No ano lectivo passado, as situações de bullying em contexto escolar aumentaram 37%. A PSP registou 2847 ocorrências criminais com as injúrias e ameaças a atingiram o valor mais elevado dos últimos nove anos lectivos, revelam dados daquela polícia, no Dia Mundial do Combate ao Bullying, que se assinala nesta quinta-feira.
A pensar nas crianças e nos jovens que são vítimas ou agressores, a Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP) criou um documento com o intuito de ajudar a aumentar a consciencialização para a gravidade deste fenómeno que deve ser acompanhado por pais e professores, mas também pelos alunos.
O que é o bullying?
Chama-se bullying a qualquer comportamento agressivo que seja exercido repetidamente, por um indivíduo ou grupo, com a intenção de magoar alguém física ou psicologicamente. Trata-se de um comportamento premeditado e repetitivo que acontece com o propósito de provocar mal-estar e ganhar controlo sobre outra pessoa.
Que comportamentos podem ser considerados bullying?
Todos os comportamentos que implicam uma forma de “intimidação, agressão ou humilhação física, psicológica, relacional ou sexual”, responde o documento “Vamos falar sobre Bullying”.
De acordo com a OPP existem vários tipos de bullying entre os quais o físico que envolve comportamentos como bater ou cuspir, mas também comportamentos de cariz sexual como acariciar ou tocar alguém contra a sua vontade. Fala-se também no bullying verbal que se manifesta através de insultos, ameaças ou provocações, e no bullying socioemocional que envolve o isolamento ou exclusão social de alguém fazendo com que se sinta rejeitado.
A Internet tornou-se também o palco para outro formato de bullying conhecido por cyberbullying e que envolve a sua utilização para enviar mensagens de cariz insultuoso e para a partilha de informação de alguém contra a sua vontade.
Com que frequência o bullying acontece?
Este é um fenómeno muito comum entre as crianças e os jovens ocorrendo, na maioria das vezes, em ambiente escolar. Apesar disso, a OPP afirma haver uma dificuldade na exactidão com que este fenómeno é praticado dado que mais de 60% das vítimas opta por não denunciar o agressor.
Segundo os dados da PSP, a que a Lusa teve acesso, houve um aumento do número total de ocorrências depois do período em que os estudantes estiveram em casa, por causa da pandemia de covid-19. No entanto, registou-se “um decréscimo no número de ocorrências registadas em contexto escolar relativamente ao ano lectivo de 2018/2019, último antes da pandemia”. Nesse ano foram registandas 3079 ocorrências criminais em contexto escolar, 1151 das quais por agressões e 721 por injúrias e agressões.
Quem pode ser vítima de bullying?
Qualquer criança ou jovem pode ser vítima de bullying, no entanto, a OPP considera que existem alguns factores que podem levar a que alguém seja mais propenso a tornar-se uma vítima como o facto de ser visto como diferente pelos outros.
As vítimas de bullying são frequentemente vistas como mais frágeis, por parte dos agressores, e são geralmente mais novas. De acordo com o relatório publicado pelo Projecto Free, em Maio de 2022, em Portugal as vítimas preferenciais de bullying são jovens LGBTQ+ com idades compreendidas entre os 14 e os 19 anos.
Quem pode ser um bully?
Bully é o nome que se dá aos agressores, a quem pratica o acto de bullying, podendo ser qualquer jovem com as mais diversas características. Este comportamento é, frequentemente, visto como associado à dificuldade que o agressor tem em gerir emoções, o seu preconceito em relação à vítima — seja por esta possuir uma aparência diferente ou pela sua etnia, religião ou orientação sexual —, ou como resposta aos comportamentos agressivos a que é exposto, por exemplo, em casa.
São jovens em que se reconhece geralmente menos empatia pelo outro, dificuldades em seguir regras e uma atitude positiva em relação a atitudes violentas.
Quais são os impactos do bullying?
O bullying afecta todos os envolvidos, directa ou indirectamente. As vítimas podem ter o seu desenvolvimento afectado comprometendo a sua aprendizagem e relações interpessoais. Também os agressores podem revelar consequências dos impactos do bullying entre as quais dificuldades académicas ou maior propensão ao consumo de substâncias.
Este fenómeno afecta também as testemunhas, dado ser frequente que as ocorrências aconteçam perante outras pessoas, levando as “testemunhas passivas a desenvolver sentimentos de culpa e vergonha”. Também as famílias “podem ser afectadas por sentimentos de preocupação e impotência, níveis mais elevados de stress, dúvidas e incertezas sobre como ajudar”, enumera o documento da OPP.
Como identificar uma vítima de bullying?
É importante que se esteja atento aos possíveis sinais de que uma criança ou jovem possa ser uma vítima como, por exemplo, a ocorrência de alterações de humor, demonstrações de medo e preocupação constantes, isolamento dos outros sem explicação, desconforto em ir à escola.
Podem também existir sinais visíveis como nódoas negras ou feridas sem explicação coerente. No entanto, é importante compreender que estes sinais nem sempre estão associados a situações de bullying, podendo ser comuns a outras situações.
Como saber se alguém pratica bullying?
Existem também alguns sinais que podem ajudar a identificar um bully, entre os quais se inclui o sentimento de dominar ou subjugar os outros, tentar obter o que deseja com ameaças, intimidação das crianças com quem brinca ou zangar-se facilmente com os outros. É também recorrente haver dificuldades em obedecer às regras ou desafiar a autoridade dos pais ou dos professores.
Como ajudar um amigo/a ou colega que é vítima de bullying?
A frequência com que as situações de bullying acontecem perante testemunhas demonstra o quão importante é fazermos alguma coisa para ajudar a travar este comportamento e não optarmos por incentivá-lo ou agir como meros espectadores.
O primeiro passo passa por falar com um adulto de confiança, explicando-lhe da melhor maneira possível o que se viu. Existem também outras coisas que podemos fazer para ajudar como o simples de acto de fazer companhia ao colega vítima de bullying, ajudando a que se sinta mais seguro por não estar sozinho, tal como travar estes comportamentos quando os vemos a acontecer dizendo ao bully para parar.
Como pais ou cuidadores o que fazer para ajudar?
A OPP considera que o envolvimento “dos pais, mães e cuidadores/as é essencial na prevenção do bullying”. Devido às dificuldades que podem existir de identificar alguns dos sinais ou comportamentos resultantes deste fenómeno é importante que os adultos prestem atenção a qualquer mudança de comportamento.
"Às vezes as crianças sentem que o bullying é culpa sua, que se tivessem agido de forma diferente, não teria acontecido. Às vezes, têm medo que o bully descubra que contaram a alguém e que tudo piore. Outras têm receio que os pais não acreditem nelas”, enuncia o documento da Ordem dos Psicólogos, apelando a que os pais não menosprezem o que lhes é relatado.
Nesse sentido, a melhor forma de ajudar passa por ouvir e compreender se se trata de bullying, falando sobre a importância de estar atento e como se pode defender, garantindo que a criança ou o jovem compreende a gravidade e se sente segura para denunciar e procurar ajuda quando necessitar. É ainda fundamental fornecer-lhe um espaço seguro para que possa conversar abertamente.
A forma mais eficaz de falar com as crianças e os jovens passa por uma abordagem directa em que se tenta perceber o que entendem por bullying e como reagiriam em determinadas situações. É importante realçar que a gravidade do tema implica que seja frequentemente abordado, também dada a dificuldade que algumas crianças, mais introvertidas, possam ter de se pronunciar sobre o assunto.
A OPP recomenda aos pais que se reconhecerem alguns sinais nos seus filhos de que possa estar a praticar bullying, também é importante intervir e fazê-los compreender que não se trata de um comportamento “normal”.
A organização apela ainda a que se “resista à tendência para negar ou desvalorizar a gravidade do problema”, tentando ajudar a modificar os comportamentos agressivos que a criança possa ter face aos outros e mostrando-lhe que se trata de um comportamento inaceitável, sem nunca recorrer a castigos físicos porque apenas “reforçará a crença de que a agressividade e o bullying são aceitáveis”.
Sou professor/a ou educador/a, o que posso fazer?
Com a frequência em que situações de bullying ocorrem em contexto escolar torna-o o cenário privilegiado para a sua prevenção, devendo as escolas procurar colaborar com os pais e as mães neste trabalho.
Assim, no âmbito da prevenção, é fundamental que as escolas continuem o seu trabalho de sensibilização através da abordagem do tema em sala de aula e dando um espaço aos alunos para que discutam sobre o fenómeno, tal como se deve privilegiar a criação e implementação de acções de formação e sensibilização que ajudem a reconhecer e denunciar este género de comportamentos.
Na escola, é também importante promover um ambiente de respeito pelo próximo e procurar estar atento aos espaços onde o bullying pode ocorrer, entre os quais o recreio, as casas de banho ou os corredores da escola, e interferir ao menor sinal.
A Ordem dos Psicólogos Portugueses destaca ainda a importância das políticas anti-bullying nas escolas e da implementação dos programas de desenvolvimento de competências socioemocionais, com o apoio de psicólogos.
Fonte: Público
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