Pelo menos uma parte dos alunos com necessidades educativas especiais (NEE) vão passar, já a partir deste ano, a fazer os mesmos exames que os estudantes que não têm esse diagnóstico. O alerta foi feito hoje (ontem) de manhã durante uma conferência sobre educação especial promovida pela comissão parlamentar de Educação.
Em resposta a questões do PÚBLICO, o Ministério da Educação e Ciência esclareceu que os exames diferenciados, a nível de escola, continuarão a ser possíveis para alunos cegos, surdos ou com limitações motoras severas. Mas os alunos do 6.º com limitações cognitivas farão, já este ano, as mesmas prova finais de Língua Portuguesa e Matemática do que os seus colegas. Estas provas realizam-se este ano pela primeira vez e têm um peso de 25% na classificação final da disciplina.
"Como é que estes alunos farão? Vão confrontar-se com o insucesso", alertou uma docente do educação especial, da Sobreda, Almada*. No seu esclarecimento, o MEC frisa que se pretende que os alunos com limitações cognitivas “sejam preparados, com a aplicação das diferentes medidas educativas estipuladas” no diploma de 2008 que inventaria os apoios especializados a prestar aos alunos com NEE, de modo a poderem realizar as provas finais do 2.º ciclo. Já os alunos na mesma situação que estão agora no 9.º ano poderão “ainda realizar provas a nível de escola no presente ano letivo”.
Segundo o MEC, os exames finais a nível de escola poderão ser também realizados por alunos cegos, com baixa visão, surdos severos ou com limitações motoras severas. Para este efeito, as escolas terão de pedir autorização ao Júri Nacional de Exames, dependendo a realização destes exames de autorização prévia deste organismo.
As escolas terão também de pedir autorização prévia para garantir que os alunos com NEE tenham condições especiais de realização dos exames, confirmou o MEC. Ou seja, os alunos com necessidades educativas especiais podem usufruir de mais tempo para realizar o exame; se forem cegos podem ouvir a prova num cd ou esta pode ser-lhes lida; se for diabético pode parar a meio do exame para comer; se for surdo pode ter presença de um intérprete de Língua Gestual Portuguesa, etc; mas só se a escola justificar ao JNE.
No parlamento, professores e pais deram conta que a confusão se instalou nas escolas sobre os procedimentos a seguir. Uma mãe de uma aluna do 6.º ano com necessidades educativas especiais contou ao PÚBLICO que na semana passada foi chamada à escola da filha para lhe comunicarem que ela terá de fazer a mesma prova final que o ministério elaborará para todos os estudantes daquele ano de escolaridade. A filha está integrada numa turma do ensino regular, mas segue outro programa e tem também testes de avaliação diferentes, Disseram-lhe que tinham sido essas as ordens que receberam do Júri Nacional de Exames (JNE).
Atualmente, há alunos da educação especial com currículos específicos e que não fazem exames. Esta situação destinada a “alunos com limitações cognitivas severas” mantém-se, indicou o MEC. Ou seja, estes alunos não realizarão as provas ou exames finais. Outros estudantes com necessidades educativas especiais cumprem o currículo nacional, embora com adequações, e realizam exames. No entanto, estes são elaborados pela própria escola, tendo em conta as características do aluno.
Essas adequações deixarão de ser possíveis, a partir do momento em que estes alunos façam o exame nacional, ao lado dos que não têm necessidades educativas especiais.
“É chocante e até desumano”, comenta Manuela Pereira, docente do educação especial, que alerta para o choque emocional que esta alteração poderá provocar nos alunos em causa: “Para muitos já é um sofrimento irem à escola, por não terem as mesmas capacidades do que os colegas. Durante o ano letivo têm testes diferenciados e agora vão ter de fazer as mesmas provas do que os outros”.
In: Público online
* Informação retificada por informação da própria.
3 comentários:
Sou docente de educação especial e ainda estou estupefacta com esta noticia. Os exames de escola são só para os alunos com problemas motores graves, cegos e baixa visão e surdos. Onde ficam os alunos com problemas cognitivos ligeiros e moderados, que ao longo do seu percurso escolar, foram beneficiando de adequações curriculares, pedagogia diferenciada, testes diferenciados? Como pode alguém pensar que estes alunos conseguirão fazer um exame nacional, mesmo com adequações de avaliação, nomeadamente: leitura da prova, mais tempo, etc? Vamos empeurrar estes alunos para o currículo específico individual? Vamos retira-lhe qualquer hipótese de terem um certificado de habilitações para poder ter uma simples profissão ao invés do trabalho protegido ou em centros de ed. especial? Acho que deviam pensar seriamente nestas situações. É muito grave, muito grave mesmo. Tenho pena que as pessoas que não sabem do que se passa nas escolas façam estes tipos de comentários
Sim é verdade. Eu como docente de educação especial tambem estou estupefacta poios pensei estar a interpretar mal a legislação. Onde querem chegar? Impedir que não cheguem ao secundário? assim conseguem mas, para quem acompanha estes alunos sabe que isto é um crime.
De facto, esta situação é grave e constitui um retrocesso no processo de inclusão ao fomentar o provável insucesso educativo dos alunos com NEE. Vem violar o princípio da individualização das medidas educativas e condicionar o acesso ao sucesso. Enfim...
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