A maioria dos genes que provoca o glaucoma permanece ainda por identificar. Contudo, um trabalho publicado na revista "European Journal of Human Genetics", que conta com a colaboração de dois investigadores portugueses (Paulo Ferreira e André Reis), deu um passo em frente nesse sentido, identificando a correlação entre várias formas desta doença e os genes que as causam.
Trata-se de um estudo cuja importância acresce pela abertura de novas possibilidades de métodos diagnósticos do glaucoma, uma vez que é uma"doença silenciosa e sem cura efectiva, que leva à cegueira", para além de ser"uma das doenças visuais mais prevalentes", frisou Paulo Ferreira, do Departamento de Oftalmologia, Genética Molecular e Microbiologia da Universidade de Duke, nos EUA.
Este trabalho evidenciou a associação de várias mutações no gene RPGRIP1 (retinitis pigmentosa GTPase regulator interacting protein-) e várias formas desta doença visual, nomeadamente o glaucoma com pressão intra-ocular normal, o glaucoma com pressão intra-ocular alta e uma outra variante que ocorre somente em pessoas mais jovens, tipicamente com menos de 40 anos.
Em declarações ao "Ciência Hoje", o investigador português sublinhou que a identificação deste gene "abre portas extremamente importantes para se estudar o desenvolvimento da doença a um nível muito mais profundo (molecular e em termos de patologia) e desenvolver formas terapêuticas específicas para curar ou retardar o glaucoma", algo que é "muito difícil, senão mesmo impossível", sem se conhecer as causas primárias de quaisquer doenças.
A equipa que Paulo Ferreira dirige nos EUA, por vezes em colaboração com outros laboratórios, descobriu o gene em questão há uma década. Estudou a implicação de outras mutações no RPGRIP1 em algumas formas de cegueira e da sua função em neurónios da retina e em patologias que afectam órgãos como os nefrões dos rins e que levam a falhas renais.
"No conjunto, estes estudos estão a permitir perceber a ligação entre as causas e susceptibilidade de diferentes células e órgãos a vários genes e doenças e desenvolver formas de diagnóstico e tratamento num futuro breve, esperemos", avançou o especialista.
Para além deste trabalho, o cientista português lidera um grupo que persegue outras linhas de investigação como a identificação de distúrbios metabólicos importantes para o desenvolvimento de algumas doenças humanas, de formas de protecção que previnem a morte celular e a implicação das descobertas provenientes destes estudos em doenças de outros foros clínicos.
Cem mil portugueses com glaucoma
A Sociedade Portuguesa de Oftalmologia estima que em Portugal cem mil pessoas sofram de glaucoma, um valor que nos EUA ascende aos quatro milhões. De acordo com Paulo Ferreira, é uma doença "geneticamente heterogénea", pois tem várias causas genéticas, mas que tem o"denominador comum de levar à degeneração de uma classe de neurónios da retina, cuja função é transmitir todo o tipo de informação visual para o cérebro". Quando estes neurónios morrem, a cegueira acontece.
O investigador sublinhou também que há outras causas de cegueira que não têm nada a ver com a morte destes neurónios, mas com a degeneração das células foto-receptoras da retina, sendo que, neste caso, a doença tem outros tipos de classificações clínicas.
In: Ciência Hoje
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