A Agência Europeia para o Desenvolvimento da Educação Especial (2003, p. 6-7) apresenta alguns princípios que parecem constituir um enquadramento efectivo na promoção da educação inclusiva. Ao nível do enquadramento legal e político, a legislação dos países deveria declarar claramente a inclusão como um objectivo e que abarcasse todos os sectores da escolaridade obrigatória. Os governos deveriam definir uma política clara sobre a educação inclusiva. A política educativa dos países deveria: ter em atenção as necessidades de todos os alunos com necessidades educativas especiais (NEE); promover a inclusão e responder às necessidades educativas individuais nos contextos educativos; ser suficientemente flexível para reflectir as necessidades a nível local; proporcionar o desenvolvimento gradual da política de inclusão; ser multifacetada e transectorial e fomentar activamente a cooperação intersectorial nas áreas da educação, da saúde e da segurança social permitindo abordagens multidisciplinares; e ter em atenção as políticas e iniciativas a nível internacional, sobretudo a nível europeu. A liderança, nos diversos níveis, deve ser activamente apoiada por políticas claramente difundidas e que ajudem no seu papel.
Conscientes das dificuldades detectadas na implantação e implementação, com sucesso, do sistema inclusivo, Correia e Cabral (1999) propõem alguns pontos a considerar neste processo. Começam por frisar, realçando bastante este aspecto, de que a inclusão deve admitir, sempre que possível, outro modelo de atendimento para além da turma regular, podendo, por exemplo, a criança com NEE receber temporariamente apoio fora da turma regular. A ênfase centrada no “sempre que possível” justifica-se com as características, as capacidades e as necessidades de aprendizagem de determinadas crianças que podem requerer modalidades de atendimento diversificadas.
Por ouro lado, tendo em conta a natureza e a severidade da problemática das crianças com NEE, propõem um modelo de inclusão assente em três níveis de inclusão progressiva tendo por base as actividades académicas e sociais desenroladas na escola regular: limitado, moderado e total. Neste cenário, a maioria dos alunos com NEE, como são as situações ligeiras e moderadas, devem ser considerados na inclusão total (nível I). Um pequeno número de alunos, caracterizados como situações moderadas e severas que requerem práticas excepcionais, deve ser inserido na inclusão moderada (nível II). Finalmente, só um pequeno número muito reduzido de alunos em situações severas, e que o exijam, deve ser considerado na inclusão limitada (nível III). Nesta perspectiva, as actividades comparticipadas vão aumentando progressivamente à medida que a severidade do problema vai diminuindo.
Pensamos que é uma proposta válida e útil para os professores do ensino regular e da educação especial, constituindo um instrumento pragmático na definição e na elaboração do Plano Educativo Individual (PEI)* e do Programa Educativo (PE)* dos alunos com NEE e, posteriormente, na sua implementação. No entanto, podemos cair na tentação da categorização e da catalogação destes alunos, procurando inseri-los num destes níveis, esquecendo-nos de que cada criança é um caso específico, diferente de todos os outros, cujas fronteiras são definidas pelas próprias características individuais. Apesar destes possíveis constrangimentos, consideramos que, conceptualmente e para que sejam eficazes e orientadores pragmáticos, estes níveis carecem de alguma profundidade de conteúdo, isto é, deveriam ser analisados e definidos os níveis quanto à sua natureza e abrangência. Verificamos que, por exemplo, as situações moderadas podem inserir-se quer no nível I quer no nível II, não havendo uma grande especificação nesta distinção de níveis.
Finalmente, os mesmos autores apresentam um conjunto de preocupações que devem ser tidas em conta e que, muito sinteticamente, se relacionam com os efeitos negativos que a inclusão pode provocar nas crianças com NEE ao nível da auto-estima e do sucesso escolar deles e dos colegas “normais”. Estes efeitos podem resultar essencialmente da falta de recursos materiais e humanos, da inexistência ou ineficácia dos serviços necessários, dos docentes do ensino regular ainda não aceitarem completamente o processo da inclusão e da dificuldade de se articularem com os docentes da educação especial, da falta de legislação que configure o sistema educativo inclusivo pretendido e da falta de fundos para a realização das reformas pertinentes à implementação deste processo. Assim, é necessário e prioritário considerar a boa vontade quer dos governos e da sociedade em geral quer de todos os profissionais envolvidos neste processo, aceitando as suas responsabilidades de educar todos os alunos, independentemente das suas problemáticas.
Embora a maioria dos professores acredite e aceite o conceito de inclusão, os professores titulares da turma têm alguns receios em relação a este processo de mudança. Como sistematiza Correia (2005), esta relutância deve-se, sobretudo, por sentirem falta de formação necessária para ensinar alunos com NEE. Por outro lado, muitos professores não sabem como elaborar planificações adaptadas, como lidar com algumas necessidades médicas e físicas dos alunos ou como proceder em casos de emergência. Para estes professores, as exigências educativas são maiores quando têm alunos com NEE nas suas turmas porque sentem uma tensão adicional que aumenta a sua frustração, para além de diminuir a sua habilidade para dar atenção às necessidades académicas e sociais dos restantes alunos. Os professores receiam, também, a inclusão quando não lhes são disponibilizados recursos humanos e materiais, tempo e formação necessários para a implementarem com sucesso.
Acontece, porém, que qualquer mudança deve ser compreendida e desejada. Neste sentido, concordamos plenamente com Correia e Cabral quando afirmam que a inclusão “só pode ter sucesso se, em primeiro lugar, os cidadãos a compreenderem e a aceitarem como princípio cujas vantagens a todos beneficia. Até lá, a igualdade de oportunidades para todos os alunos ainda pode estar distante.” (1999, p. 41).
* Trata-se de um texto datado, escrito em 2006, num contexto educativo regulado pelo Decreto-lei n.º 319/91, de 23 de Agosto
Bibliografia:
Agência Europeia para o Desenvolvimento da Educação Especial (2003) – Princípios-chave para a educação especial: recomendações para responsáveis políticos. Brussels: European Agency for Development in Special Needs Education.
CORREIA, L. M. e CABRAL, M. C. M. (1999b) – Uma nova política em educação. In L. M. Correia (dir) Alunos com Necessidades Educativas Especiais nas Classes Regulares. Porto: Porto Editora, pp. 17-44.
CORREIA, L. M. (2005) – Inclusão e Necessidades Educativas Especiais: um guia para educadores e professores. Porto: Porto Editora.
Conscientes das dificuldades detectadas na implantação e implementação, com sucesso, do sistema inclusivo, Correia e Cabral (1999) propõem alguns pontos a considerar neste processo. Começam por frisar, realçando bastante este aspecto, de que a inclusão deve admitir, sempre que possível, outro modelo de atendimento para além da turma regular, podendo, por exemplo, a criança com NEE receber temporariamente apoio fora da turma regular. A ênfase centrada no “sempre que possível” justifica-se com as características, as capacidades e as necessidades de aprendizagem de determinadas crianças que podem requerer modalidades de atendimento diversificadas.
Por ouro lado, tendo em conta a natureza e a severidade da problemática das crianças com NEE, propõem um modelo de inclusão assente em três níveis de inclusão progressiva tendo por base as actividades académicas e sociais desenroladas na escola regular: limitado, moderado e total. Neste cenário, a maioria dos alunos com NEE, como são as situações ligeiras e moderadas, devem ser considerados na inclusão total (nível I). Um pequeno número de alunos, caracterizados como situações moderadas e severas que requerem práticas excepcionais, deve ser inserido na inclusão moderada (nível II). Finalmente, só um pequeno número muito reduzido de alunos em situações severas, e que o exijam, deve ser considerado na inclusão limitada (nível III). Nesta perspectiva, as actividades comparticipadas vão aumentando progressivamente à medida que a severidade do problema vai diminuindo.
Pensamos que é uma proposta válida e útil para os professores do ensino regular e da educação especial, constituindo um instrumento pragmático na definição e na elaboração do Plano Educativo Individual (PEI)* e do Programa Educativo (PE)* dos alunos com NEE e, posteriormente, na sua implementação. No entanto, podemos cair na tentação da categorização e da catalogação destes alunos, procurando inseri-los num destes níveis, esquecendo-nos de que cada criança é um caso específico, diferente de todos os outros, cujas fronteiras são definidas pelas próprias características individuais. Apesar destes possíveis constrangimentos, consideramos que, conceptualmente e para que sejam eficazes e orientadores pragmáticos, estes níveis carecem de alguma profundidade de conteúdo, isto é, deveriam ser analisados e definidos os níveis quanto à sua natureza e abrangência. Verificamos que, por exemplo, as situações moderadas podem inserir-se quer no nível I quer no nível II, não havendo uma grande especificação nesta distinção de níveis.
Finalmente, os mesmos autores apresentam um conjunto de preocupações que devem ser tidas em conta e que, muito sinteticamente, se relacionam com os efeitos negativos que a inclusão pode provocar nas crianças com NEE ao nível da auto-estima e do sucesso escolar deles e dos colegas “normais”. Estes efeitos podem resultar essencialmente da falta de recursos materiais e humanos, da inexistência ou ineficácia dos serviços necessários, dos docentes do ensino regular ainda não aceitarem completamente o processo da inclusão e da dificuldade de se articularem com os docentes da educação especial, da falta de legislação que configure o sistema educativo inclusivo pretendido e da falta de fundos para a realização das reformas pertinentes à implementação deste processo. Assim, é necessário e prioritário considerar a boa vontade quer dos governos e da sociedade em geral quer de todos os profissionais envolvidos neste processo, aceitando as suas responsabilidades de educar todos os alunos, independentemente das suas problemáticas.
Embora a maioria dos professores acredite e aceite o conceito de inclusão, os professores titulares da turma têm alguns receios em relação a este processo de mudança. Como sistematiza Correia (2005), esta relutância deve-se, sobretudo, por sentirem falta de formação necessária para ensinar alunos com NEE. Por outro lado, muitos professores não sabem como elaborar planificações adaptadas, como lidar com algumas necessidades médicas e físicas dos alunos ou como proceder em casos de emergência. Para estes professores, as exigências educativas são maiores quando têm alunos com NEE nas suas turmas porque sentem uma tensão adicional que aumenta a sua frustração, para além de diminuir a sua habilidade para dar atenção às necessidades académicas e sociais dos restantes alunos. Os professores receiam, também, a inclusão quando não lhes são disponibilizados recursos humanos e materiais, tempo e formação necessários para a implementarem com sucesso.
Acontece, porém, que qualquer mudança deve ser compreendida e desejada. Neste sentido, concordamos plenamente com Correia e Cabral quando afirmam que a inclusão “só pode ter sucesso se, em primeiro lugar, os cidadãos a compreenderem e a aceitarem como princípio cujas vantagens a todos beneficia. Até lá, a igualdade de oportunidades para todos os alunos ainda pode estar distante.” (1999, p. 41).
* Trata-se de um texto datado, escrito em 2006, num contexto educativo regulado pelo Decreto-lei n.º 319/91, de 23 de Agosto
Bibliografia:
Agência Europeia para o Desenvolvimento da Educação Especial (2003) – Princípios-chave para a educação especial: recomendações para responsáveis políticos. Brussels: European Agency for Development in Special Needs Education.
CORREIA, L. M. e CABRAL, M. C. M. (1999b) – Uma nova política em educação. In L. M. Correia (dir) Alunos com Necessidades Educativas Especiais nas Classes Regulares. Porto: Porto Editora, pp. 17-44.
CORREIA, L. M. (2005) – Inclusão e Necessidades Educativas Especiais: um guia para educadores e professores. Porto: Porto Editora.
3 comentários:
Este é, para já, o último texto que publico sobre a problemática da inclusão. Espero ter contribuído para esclarecer algumas potenciais dúvidas.
João
Boa noite prof. João. Sim, agradeço o seu contributo. Os textos estão abrangentes e ricos, mas levantam muitos senãos... a meu ver demasiados, quando na minha simplicidade penso que havendo sensibilidade e vontade, esforço e dedicação, se ultrapassaríam muitas barreiras. Há em minha opinião muita neblusidade e um "esmiúçar" pela negativa, estas questões de uma grande parte da sociedade, que por vezes me soam a desculpas esfarrapadas. Ainda que alguns temas possam ser pertinentes e justificaveis e por isso alvo de discussão séria por gente entendida no assunto, há exagero nos receios da implementação da inclusão, e muitas vezes vem de pessoas que nem sequer imaginam o que são estas problemáticas, nem têm interesse em irem pesquizar. Parte do caminho com a negação na cabeça e quando se quer, arranjam-se motivos.
Prof João eu Conheço muitos casos diferentes em severidade...estas crianças apresentam de facto desafios extraordináriamente complicados (alguns), mas se trabalhados, atingem-se quase sempre objectivos educativos muito estimulantes. Não são apenas "poços de problemas" dificeis de transmitir ensinamentos.
Também, e com base nas minhas observações, o que dizer então de alunos ditos normais que batem prepositadamente em professores, auxiliares e colegas? O que dizer da falta de educação grave que leva a que muitos professores do ensino regular tenham que engulir situações inaceitáveis sem poder reagir? O que dizer de drogas, gravidezes precoces, roubos, até tiros (recentemente noticiado)? Então mas porque raio os alunos com deficiencias - normalmente tão doceis, incapazes de violencia pensada ou arquitectada, puros e muitos deles, bastante mais bem educados e comportados que alunos sem perturbações - têm de ser o maior problema do ensino em Portugal... Tão grande que se advogam logo à partida tantas questões para travar o avanço da inclusão? Secalhar até fazia bem aos outros "meninos" mal comportados e normais terem de lidar com estes (claro que com "vigilância" e "formação" para o efeito... fazer-lhes uma espécie de sensibilização de vida para outras formas de viver, que não o terem nascido com tudo e assim mesmo desvalorizarem tudo!
Bom, termino com aquele abraço, grata pelo seu interesse, e disponível para ajudar... sempre, sempre estas causas. Pelo meu filho, mas por todos estes queridos meninos que tanto têm para nos dar e poucos são os que deles querem receber alguma coisa.
Cristina Franco
Cristina
Na abordagem da problemática da inclusão, assim como em outras, há, quase sempre, a necessidade de analisar sob várias perspectivas: política educativa; organizacional; administração e gestão escolar; direito da educação; pedagogia/didáctica; etc. É, de facto,complicado conjugar e fazer convergir tudo no mesmo sentido, sobretudo, para o trabalho com os alunos.
Apesar das barreiras, muitas vezes a prática pedagógica com os alunos NEE vai mais alémdo que a política educativa define. Tenho exemplos disso.
Concordo consigo quando se refere à falta de sensibilidade, de aceitação dos alunos com NEE nas escolas, e, talvez mesmo,na sociedade em geral.
Há, ainda, muito trabalho a fazer!
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