sábado, 29 de novembro de 2008

Avaliação sempre. Avaliação nunca

A fazer fé nos jornais - e temos de ter fé em algo - perfilam-se duas formas de avaliação muito sérias. Na aparência, ambas estão na montra da casmurrice que tem sido o diálogo de surdos entre sindicatos e ministério da Educação. Mas a casmurrice não é, para aqui, avaliada. Ambas são estimáveis. Uma triunfará. Ou nenhuma.
O ministério começa a ceder qualquer coisita. Quer recuperar fôlego. Inspira borbulhidos. Expira minudências. Abandona o acessório. Conserva o essencial esburacado. Convicções fortes.
Os professores podem, agora, pedir para ser avaliados por um avaliador da mesma área disciplinar. Então o docente de Contabilidade já não é competente para avaliar o de Filosofia? Despreza-se assim a possibilidade de haver uma contabilidade filosófica? Ou Educação Física aferida por educador tecnológico? É pena.
Os professores são dispensados, este ano, da análise dos resultados escolares dos alunos na sua avaliação. Já vão poder chumbar à tripa-forra? E o sentimento de orfandade de não ter todos os alunos no ano seguinte? Acho mal. Docente órfão dos filhos-alunos, que são retidos, repetentes, renitentes, não é docente.
Também acho curta a passagem de três para duas aulas dos docentes a serem observadas. Por que não baixar este número astronómico? Uma aula observada já é exagero. Espera-se gesto de boa vontade para baixar para menos. Alguém gosta de ser observado? Eu, pelo menos, fico intimidado quando Maria me observa. É infeliz esta minha observação. A pessoa fica como que presa por um fio. Dental.
É certo que, quem quiser, dispensa-se do parâmetro anterior. Mas não pode ser avaliado com Muito Bom ou Excelente. Acho excelente. As Finanças agradecem. Eu também. Os meus impostos não têm de andar a promover suas excelências. Além disso, o avaliador que será depois avaliado, vai atribuir Excelente a sua excelência o subalterno, esgotando as quotas? E fica o avaliador, na sua quota-parte, sem quotas?
Da parte dos sindicatos a coisa é mais séria e pragmática. Os sindicatos exigem a suspensão da avaliação. Eu pessoalmente detesto suspensão. Fiquei traumatizado. Sou suspeito. Apanhei, aluno do Liceu de Portimão, muitos dias de suspensão. E, também por suspeição, apanhei suspensão.
Nogueira só fala em suspensão, suspensão. Alguém tem coragem de suspender Nogueira? Credo! Não defendo a suspensão, pelo pescoço, tal como o José Estalinho fazia aos opositores na União que foi soviética. Ou nos campos gelados de concentração na matéria dada. Nada disso. Recolocar aquele bigodinho numa sala de aula, suspenso no pasmo dos seus alunos, não estragava nada. Nem o bigode, nem as crenças, nem o soviete supremo intersindical.
Mas não se duvide que os sindicatos querem avaliação. Outra qualquer. Que tem de ser muito bem pensada. Com tempo. As calendas gregas podem ser o curto prazo para avaliar em tempo útil. A alternativa ao actual modelo da avaliação, segundo o homem da Plataforma (estou a vê-lo a ministrar aulas em cima da plataforma, do palanque), passa, este ano, por um "documento de auto-avaliação" do docente. Acho muito bom e muito original. Nunca visto em Portugal. É por defenderem auto-avaliação que os sindicatos fretam autocarros para Lisboa. Não se faz auto-avaliação a pé.
A auto-avaliação é um complexo exercício de auto-gratificação. Quem há-de gabar o noivo senão o noivo? A auto-avaliação agarra-se etimologicamente ao prefixo auto. O docente pode fazer copy/paste de um bom documento, descarregado da net, carrega no enter e é auto, automático. O conselho pedagógico assentirá. Docente automaticamente avaliado. Abalizado. Rápido. Barato. Dá a milhões. Não digo a milhões, mas a dezenas de milhar de docentes, a morte das sevícias de duas aulas observadas. Ou menos.
Todos querem avaliação. Os sindicatos mais. O Ministério menos. Os docentes assim-assim. Sim. Talvez. Não. Avaliação sempre. Avaliação nunca. Entendam-se. Avaliação é coisa séria. Não é para rir.
Expresso Online

Sem comentários: