terça-feira, 12 de janeiro de 2010

A inclusão: análise conceptual

O conceito de inclusão parece envolto numa grande confusão polissémica com os consequentes efeitos nas práticas educativas dos professores e das escolas e, naturalmente, no processo educativo dos alunos com necessidades educativas especiais (NEE). A polissemia atribuída à inclusão diverge por um vasto panorama educativo como: respeita à educação de todos; o conjunto de respostas educativas proporcionadas aos alunos, sendo estas da responsabilidade dos docentes da turma; contempla a inserção dos alunos com NEE, moderadas e severas, nas escolas regulares da sua área de residência, sempre que possível nas turmas regulares, desde que com apoios apropriados às suas necessidades e capacidades educativas.
Ao debruçarmo-nos sobre as várias análises conceptuais da inclusão, verificamos que os diversos autores não manifestam uma divergência de fundo. Assim, para Boatwright, Alper e Ryndak, citados por Correia e Cabral (1999), a inclusão significa atender o aluno com NEE, incluindo aqueles com NEE severas, nas turmas regulares com o apoio dos serviços de educação especial.
Nesta linha de pensamento, Forest, referido por Correia e Cabral (1999), considera que a criança com NEE severas, desde que lhe sejam providenciados os serviços adequados e os apoios suplementares na turma regular, pode atingir os objectivos que lhe foram definidos tendo em conta as suas características.
Segundo a Agência Europeia para o Desenvolvimento da Educação Especial (2003), a educação inclusiva insere-se no princípio de uma escola para todos e constitui uma base fundamental para assegurar a igualdade de oportunidades para as pessoas com NEE em todos os aspectos da sua vida, como a educação, a formação, o emprego e a vida social. Desta forma, requer sistemas educativos flexíveis que se responsabilizem pelas diversas e, muitas vezes, complexas NEE dos alunos e proporcionem um acesso total e igualitário à educação na sua comunidade local.
A educação inclusiva assume-se, então, como o direito de todas as crianças, independentemente dos problemas ou deficiências que possuam, frequentarem as escolas da sua área, aquelas para onde iriam se não tivessem qualquer problema ou deficiência, e o consequente direito de viverem na sua família, de participarem da sua comunidade, de conviverem com os seus vizinhos (Costa, 1999). Trata-se, no fundo, de uma questão de direitos humanos.
Num contributo para a clarificação conceptual, Correia e Cabral (1999) definem inclusão como a inserção do aluno com NEE, mesmo com NEE severas, na turma regular, onde, sempre que possível, deve receber todos os serviços educativos adequados, contando-se, para tal, com um apoio apropriado às suas características e necessidades. Estes serviços devem ser complementados com tarefas que envolvam uma participação comunitária que possibilitem o desenvolvimento de aptidões inerentes ao quotidiano de cada um. Estes autores realçam que a inclusão se baseia nas necessidades da criança, vista como um todo, e não apenas no seu desempenho académico, ou seja, a criança-aluno. Neste sentido, propõem que o princípio da inclusão respeite três níveis de desenvolvimento essenciais – académico, socioemocional e pessoal – de forma a proporcionar uma educação apropriada, orientada para a maximização do seu potencial. A escola deve, então, ajustar-se a todas as crianças e às respectivas famílias.
A política educativa de inclusão plena de todos os alunos “implica que todas as crianças, incluindo as que têm deficiências mais severas, deverão entrar na escola e ter lugar na classe regular. Pode ser necessário, ocasionalmente, garantir outras alternativas, mas unicamente depois de terem sido feitos todos os esforços de adaptar a classe regular e quando as alternativas se revestem de um claro benefício para o aluno” (Porter, 1997, p. 36).
Para melhor se compreender o conceito de inclusão torna-se necessário compará-lo com o de integração. Neste sentido, Costa (1999, p. 28) entende que integração é um processo através do qual as crianças consideradas com necessidades especiais são apoiadas individualmente, de forma a poderem participar no programa vigente, e inalterado, da escola. Por outro lado, a inclusão é o empenhamento da escola em receber todas as crianças, reestruturando-se de forma a poder dar resposta adequada à diversidade dos alunos. Isto é, de uma perspectiva centrada no aluno evolui-se para uma perspectiva centrada no currículo. A abordagem inclusiva perspectiva o currículo como sendo comum a todos os alunos, que dê a todos oportunidade de se envolverem de forma positiva nas actividades da turma, implicando o desenvolvimento de actividades que permitam aos alunos aprender fazendo, baseado num processo e em conteúdos que irão facilitar a colaboração entre os discentes e os professores, de forma a conseguir uma aprendizagem significativa para cada criança ou jovem (Porter, 1997).
Apesar do aparente consenso conceptual, verificamos a existência de algumas divergências, principalmente ao nível da profundidade de análise. Para alguns autores, inclusão é sinónimo perfeito de integração. A este propósito, Patton e Dowdy, referidos por Correia e Cabral (1999), definem inclusão como sendo a inserção física, social e académica na turma regular do aluno com NEE durante grande parte do dia escolar, podendo haver circunstâncias que o obriguem a receber, temporariamente, apoio fora da turma regular. E designam este processo de inserir os alunos na classe regular pelo nome de integração.
À medida que as escolas se tornam mais eficazes na prestação de serviços inclusivos a todos os alunos, torna-se evidente que muitas das estruturas existentes podem criar obstáculos frustrantes à total implementação do processo de inclusão (Kronberg, s. d.). Para tal, é necessário que aconteça uma redefinição das estruturas e das estratégias curriculares e instrucionais de forma a apoiar mais eficazmente práticas educativas inclusivas. “Um empenhamento da educação integrada ou inclusiva significa que os professores, as escolas e a comunidade procurem resolver os problemas de tal modo que seja respeitada a integridade da escola enquanto organização e que não ponham em risco a admissão dos alunos com deficiência” (Porter, 1997, p. 38).
No entanto, este movimento de inclusão não tem sido coerente nem unificador nos processos. Vários estudos internacionais têm vindo a concluir que a retórica tem vindo a dar lugar a um conjunto de propostas e de práticas educativas totalmente desajustadas às necessidades dos alunos com NEE (Correia, s. d.). A este propósito, Warnok, na perspectiva de Correia (s. d.), concluiu que este conceito, tal como é interpretado por muita gente, causa confusão da qual as crianças são as vítimas e descreve a sua implementação como um legado desastroso. O espírito que deu origem ao movimento da inclusão encontra-se, assim, a ser desvirtuado e, ao ser interpretado de diversas formas, leva a situações de confusão e desilusão com repercussões finais nas crianças com NEE.
Bibliografia:
Agência Europeia para o Desenvolvimento da Educação Especial (2003) – Princípios-chave para a educação especial: recomendações para responsáveis políticos. Brussels: European Agency for Development in Special Needs Education.
CORREIA, L. M. e CABRAL, M. C. M. (1999) – Uma nova política em educação. In L. M. Correia (dir) Alunos com Necessidades Educativas Especiais nas Classes Regulares. Porto: Porto Editora, pp. 17-44.
CORREIA, L. M. (s. d.) O conceito de inclusão dentro do espírito do movimento da escola contemporânea http://www.educare.pt/ 03-01-2006 10:00
COSTA, Ana Maria Bénard (1999). Uma Educação Inclusiva a partir da escola que temos. In Uma Educação Inclusiva a partir da escola que temos. Lisboa: Conselho nacional de Educação, pp. 25-36.
KRONBERG, R. M. (s.d.) Educação Especial: realinhamento de estruturas e estratégias. http://www.educare.pt/ 03-01-2006 10:07
PORTER, G. (1997). Organização das Escolas: conseguir o acesso e a qualidade através da inclusão. In Mel Aiscow, Gordon Porter e Margaret Wang Caminhos para escolas inclusivas. Lisboa: Instituto de Inovação Educacional, pp. 33-48.

1 comentário:

Atena disse...

Olá Prof. João... Cá estou eu a encher-lhe o blog, mas não consigo resistir a ir-lhe transmitindo o que penso como mãe, agradecendo os ensinamentos que presta a quem por aqui passa, com este seu trabalho.
Os 2 conceitos de facto não estavam claros para mim. Ou seja, para mim os 2 definiam aquilo a que as crianças com NEE têm direito - ser incluídos/integrados na comunidade escolar e social - obviamente que com todas as condições reunidas para o efeito, de forma individual, e independente da gravidade do comprometimento da sua diferença - até ao límite de se provar que essa não é a melhor resposta para determinado caso mais severo, e depois de efectuado um VERDADEIRO ESFORÇO. Aliás, como esta lei 3/2008 até me parece que prevê para as 4 problemáticas eleitas. (Aqui o tema é controverso mas é outra questão, que eu por acaso tb acho injusto: a exclusão de tantas crianças com outras dificuldades, talvez por uma questão um pouco economicista... mas talvez também houvessem excessos praticados com a lei anterior fazendo com que tudo quanto fossem crianças mais dificeis na sala de aula, fossem rotuladas com o selo NEE enviando o "problema" direitinho para os depts. de Educação Especial lidarem eles - com "a coisa dificil").
Bom não tenho grandes certeza do que se passava nesta àrea, anteriormente, mas as respostas não eram de todo suficientes... Agora, de volta aos conceitos, penso neles como positivos e parecem-me o principio através do qual se tem de partir para acções concretas direccionadas para estas crianças. Outra coisa são depois os caminhos, o percurso que se leva, as mentalidades, os subterfugios daqueles que não encaram isto bem, a falta de sensibilidade para lidar com um tema que não toca a todos, apenas atinge uma minoria, os interesses instalados, sei lá, tanta coisa a ofuscar uma situação que deveria estar enraízada na consciencia das pessoas... Como referiu Windyz B. Ferreira no congresso Pro-inclusão: “Todos nós, enquanto educadores somos um ponto. Que podemos fazer escolhas e devemos optar pela melhoria de qualidade de vida das crianças e jovens com quem trabalhamos. É certo que precisamos de meios/recursos mas é a NÓS que nos compete lutar”.
Para terminar acho que muitos de vós têm lutado bastante e com uma entrega que não é mais nem menos do que de quem também é pai e mãe especial, o que me preenche de tal forma, que jamais podereí explicar, mas também acho que não podem estar sós... nós os pais temos de formar connvosco uma equipe, com respeito, admiração, verdade, abertura, união, valorização. Eu sou francamente optimista, apesar de tudo, e acho que estamos a conseguir alcansar algumas metas, lamento apenas a demora exagerada, mas acredito que chegaremos a ter melhor. A história que já se faz em alguns países (inglaterra, EUA, França, Brazil, etç.) diz-me que talvez essa evolução chegue daqui a alguns anos... como tudo aquilo que chega primeiro lá, para só chegar aqui passados muitos anos!
Para mim (não todos, infelizmente)os professores de ensino especial também são um bocadinho pais destes meninos que educam... pelo menos o meu filho, não é só meu... é um pouco também das suas queridas professoras de ensino especial, que tanto lhe dão a cada dia, quer profissionalmente, quer emocionalmente.
Grande abraço e até breve.
Cristina