A agenda programática da educação expressa na proposta de Orçamento do Estado dificilmente terá verba para ser financiada. Muitas ideias para pouco dinheiro.
Ao ler a secção dedicada à educação, com números ainda pouco desagregados, a lista de boas intenções é mais longa que em anos anteriores e demonstra a continuidade da equipa governamental. A ambição discursiva vai muito para além do pequeno incremento que o orçamento proporciona, sinalizando que é expetativa do Governo que muitos programas propostos sejam implementados à conta da boa vontade e carolice dos funcionários do ministério e dos professores e diretores a nível de escola.
De notar que este orçamento a nível discursivo dá grande relevo a medidas associadas ao Plano Nacional do Sucesso Escolar (PNSE), algumas que transitam de anos anteriores (como flexibilidade curricular, tutorias, plano de ensino-aprendizagem da matemática, apoio a alunos carenciados) mas outras que surgem com alguma novidade: apoio a alunos imigrantes e a comunidades ciganas. De destacar medidas que podem representar um enriquecimento do papel da escola enquanto promotora de cidadãos cultos e interessados pelo mundo à sua volta: o Plano Nacional das Artes, a Ciência Viva nas escolas, a criação de escolas bilingues e o alargamento da oferta linguística a outros idiomas (mandarim ou italiano). Todas estas intenções correm o risco de ficar no papel ou de se transformarem numa sombra de si mesmas.
À luz do orçamento de 2019, os programas que foram orçamentados no âmbito do PNSE (reforço para projetos apresentados no âmbito do PNSE; tutorias e reforço das equipas de psicologia e orientação profissional) dispunham apenas de cerca de 50 milhões de euros para todo o ensino básico e secundário – o que significa cerca de 40,00€ aluno/ano.
Temos de aguardar pela desagregação de verbas para 2020, mas temo que se manterão na mesma ordem de grandeza. Se ao valor total do orçamento descontarmos as despesas em bens de capital (investimento na construção e recuperação de infraestruturas) e as transferências correntes (pagar a prestadores externos o ensino artístico, os contratos de associação, as instituições que lidam com inclusividade), o que resta são 5400 milhões de euros, dos quais 88% são salários. Temos pouco dinheiro para inovar, pouca margem para fazer floreados.
Pode ser que consigamos implementar alguns planos via ganhos de eficiência. Bem necessitamos se queremos experimentar novas estratégias e modernizar a escola. As ideias andam por aí, espelham muito do conhecimento que se vai acumulando nas universidades e na prática docente. Mas não chega. Temos de melhorar o planeamento de políticas, ser mais claros a elencar os seus custos e benefícios. É preciso planear, é preciso antecipar as dificuldades e promover os benefícios expectáveis. As ideias são fundamentais, mas não acontecem no vazio.
Isabel Flores
Fonte: Público
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