diretor de turma e/ou o docente de educação especial acerca da fundamentação para a alteração de medidas.
Volte sempre
Cumprimentos
João Adelino

Anónimo disse...

Após ler o relato desta mãe quis aqui deixar um comentário e relatar a minha experiência, porque me preocupa que generalizem tanto a "má" qualidade dos estabelecimentos privados. É verdade que existem maus estabelecimentos, que preferem virar a cara a crianças com necessidades especiais, mas isto acontece tanto nos privados como nos publicos.
A minha experiência pessoal foi diferente. Tinha o meu filho matriculado recentemente num novo jardim de infância, tinha ele 3 anos, quando soube que ele tinha autismo ainda em caracterização. Tive muito receio de contar isto na escola, porque já sabia de antemão que algumas reagiam mal. Pois devo dizer que isso não aconteceu, muito pelo contrário. Naquela escola, disseram-me que têm uma política de inclusão, que aceitam todas as crianças e que até já tinham tido experiência com crianças com esta e outras perturbações do desenvolvimento.
Nesta escola, sempre permitiram a visita de uma terapeuta, a educadora sempre se preocupou em colaborar com a mesma, para potenciar ao máximo o desenvolvimento do meu filho. Por iniciativa própria, chegou até a matricular-se num curso de ensino especial, para poder acompanhar melhor o meu filho.
E esta é uma escola privada. Não poderia ter escolhido um melhor local para o meu filho, devo dizer.
Agora que ele vai fazer 6 anos, ele vai para uma escola pública. Espero sinceramente encontrar nas suas futuras professoras o mesmo apoio e abertura que encontrei neste jardim de infância privado.

João Adelino Santos disse...

"Anónimo"
A dicotomia "privado" versus "público", ao nível do serviço educativo prestado, não faz grande sentido na medida em que existem "bons" e "maus" exemplos em ambos os sistemas!
No entanto, reconheço que uma das críticas associadas ao "privado" deve-se à aparente discricionaridade na seleção dos alunos, com prejuízo daqueles que apresentam necessidades educativas especiais. Tal situação verifica-se sobretudo nos níveis educativos correspondentes aos ensinos básico e secundário, com incidência naqueles onde se realizam exames.
Agradeço a partilha da sua experiência enquanto encarregada de educação. Espero que, no futuro, tudo corra da melhor forma!