quinta-feira, 8 de março de 2012

As famílias também pedem ajuda



A terapia familiar tem espaço nas escolas. Pais e filhos têm dúvidas, fazem perguntas, procuram respostas. Os especialistas escutam e explicam que o primeiro passo para a mudança passa pela forma de agir dos adultos.

O meu filho tem 13 meses e mordeu um colega. Será normal? A pergunta faz todo o sentido para os pais que, muitas vezes, desconhecem que os bebés passam por uma fase oral. O meu filho deixou de comer bem. O que devo fazer? Temos uma criança com défice de conhecimento. Como devemos atuar? Estas e outras perguntas são feitas nas escolas ou em consultórios de terapia familiar. Preocupados com a maneira de atuar, e perante dificuldades que se atravessam nas suas vidas, os pais procuram respostas para as dúvidas que diariamente lhes batem à porta. O EDUCARE.PT recolheu dois testemunhos de quem está do outro lado, de quem tem a árdua tarefa de responder, esclarecer dúvidas e indicar caminhos. Cristina Cruz é psicóloga. Trabalha no Infantário da Rochinha e na EB2,3 dos Louros e tem ainda um consultório privado no Funchal, Madeira. Lida com bebés, crianças e jovens, da infância à adolescência. "A minha intervenção centra-se essencialmente na procura de competências das famílias, numa posição de capacitá-las para a crise existente no momento", conta. "As famílias passam por várias etapas de desenvolvimento - a que chamamos ciclo vital da família - e nessas etapas, muitas vezes, surgem crises. É durante essas crises que as famílias nos procuram como forma de ajudá-las", acrescenta. 

Os tempos mudam, as necessidades alteram-se, as exigências aumentam, pais e mães querem dar conta do recado. Os técnicos são confrontados com as questões das famílias e, por isso, é fundamental desenvolver relações e estratégias positivas, que resultem. Neste momento, Cristina Cruz tem nas mãos um grupo de competências parentais. Fala de práticas educativas parentais adequadas para aumentar a eficácia na parentalidade, tenta prevenir ou reduzir a utilização de práticas menos recomendadas, dá formação a pais e dá conselhos. Sugere estratégias que possam funcionar. "É sempre possível dar respostas e sugestões. As nossas sugestões não são sugestões diretas, mas sim reflexões que as famílias poderão realizar", explica. 

Porquê isto acontece? O que devo fazer? Estarei a fazer bem ou estarei a fazer mal? As questões sucedem-se. "Temos sempre em conta a estrutura da família, o seu desenvolvimento, a sua relação com as gerações e a parte comunicacional, como é que os membros do grupo comunicam e se relacionam", adianta Cristina Cruz que na escola tem um gabinete só para si, onde pode receber as famílias e dar-lhes a privacidade que procuram para expor as situações. "A questão do ambiente é fundamental para as famílias se sentirem acolhidas e ouvidas, o que muitas vezes não acontece. Cada vez mais, as famílias não têm tempo para os assuntos da escola". 

Cristina Cruz recorda Minuchin, terapeuta familiar, que defendia que os técnicos devem entrar na dança com as famílias, mas depois têm de deixá-las dançar sozinhas. "Como terapeuta familiar, tem sido uma delícia trabalhar com famílias com filhos pequenos. Quando são famílias multiproblemáticas, o desafio de intervenção ainda é maior, no sentido de envolver outras entidades". O trabalho em rede é importante e pode fazer toda a diferença. 

Há 12 anos que a psicóloga Susana Gonçalves trabalha na Cercimor, em Montemor-o-Novo, e, neste momento, coordena a Equipa Local de Intervenção de Vendas Novas do Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância. Trabalha com crianças até aos seis anos de idade com deficiências pessoais e sociais e em risco grave de atraso de desenvolvimento. Trabalha com crianças, trabalha com famílias e é aqui que a terapia familiar se interliga no seu trabalho. 

"Trabalhar com famílias nem sempre é fácil e a formação em terapia familiar deu-me instrumentos para poder abordar as famílias da intervenção precoce de forma mais rigorosa e profissional", refere. É importante reunir todos os elementos da família nuclear para que todos participem na procura de soluções e se ajudem mutuamente, sobretudo no caso de uma criança portadora de deficiência - nestas situações, torna-se complicado gerir emoções, comportamentos e relacionamentos. 

Há situações em que as famílias procuram ajuda, em que os papéis parentais ficam confusos. "O nosso objetivo é sempre dar instrumentos, estratégias, informações para a família saber lidar melhor com a sua criança". "As questões que nos são colocadas têm muito a ver com as birras, a educação de uma forma geral. E os pais esperam quase sempre soluções mágicas de resolver os problemas, quando na verdade o primeiro passo da mudança passa pelo adulto e pela sua maneira de agir", refere Susana Gonçalves. 

As dificuldades financeiras também fazem parte das preocupações familiares. "Com o cenário social de crise que atualmente o país atravessa, começam a surgir situações complicadas de famílias sem possibilidade de satisfazerem as suas necessidades básicas, famílias que estavam organizadas e eram funcionais começam a perder a sua segurança e surge a instabilidade emocional, a ansiedade, as situações de depressão, que levam ao estabelecimento de relações menos boas com as suas crianças. Não há tempo, não há momentos de prazer, não há paciência...". Susana Gonçalves considera que é aqui que surge o maior alerta: é necessário perceber a importância do estar, do brincar, de incluir as crianças. "Os pais podem ter menos dinheiro para comprar, mas devem ter amor incondicional para dar". 

Incondicional significa estar presente, educar, saber dizer sim e não, partilhar problemas, incluir os filhos nas suas vidas e não esconder ou omitir coisas menos boas. "As crianças adaptam-se muito melhor do que os adultos a novas formas de vida, mas é necessário explicar o quê, o porquê e o como, e procurar ajuda sempre que surjam dúvidas sobre a melhor forma de o fazer". E os pais que se interessam, se envolvem e procuram apoio conseguem alcançar melhores resultados. Susana Gonçalves está contente com o que faz. "Numa perspetiva geral do meu trabalho, posso dizer que é bastante gratificante, é muito bom verificar as evoluções e mudanças por que as famílias passam quando têm de se adaptar a novas situações familiares, e partilhar com eles as conquistas que os seus filhos vão fazendo."
Sara R. Oliveira
In: Educare

Sem comentários: