domingo, 25 de julho de 2010

Consolas aumentam o risco de défice de atenção


Estudo americano diz que consolas aumentam em 67% o risco de défice de atenção. Especialistas nacionais falam em vício. Nas férias há carta branca, mas sob vigilância dos pais.
A meio do ano lectivo passado, as notas de Física e de Matemática de quase metade da turma do 11.º ano do Liceu Francês, em Lisboa, começaram a descer, sem razão aparente. Mas os indícios de que algo de estranho se passava revelavam-se no comportamento diário nas aulas: pouca atenção, sonolência, falta de produtividade.
"Acabámos por decobrir que havia um grupo de rapazes que jogava em rede durante horas a fio, até de madrugada", explica o professor e psicólogo Pedro Hubert, acrescentando: "A situação estava a ficar problemática, ao ponto de um deles, quando confrontado pela mãe sobre o excesso de horas a jogar, lhe atirar com o teclado."
Aos riscos da utilização repetida dos videojogos no dia-a-dia, um estudo norte-americano, publicado na edição deste mês da revista Pediatrics, junta agora o défice de atenção e a hiperactividade, um problema que, em Portugal, afecta 50 mil adultos e crianças e é considerado pelos especialistas uma das principais causas para o insucesso escolar e a difícil integração social.
O estudo mostra que esta utilização abusiva faz subir para 67% o risco de a criança ou o adolescente vir a sofrer de défice de atenção e de hiperactividade. Na investigação participaram 1323 adolescentes, de 10 colégios dos vários estados norte-americanos, que foram acompanhados durante um ano.
As opiniões dos especialistas portugueses dividem-se quanto aos malefícios dos videojogos, mas todos estão de acordo ao considerarem um exagero a sua associação ao défice de atenção e à hiperactividade, que tem sobretudo razões genéticas.
"São coisas diferentes e que não têm relação de causa-efeito. Já havia défice de atenção antes do tempo das consolas", contrapõe a pediatra Ana Vasconcelos. "São até uma forma de os deixar calmos e concentrados", diz ainda Linda Serrão, presidente da Associação Portuguesa da Criança Hiperactiva, que tem em casa três casos, com 11, 14 e 18 anos.
Ainda assim, os perigos existem. "Os grandes problemas têm a ver com a falta de produtividade, cansaço, falta de concentração", sublinha Pedro Hubert, garantindo comprovar estes comportamentos no seu dia-a-dia como professor. "Quando estão a jogar, estão completamente desligados da realidade que os rodeia, e, ao contrário das aulas, aqui a necessidade de concentração é mínima, a tarefa é feita automaticamente. Quando chegam às aulas estão muito desconcentrados", constata o psicólogo clínico.
"Muitas horas a jogar transtorna as crianças", concorda Ana Vasconcelos. "Ficam completamente fora do mundo real e não é importante o que eles aprendem através dos jogos".
Os especialistas alertam ainda para o risco de adição. "O que está em causa é a competição muito forte nestes jogos, que os torna muito atractivos e absorventes. Desempenham a função de alheamento, de evasão, de adrenalina, de acção, de euforia e de risco, que os miúdos adoram", explica Pedro Hubert, que lida com muitos casos destes no consultório.
É aos pais que cabe impor regras e limites ao tempo que os filhos dedicam aos jogos. Nas férias, há carta branca, mas no regresso às aulas é preciso apertar a vigilância. Foi o que aconteceu com a turma do Liceu francês: "As notas da turma começaram de novo a subir porque houve um trabalho entre pais e professores."

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