quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

Mais professores a ensinar braille “é tão essencial como ter a palavra escrita”

Este método de escrita e leitura foi inventado por Louis Braille, um pedagogo francês, no início do século XIX e, segundo dados das Nações Unidas, estima-se que seja usado por cerca de mil milhões de pessoas.

Em entrevista à agência Lusa, Rodrigo Santos, que tomou posse como presidente da direção da Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal (Acapo) em 19 de novembro do ano passado, defendeu a importância de ter mais pessoas a ensinar este sistema de escrita e de leitura, bem como de ter o braille presente em mais sítios e em mais produtos, serviços ou soluções: “É tão essencial como ter a palavra escrita”.

“Achamos crucial que mais professores saibam braille [e] também temos de achar crucial que todos os professores tenham um domínio básico de ensinar a ler e escrever braille e que o sistema tenha soluções que garanta que há professores especializados que percebem não apenas do braille, mas também do ensino específico do braille”, defendeu.

Entende, por isso, que “todos os professores” deveriam ter uma “formação genérica” que os sensibilize para a importância do braille e para a importância da estimulação tátil, porque é desta forma que as pessoas cegas “percecionam de imediato a realidade”.

“Achamos que é crucial investir na formação específica dos professores de educação inclusiva”, apontou.

A conversa decorre nas oficinas da Acapo, onde a associação tem as impressoras e os equipamentos necessários à conversão e impressão de documentos em braille, não só em papel, mas noutros materiais, como acrílico, por exemplo, e onde faz a certificação de braille.

“Nós não só produzimos braille, seja em placas de relevo, seja em cartões de visita, livros, em todo o tipo de documentos, como, para além disso, também certificamos braille, isto é, certificamos que a representação do braille é correta para depois ser impresso nas diversas embalagens de muitos produtos que nos utilizamos no dia-a-dia”, explicou Eduardo Santos.

Aires Alves é um dos responsáveis por este serviço, que faz já há 28 anos, e que, para si, representa a concretização de um sonho.

Contou à Lusa que “quando era miúdo dizia que queria fazer livros para pessoas cegas” porque no tempo em que andou na escola quase não teve acesso a livros e sentia que havia muita falta.

“Se conseguisse mais tarde fazer livros para quem os não tinha, achava que estava a comprimir a minha missão”, confidenciou, admitindo que conseguiu não só concretizar o seu sonho, mas o de muitas outras pessoas: “Ter um livro para ler”.

Para Aires Alves, “hoje é tudo mais fácil” e apontou que quase ninguém quer ler em braille, já que facilmente têm acesso a tecnologias que, no momento, permitem ouvir a leitura de um livro.

“As pessoas cegas, se calhar, é que não têm aquele empenho em aprender braille porque hoje sai um livro e ele já está à minha disposição e se eu quiser um livro em braille é capaz de demorar anos a fazer”, admitiu, lembrando que uma biblioteca para normovisuais tem “milhões de títulos”, mas apenas cerca de nove mil publicações para cegos.

Lembrou, por outro lado, o espaço que ocupa um livro em braille, já que uma página em tinta corresponde a cerca de quatro páginas em braille, apontando também que a produção destes livros é muito cara.

Rodrigo Santos, no entanto, acredita que o “braille está vivo” e que não é uma coisa do passado, mas plenamente do século XXI, capaz de se adaptar e transformar às novas necessidades, uma ferramenta única, já que só ela permite às pessoas cegas “acederem a reprodução daquilo que é a palavra escrita”.

“Acho que as gerações mais novas, apesar de terem outros mecanismos para acederem à informação, quando o objetivo é ler, aceder à palavra escrita, com as letras todas, o braille continua a ser o sistema que preferem e não se pode dizer que esteja a perder importância”, sublinhou o presidente da Acapo.

Nesse sentido, lembrou que a realidade do ensino do braille em Portugal ainda passa por que muitas crianças sejam obrigadas a sair da sua zona de residência e do seu meio educativo.

Defendeu, por isso, que haja mais formação de professores para ensino de braille e de outras técnicas essenciais para as pessoas com deficiência visual, sublinhando que “há ainda um longo caminho a percorrer”.

“Enquanto não conseguirmos que aprender braille seja tão natural para qualquer criança com deficiência visual como é para qualquer criança aprender a ler e a escrever, por nós a missão ainda não esta cumprida”, rematou.

Fonte: Visão por indicação de Livresco

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