A relevância social da educação e dos professores na Ásia é parte da explicação para o facto de cinco países daquele continente dominarem os rankings de Matemática e Ciências no relatório internacional TIMSS, divulgado esta terça-feira. “Devemos aprender com eles”, defende Dirk Hastedt, director-executivo da International Association for the Evaluation of Educational Achievement, o consórcio responsável pelo estudo.
A diferença entre os resultados dos rapazes (533 pontos, numa escala até 1000) e das raparigas (516) do 4.º ano a Matemática aumentou 6 pontos entre 2015 e 2019 em Portugal. É uma tendência que também se observa noutros países?
Quando começámos o TIMSS, em 1995, os rapazes tinham melhores resultados do que as raparigas em cerca de metade dos países. Na outra metade não havia diferença e não encontrámos nenhum país onde as raparigas tivessem mais sucesso. Ao longo dos anos, fomos vendo uma cada vez maior igualdade entre géneros.
Contudo, no TIMSS 2019 temos um resultado surpreendente: há um aumento na diferença entre os resultados dos rapazes e das raparigas no 4.º ano a Matemática. Penso que isso é preocupante. Há nove países onde, em 2015, não havia diferenças de género significativas e que passaram a tê-las, em 2019. E há outros casos, como o de Portugal, onde essa diferença aumentou.
Porquê?
Quando vemos os resultados de Portugal, há uma diminuição clara do desempenho dos rapazes no 4.º ano (menos 14 pontos em média), mas a diminuição nas raparigas foi ainda maior, foram menos 20 pontos. Isso é algo que vimos acontecer noutros países.
Temos um imenso manancial de dados, o relatório internacional tem mais de 300 tabelas com informações de contexto e, seguramente, será algo que vamos continuar a estudar nos próximos meses para perceber se conseguimos encontrar algumas das razões subjacentes.
Mas na Ciência, isso já não acontece.
No caso do 4.º ano, a diferença entre rapazes e raparigas em Portugal é de cinco pontos. No 8.º ano nota-se uma melhoria espantosa. Entre 1995 e 2019, o desempenho dos rapazes aumentou 33 pontos, mas no caso das raparigas foi bem maior – 60 pontos. Têm agora uma diferença de 6 pontos e, em 1995, era de mais de 30 pontos. São resultados excelentes.
O que explica o sucesso dos países asiáticos, que lideram os rankings do TIMSS?
Há razões diferentes e uma delas é cultural. Podemos ver quanto estes países colocaram a ênfase na educação. Há um valor cultural em ter boa educação. Quando olhamos para as escolas, vemos que são extremamente organizadas e têm professores muito bem formados.
Estes países dão tempo aos professores para prepararem bem as suas aulas e também lhes dão bastante tempo para formação e desenvolvimento profissional. Por exemplo, em Singapura [que lidera os quatro rankings do TIMSS], os professores têm um mínimo de 100 horas anuais de desenvolvimento profissional. E esse número pode subir se um professor pedir ou se o director da escola detectar alguma necessidade.
Nos inquéritos que fazemos juntamente com o TIMSS, 70% dos professores disseram que precisam de formação para integrar as novas tecnologias da informação no seu método de ensino. E esta pergunta foi feita em 2019, antes da crise que a covid-19 provocou na Educação. Talvez agora sejam ainda mais. Além disso, 60% dos professores disseram precisar de formação para ensinar os alunos a resolver problemas e para o que chamamos aptidões para o século XXI.
O foco deve estar nos professores, portanto?
Se valorizamos uma pessoa, devemos colocá-la num lugar em que isso seja evidente para a sociedade. Quando um estudante chega a um gabinete de um professor e há mobiliário com 30 anos e está desgastado ou sujo, isso também causa uma impressão. Se queremos que as pessoas valorizem a educação, devemos começar por valorizar os nossos professores. E isso começa num nível político. Não estou a falar apenas de salários.
É preciso dar-lhes um local de trabalho com condições e dar-lhes assistentes, por exemplo. Deixa-me triste quando vejo um professor bem pago e que está em frente a uma máquina fotocopiadora durante uma hora a copiar materiais para os seus estudantes. Devemos ter assistentes para isto. Isso é algo que podemos aprender com os países asiáticos.
Fonte: Público
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