Duas crianças, uma com 20 meses e outra com sete anos, com paralisia cerebral, deverão começar hoje os tratamentos de reabilitação neurológica na clínica neuropediátrica CHS-CIREN, que traz para Portugal o modelo de intervenção desenvolvido há 20 anos em Havana, no Centro Internacional de Reabilitação Neurológica (CIREN). O centro vai funcionar numa ala do Hospital Privado de Guimarães, por agora apenas com tratamentos para crianças e jovens até aos 16 anos, com lesões ou distúrbios do sistema nervoso, epilepsia ou autismo.
O projeto esteve para arrancar ainda em 2011, na altura inserido no Instituto Superior de Saúde do Alto Ave. Agora surge pela mão de uma empresa de consultoria e formação, EATS - Estudos Avançados. José Nunes Maia, professor aposentado do ISCTE e um dos administradores desta empresa, explica que o acordo com o CIREN passa essencialmente pela transferência de conhecimento, com a formação dos técnicos portugueses em Cuba e vinda de especialistas cubanos. Sem especificar o investimento total, o gestor sublinha que foi preciso pagar direitos de autor do modelo, mas a fatia maior diz respeito à mobilização de uma equipa multidisciplinar, com capacidade para acompanhar até seis crianças.
O modelo do CERN passa por tratamentos intensivos de recuperação neurológica, com base na capacidade de adaptação do cérebro. Além de juntar várias especialidades no mesmo ciclo de tratamentos – da fisioterapia à terapia da fala, acupuntura ou ozonoterapia – a grande vantagem, disse a diretora técnica do novo centro Isabel Maia, é a intensidade dos tratamentos. A avaliação dura uma semana e cada ciclo tem quatro semanas com intervenções de segunda-feira a sábado, sete horas/dia. “O facto de termos as crianças connosco durante 28 dias seguidos a fazer um programa intensivo de reabilitação e restauração neurológica vai trazer resultados que nunca serão iguais aos de uma ou duas horas de fisioterapia semanal”, diz. “Uma ou duas horas podem fazer com que as crianças não percam funções, mas com esta intensidade queremos recuperar competências.”
Isabel Maia, formada em enfermagem, diz que durante a formação em Cuba viu crianças com paralisia cerebral, os casos mais frequentes, recuperarem o equilíbrio ou começarem a dar os primeiros passos, mas rejeita a ideia de que haja promessas feitas aos pais: “é feita uma avaliação individual e são fixados objetivos consoante o caso.” Já os preços – 2700 euros pela avaliação e 6 mil euros por ciclo de tratamento, que inclui alojamento e alimentação para a criança e um acompanhante – são elevados, admite, mas tendo em conta que refletem sete horas de intervenção diária, “não está acima do que é cobrado numa consulta ou sessão de fisioterapia.” Para já apenas com duas crianças inscritas, o centro tem sido contactado por pais que esperam iniciar tratamentos nas férias escolares. “As pessoas que já foram a Cuba, ou vão a Cuba, terão vantagens em vir cá, porque os ciclos saem mais baratos e não têm tantas despesas de deslocação. Quem nunca foi, até pela barreira da distância, tem uma oportunidade.” Em Cuba, o ciclo de tratamentos no CIREN, excluindo alojamento e alimentação, custa 5400 euros.
O CIREN foi fundado em 1989 em Havana e o método de reabilitação intensiva surgiu para dar resposta aos doentes com Parkinson, que na altura começavam a ser operados. Num artigo publicado em 2006, os responsáveis do centro davam conta de 16 mil tratamentos a doentes de 70 países. No último ano para o qual foi possível ter dados, 2004, foram administradas no CIREN 16 mil horas de terapia da fala e 115 mil horas de exercícios físicos. Uma das figuras mais polémicas na história do centro tem sido a neurocirurgiã Hilda Molina, fundadora do centro e do modelo de intervenção agora importado para Portugal. Em 1994, depois de críticas ao regime de Fidel Castro por apostar mais no turismo de saúde e no tratamento de estrangeiros no CIREN do que no reforço da saúde dos cubanos, rescindiu das funções públicas, incluindo o posto no centro e o cargo de deputada.
In: I online
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