Apesar de o princípio de base de que qualquer castigo físico viola os direitos básicos de qualquer ser humano (e em particular os das crianças) e apesar de os mais de 1500 estudos científicos acerca das suas consequências nefastas para o desenvolvimento, isto parece não ser ainda suficiente para que os pais abandonem de vez essa prática de disciplina dos seus filhos.
Com a palmada, o punidor faz sofrer a criança com um castigo corporal tendo como o objetivo de lhe dar uma “lição”. Usar palmadas para disciplinar um filho é uma forma de confiar no medo para fazer com que a criança tenha o comportamento desejado. É uma forma de usar a agressão para obter obediência.
O tema da palmada permanece ainda muito controverso, embora a pesquisa seja extremamente reveladora, muito clara e consistente sobre os seus efeitos negativos. Nos últimos 50 anos, muitas foram as investigações acerca dos efeitos desta forma de disciplinar as crianças com castigo físico. Os efeitos negativos na criança vão muito para além do evidente magoar fisicamente. A palmada tem um impacto emocional que não devemos ignorar e que traz danos de longo prazo para o desenvolvimento da criança.
Os resultados são claros: crianças que são disciplinadas fisicamente com palmadas são emocionalmente menos saudáveis do que as outras crianças.
Os dados mostram também de forma inequívoca que o castigo corporal torna as crianças mais agressivas e menos obedientes ao longo do tempo, sendo que o único resultado positivo imediato que se possa obter — ou seja, a obediência no momento — não está provado.
Quanto mais as crianças são agredidas pelos pais e cuidadores, maior é a probabilidade de elas baterem noutras, incluindo colegas e irmãos. Porque bater em crianças ensina-lhes que é aceitável bater nos mais pequenos e mais fracos. Quando adultos, aumenta a probabilidade de que batam também nos seus parceiros.
As palmadas impedem o desenvolvimento moral, socioemocional e até cognitivo das crianças. E aumentam a probabilidade de estas no futuro exibirem comportamentos de delinquência e problemas de saúde mental, como transtornos de ansiedade e depressão.
Para além dos efeitos anteriormente mencionados, existe um outro leque de efeitos negativos indetetáveis a olho nu, mas com repercussões no futuro da criança. Os efeitos ao nível cerebral.
Já sabíamos de estudos anteriores que crianças que são educadas com palmadas têm demonstrado ter menos massa cinzenta no seu córtex frontal e amígdalas mais hipervigilantes. Também sabemos que pode ter um potencial impacto no desenvolvimento do cérebro, alterando a sua anatomia com consequências a longo prazo.
Uma pesquisa publicada este ano, em abril, mostra que as crianças educadas com palmadas têm uma percepção aumentada das ameaças, sugerindo que as palmadas podem alterar a função cerebral de maneira semelhante à que é observada em crianças que sofrem formas graves de maus-tratos.
O pânico que a criança sente quando o seu pai/mãe ou outro cuidador em quem ela confia para a sua sobrevivência se transforma num verdadeiro “rottweiler” e lhe bate provoca no seu cérebro uma resposta semelhante à que temos perante experiências mais ameaçadoras, como o abuso sexual. Isto significa que existem alterações nos seus cérebros em áreas frequentemente envolvidas na regulação emocional e na deteção de perigos, como se o seu cérebro tivesse ficado programada para responder rapidamente a qualquer ameaça no ambiente.
Os cuidadores não usam necessariamente a disciplina violenta com a intenção deliberada de causar danos físicos à criança. Muitas vezes esse recurso surge como descarga de raiva e frustração e falta de conhecimento acerca dos danos a longo prazo e de outros métodos alternativos de disciplinar com base no amor e respeito. E, se calhar, quando era criança apanhou algumas (ou muitas) vezes dos seus pais. E por isso pode pensar para si que esta é uma boa forma de disciplinar o seu filho, uma vez que parece ter resultado consigo. Ou talvez bata porque em muitas situações com o seu filho não consegue atuar senão dando uma “sapatada”…
Mesmo que a sua experiência tenha sido esta e ache que se saiu bem, acredite que não foi por causa das palmadas e acredite também que estaria melhor emocionalmente se não tivesse apanhado.
A disciplina física violenta em casa é a forma mais comum de violência experienciada pelas crianças um pouco por todo o mundo, mas as crianças merecem viver num mundo melhor. Esse mundo melhor começa em casa, na relação de conexão com os nossos filhos.
Junte-se a mim nesta mudança!
Nota: Com este texto não pretendo culpar ninguém, mas sim facultar informação baseada em pesquisas científicas sobre o impacto das “palmadas educativas” e, com isso, inspirar os pais/educadores a desistir deste método de disciplina.
Clementina Almeida
Fonte: Público
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