É especialista em quase tudo o que importa em Educação, como o currículo e a avaliação. Sobre o resto, como a aprendizagem ou a formação de professores, poderá não ser especialista, mas é uma voz sempre ouvida quando fala no seu país de origem, o Reino Unido. Tim Oates é professor em Cambridge, num departamento onde não se ensina: o Cambridge Assessment é a maior agência dedicada à pesquisa sobre avaliação na Europa. É ali que o britânico se encontra desde 2006 e é por isso mesmo que não há estudo internacional, como o PISA (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), o TIMMS (que avalia o desempenho a matemática e ciências) ou o PIRLS (que avalia a literacia) que não lhe tenha passado pelas mãos — ou porque para eles contribuiu, ou porque os estudou a fundo.
Pela mão de Michael Gove, ministro da Educação entre 2010 e 2014, quando o Partido Conservador de David Cameron se encontrava no poder, foi-lhe pedido que revisse o currículo nacional britânico. Assim o fez e a equipa liderada por Oates foi responsável pelas alterações de fundo feitas em 2011 ao currículo e à própria estrutura dos ciclos de ensino.
Por ter esse conhecimento de fundo dos estudos internacionais, é crítico daquilo a que chama o conto de fadas finlandês. O problema, conta, é que, quando a Finlândia chegou ao topo do PISA, em 2000, todo o mundo olhou para o país, mas para a linha temporal errada. Foi o trabalho desenvolvido nos anos 1960, 70 e 80 que conseguiu tornar os estudantes nórdicos nos melhores da Europa. Mas é para 2000, quando o sistema educativo já estava em declínio, e para os erros da Finlândia que todos têm andado a olhar. “Absolutamente errado”, diz, com um irrepreensível sotaque britânico.
Tim Oates passou por Lisboa no final de janeiro para participar numa conferência no Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade (ISEG) com economistas da educação e, no seguimento desse debate, deu uma entrevista telefónica ao Observador.
Sobre Portugal também tem algumas ideias: aplaude a iniciativa de tentar que exista uma escola sem retenção (o projeto piloto de inovação pedagógico), acredita que a flexibilidade curricular tem riscos e defende que devemos aprender com os sistemas educativos que têm alto desempenho: coerência curricular, bons professores e bons materiais educativos nas salas de aula, certificados pelos governos.
Há vários anos que analisa os resultados do PISA e de outros relatórios internacionais. Chegou a alguma conclusão que o tenha surpreendido de forma particular?
Há algumas coisas que, embora não nos tenham surpreendido a nós, investigadores, de certeza que surpreenderam outras pessoas. Uma das mais importantes foi sobre a Finlândia. Toda a gente se interessou sobre o caso da Finlândia quando o país chegou ao topo do PISA, em 2000. E, na altura, nós ficámos preocupados com isso. E sabe porquê? Porque conhecíamos a história da Finlândia, sabíamos o que tinha sido feito para chegar àquele ponto do sistema educativo. Mas a verdade é que, de 2000 para cá, os resultados finlandeses nas diferentes provas internacionais têm estado a cair e de forma significativa.
A Finlândia tem hoje um problema de género, há uma diferença grande entre rapazes e raparigas, e a nova abordagem educativa — que toda a gente diz ser tão boa — está a levar ao aumento da diferença entre crianças de níveis socioeconómicos diferentes, segundo investigadores da Universidade de Helsínquia. Portanto, hoje, a Finlândia tem um problema de género e um problema social.
E esse problema começou em 2000?
Não. Em 2000, as crianças que conseguiram os bons resultados no PISA tinham 15 anos. Ou seja, é preciso olhar para trás. E mesmo nessa altura, apesar dos bons resultados, já o sistema tinha problemas. Se olharmos para a trajetória de melhoria entre os estudantes finlandeses, ela acontece entre 1960 e 1990.
Então o que está a dizer é que, no caso da Finlândia, temos estado a olhar para a linha temporal errada quando procuramos soluções mágicas?
Absolutamente. É completamente errado olhar para o sistema educativo dos anos 2000. Quando olhamos para o que a Finlândia fez na década de 1960, 70 e 80, percebemos que era completamente diferente do que estava a fazer em 2000. O que se estava a passar com o sistema educativo nesse início de milénio, e até já no final dos anos 1990, está diretamente ligado ao declínio finlandês a que estamos agora a começar a assistir. Mas é para o ano 2000 que toda a gente olha quando vai à procura da história de fadas finlandesa. É um erro absolutamente terrível.
Isso quer dizer que, na sua opinião, temos todos andado a olhar para o pior e não para o melhor do sistema educativo finlandês?
Sim, claro. Isto não é apenas o meu ponto de vista. É também o ponto de vista de um investigador chamado Gabriel Heller Sahlgren, que escreveu um livro ótimo intitulado “Real finnish lessons” (tradução livre: “As verdadeiras lições finlandesas”). E é também o ponto de vista de muitos historiadores de educação dentro da própria Finlândia. Não sou só eu que o digo.
Se nos focarmos na linha temporal certa, como defende, qual é, então, a grande diferença entre o que se passava na Finlândia na década de 1970 e nos anos 2000?
Sabemos algumas coisas pelo trabalho de Bill Schmidt e é aqui que os grandes inquéritos internacionais como o TIMMS, o PIRLS e o PISA, em que ele trabalhou, são valiosos. E Bill Schmidt diz-nos que a coerência de currículo é extremamente importante [William Schmidt é um estatístico e professor norte-americano na Universidade de Michigan que investiga os currículos das escolas e as desigualdades sociais entre alunos]. O material que se usa na sala de aula, como os manuais escolares, a avaliação, o currículo, a experiência e os métodos usados pelo professor, tem de ser todo coerente. Tudo tem de se alinhar. Não se deve puxar professores em direções diferentes. E hoje sabemos que esta é uma característica dos sistemas educativos com alto desempenho. Quando o Bill deu uma palestra aqui em Cambridge, enfatizou três coisas como sendo as que verdadeiramente influenciam os sistemas de alto desempenho: o rigor — ser claro sobre aquilo que queremos que os alunos aprendam —, o foco e a coerência. É isto que todos os sistemas com boas performances têm em comum. Rigor significa que há bons padrões de ensino e que as crianças são avaliadas para termos a certeza de que os alcançaram.
No seu artigo de 2002, um dos melhores trabalhos que já foi feito sobre o que os bons sistemas possuem, ele aponta para o currículo coerente. E era isso que o sistema finlandês possuía nos anos 1980 e 90: tinha excelentes manuais escolares, tinha professores bem treinados e um currículo coerente.
O que é que se passa agora na Finlândia para o sistema educativo estar a falhar?
Na altura, as escolas não eram muito autónomas, havia um currículo nacional e o Estado garantia que os manuais escolares eram consistentes. Tanto eu como o Bill acreditamos que isso foi muito importante durante esses anos. Se falar com qualquer educador finlandês, vai ouvir a mesma resposta: as forças do sistema finlandês são a formação dos professores e recursos escolares de alta qualidade. Entretanto, as escolas finlandesas tornaram-se mais autónomas, embora não tanto quanto as pessoas pensam, até porque continua a haver muita avaliação interna, e houve algumas mudanças na sociedade. Alguns dos problemas que aconteceram na Finlândia não foram percebidos por quem estava a olhar de fora: a partir de 2000, fecharam algumas pequenas escolas rurais e houve muita competição entre escolas. Isto gerou tensão nas zonas urbanas e uma grande variação de qualidade entre escolas e dentro delas, o que levou a estes problemas estruturais.
E acha que hoje temos um sistema educativo em declínio na Finlândia?
Sim. Não estou a atacar o sistema finlandês, estou só a tentar que a imagem seja muito clara.
Quando fala do conto de fadas finlandês, diz que temos muitas ideias erradas sobre o que lá se passa. Quais são as principais?
A primeira ideia errada que temos é a de que o que se está a fazer agora é certo. Não fazemos ideia se o que a Finlândia está a fazer agora é correto. Não sabemos se vai travar o declínio. O que sabemos é que o sistema educativo está, de facto, em declínio e é preciso fazer alguma coisa. Francamente, eu faria o que eles fizeram no passado e não o que estão a fazer agora. Sabemos que o que a Finlândia fez no passado funcionou. E o que fizeram no passado é o que Xangai e Singapura fazem agora. E esses países continuam a melhorar.
Quando falamos de desempenho a Matemática, os países asiáticos aparecem sempre em lugares cimeiros. No entanto, nunca levantaram o mesmo zumbido que a Finlândia. A que se deve esta diferença? Questões culturais?
Se alguém aparece no topo do PISA, como aconteceu com a Finlândia em 2000, toda a gente vai olhar para esse país. Em Inglaterra, olhamos para Singapura e para Xangai. Temos usado os resultados do PISA para identificar a natureza do alto desempenho em Xangai e imediatamente demos início a um processo de troca de professores. Os de Xangai vêm a Inglaterra e aprendemos com eles. Os nossos vão até lá e nós aprendemos com isso. Também passámos em revista os manuais escolares de Xangai e de Singapura e introduzimos novos manuais em Inglaterra.
E essa aprendizagem com os sistemas de Xangai e de Singapura está a funcionar?
Sim. Houve uma avaliação recente e ela é muito clara: mostra que a intervenção não está a funcionar em todas as escolas, mas não funciona nas escolas que não estão a fazê-lo como deviam. Nas escolas que estão a implementar as novas abordagens com fidelidade, os padrões estão a elevar-se e de forma significativa.
Então o que podemos aprender com os métodos asiáticos?
Podemos aprender muito, apesar de haver variações culturais entre Portugal e Xangai ou entre Inglaterra e Hong Kong. Claro que há diferenças culturais. A atitude dos pais é diferente, a história de como as crianças se comportam na escola é diferente. Mas quando se olha para a pedagogia, para a forma como as perguntas são feitas na sala de aula, a forma como é despendido muito mais tempo em determinadas ideias para ter certeza que todas as crianças as percebem, a forma com as tarefas são cuidadosamente estruturadas e muito focadas na ideia matemática concreta, a maneira como as tarefas vão variando e como os livros de fichas são usados para encorajar as crianças a pensar a matemática fora da sala de aulas… Tudo isso pode ser usado em Portugal ou em Inglaterra. E sabemos que esse tipo de abordagem ajuda todas as crianças a melhorarem as suas capacidades matemáticas.
Acha que as escolas estão a falhar ao não garantirem que todas as crianças aprendem?
O que sabemos sobre Xangai é que o sistema é muito dirigido aos professores, mas é da melhor forma que pode ser: é muito interativo, os professores fazem muitas perguntas a todas as crianças em todas as aulas. Se uma criança em particular, num grupo de 30, não tiver percebido o que devia naquela lição, o professor vai saber disso e vai dar apoio imediato àquela criança. Existirá uma intervenção direta e vão ser criadas atividades adicionais para que ela nunca fique para trás. Devíamos estar a fazer isso em todos os países e em todas as lições, todas as aulas, seja na matemática ou na língua materna. É uma questão de treino de professores. A avaliação bem pensada também tem de fazer parte do processo de aprendizagem.
Está na altura de mudarmos a forma como avaliamos os alunos? Estamos apenas a focar-nos nas notas?
Devíamos usar muito mais avaliação no dia a dia, não para dar notas aos alunos, mas para perceber se eles perceberam as ideias e dominaram o conhecimento.
Está a falar de avaliação diária na sala de aula?
Sim. Boas perguntas que estimulem o conhecimento, que estimulem a aprendizagem, que estimulem o raciocínio e que permitam perceber se uma criança entendeu aquela matéria.
O que é uma boa pergunta?
Se pegarmos em algo como ciência: eu tenho um copo de água, há um cubo de gelo na água, irá o nível da água levantar se o cubo derreter completamente? Esta é uma ótima pergunta. Em matemática, deve variar-se os problemas. Se o objetivo é perceber se o aluno sabe dividir algo em metade e depois num quarto, é preciso apresentar-lhe essa ideia numa variedade de formas. Faz-se a pergunta sobre diferentes formas geométricas, sobre diferentes objetos, faz-se com volume, com área, com números… Só assim se desenvolve um verdadeiro entendimento matemático. Isso é o que as perguntas devem ser.
Com boas perguntas, as crianças estão ao mesmo tempo a aprender a raciocinar e não apenas a memorizar?
Sim. Mas repare: nós também queremos que elas memorizem e que se lembrem das coisas. Na Estónia, onde se diz que existe um currículo baseado em competências, é esperado que as crianças memorizem as tabelas da multiplicação, tal como em Xangai, e elas memorizam-nas antes ainda de as entenderem. Porque é necessário tê-las memorizadas para fazer trabalho que ajuda a perceber a multiplicação.
O anterior diretor do IAVE, a instituição que cria e avalia os exames e provas nacionais, defendeu, numa entrevista (...), que dois alunos com a mesma avaliação numérica não aprenderam exatamente a mesma coisa. Concorda?
Sim, claro. Sempre que se resume o conhecimento de uma criança numa nota, seja em que sistema de educação for, estamos a perder informação. E essa afirmação está certa. Pessoas que têm exatamente a mesma nota, na maioria dos sistemas de avaliação, podem chegar a essa nota fazendo coisas completamente diferentes. De qualquer forma, não é desse tipo de avaliação que estou a falar. Estou a falar do tipo de avaliação usada para garantir que todas as crianças percebem todas as ideias chave. Só assim iremos conseguir melhores resultados e maior equidade.
Em Portugal está a decorrer um projeto piloto onde algumas escolas estão a tentar que não haja retenção dos alunos. A alternativa a chumbar é aprender. O que acha deste tipo de experiência?
Em Xangai, as crianças não são colocadas em grupos diferentes consoante as suas aprendizagens e origem. E atingem resultados maravilhosos quando se tenta garantir que todas as crianças aprendem, seja qual for a sua origem social. Este tipo de experiência em Portugal deveria ser apoiada, parece-me bastante positiva. Mas tem de se ter certeza de que estamos a falar de alta conquista e alta equidade na educação e conhecimento, e não um a sacrificar-se em prol do outro.
Outra das novidades em Portugal foi a flexibilidade curricular, que, depois do projeto piloto, foi generalizada a todas as escolas do país no atual ano letivo. As escolas ganham alguma autonomia na forma como gerem o currículo e os métodos de ensino. Na sua opinião, esta opção tem riscos?
Essa foi uma recomendação feita há uns anos, de que as escolas deveriam ter uma liberdade de 25% nos currículos. Apesar disso, acho que há alguns riscos. E um dos riscos é a interpretação que fazemos dela, porque precisamos de ter um currículo principal, o de core, onde está a matemática, as ciências, a literacia, e temos de nos assegurar que o resto do currículo, em áreas como história, geografia, é dado a todas as crianças. Se introduzirmos alguma liberdade nas escolas, temos de garantir que esse quota do conhecimento principal não se perde. Todas as crianças devem ter acesso a ele. Mas, voltando atrás… Posso falar um bocadinho sobre retenção?
Claro que sim.
A investigação sobre retenção é muito variada e eu sei que, obviamente, em Portugal, há níveis de retenção muito elevados, sei que subiu quando o governo anterior introduziu os testes formais, e depois, imediatamente a seguir, caiu. Isso foi uma coisa boa. O que fez é que obrigou o sistema inteiro a ajustar-se a padrões mais altos e mostra que o sistema português é capaz de se ajustar a padrões elevados para todas as crianças. Mas um dos aspetos-chave é que Portugal tem de olhar para as suas estatísticas sobre retenção, para examinar quem está a ficar retido e porquê.
Não há grandes dúvidas. O padrão é sempre o mesmo e atinge essencialmente as crianças de classes sociais mais baixas.
Exato. Para além disso, aquelas que começaram a escola obrigatória muito cedo também são mais vulneráveis à retenção. Por isso, penso que em Portugal precisam de examinar o padrão da retenção e estudar que estratégias e intervenções podem ser usadas para travá-la. Acho que isso poderia melhorar a qualidade de educação para todas as crianças.
Tem alguns conselhos para o Governo português nesta matéria?
Não, até haver investigação feita sobre o tipo de criança que está a ficar retida. O que aconteceu com o último governo mostra-nos que podem realmente elevar os padrões para todas as crianças.
Também tivemos uma boa evolução no PISA. A que se deveu, na sua opinião?
Acho que a introdução das provas nacionais levantou as expectativas dos professores e esses testes mais formais permitiram aos professores saber que crianças percebiam e não percebiam a matéria. Isso foi importante. A introdução de bons manuais escolares também foi importante e sei que foi dada alguma atenção à qualidade do material pelo anterior governo. Há evidências internacionais que mostram que isso foi muito importante.
Os manuais escolares são fundamentais para termos bons resultados?
Sim. A qualidade dos professores, a qualidade dos materiais, a coerência entre o currículo e os materiais usados na sala de aula e a prática educativa. Portugal deu passos muito bons.
Ainda há coisas que Portugal esteja a fazer mal ou em que possa melhorar na Educação?
Enfatizava estas coisas: relaxar o currículo nacional e relaxar a avaliação nunca são boas ideias.
No Reino Unido, depois das mudanças operadas no currículo nacional, os críticos diziam que ele se tinha tornado muito limitado. Aqui, os professores queixam-se de que o currículo é um monstro. Não há um equilíbrio entre os dois?
Sim, existe um lugar a meio caminho. A sobrecarga do currículo deve ser evitada porque isso significa que as escolas, e os professores individualmente, têm de fazer as suas próprias escolhas sobre o que é importante. Nós já sabemos que isso abre diferenças entre escolas e dentro das próprias escolas. A sobrecarga de currículo é um problema real e deve ser evitada. Em segundo lugar, há críticos em Inglaterra que dizem que limitamos demais o currículo. Mas precisávamos de fazê-lo. O que estava a acontecer era termos crianças a passar para o equivalente ao vosso 2.º ciclo sem serem capazes de ler. Quando nos focámos na importância de ler, a nossa posição internacional melhorou de forma dramática. Num período de tempo muito curto, passámos de 12.º para 8.º no PIRLS. Foi muito bom. O que eu digo é: não há nada tão limitado como não ser capaz de ler. Podemos ler sobre o céu, a ciência ou sobre os nossos amigos. Se não souberes ler… isso é limitador. Foi correto limitarmos o currículo para ter certeza de que todas as crianças sabiam ler.
Acha então que é melhor escolher um currículo com menos matéria, mas maior profundidade?
Absolutamente. E é isso que encontramos em Xangai e Singapura: menos matéria, mas mais aprofundada, as crianças a precisarem de mais tempo para aprender, os professores a saberem qual é o foco do currículo e a garantirem que todas as crianças sabem tudo.
Na sua opinião, qual é o currículo essencial que nenhuma criança deve falhar?
Nos primeiros anos, é essencial saber ler e escrever, porque não é uma coisa natural. É importante ter discussões ricas em todas as matérias para desenvolver a oralidade e a habilidade para trabalhar com outras crianças. É essencial saber conceitos científicos fundamentais, que são importantes para perceber outros conceitos de história ou de geografia, por exemplo. Literacia, matemática, ciência e, claro, cultura. Literatura, história e geografia, educação física. As crianças têm de ser ativas pela sua saúde, a atual e a futura. Devem saber organizar-se e trabalhar de forma colaborativa com os outros. Sabemos que as boas escolas têm isso presente em tudo o que as crianças fazem.
Ter esse currículo bem fundamentado desde cedo faz diferença no percurso académico futuro dos jovens?
As pessoas, hoje em dia, fazem muito esta distinção entre conhecimento e competências. É uma falsa distinção. E porque algumas pessoas enfatizaram a parte das competências, negligenciaram o conhecimento. O que sabemos define-nos. Sabemos isso quando as pessoas começam a perder a memória — nesse momento, deixam de ser eles próprios. Tu és o que tu sabes. E o conhecimento é fundamental para o desempenho. Toda esta discussão entre uma coisa e outra é absurda.
Ou seja, sem conhecimento não conseguimos adquirir as competências?
Precisamente. O conhecimento é essencial. E se nos lembramos das coisas, se temos a matéria na nossa memória de longa duração, então conseguimos desempenhar tarefas complexas.
Olhando para o outro verso da moeda: há lições a aprender com os países que se saem mal nos estudos internacionais?
Há muitas variações nos motivos que levam diferentes sistemas a passarem por problemas, mas todos tendem a ter algumas coisas em comum: pouca coerência, falta de currículo nacional, incoerência entre o currículo e os materiais escolares, professores mal formados e com pouca qualidade e salas de aulas com muitos, muitos alunos. Quando o número de alunos por sala se eleva, torna-se problemático. Há muitos estudos que nos mostram que nos países em desenvolvimento, que agora conseguem que as crianças vão à escola — e, há 10 anos, nem isso conseguiam —, o que acontece na sala de aulas simplesmente não tem qualidade. E é por isso que as crianças não estão a fazer progressos nos anos iniciais.
Fonte: Observador
Sem comentários:
Enviar um comentário