Evoco a frase de T. Popkiewitz, quando afirma que “Ser pragmático é encontrar respostas complexas para problemas complexos” (Cosmopolitanism and the age of school reform, 2009).
O quotidiano do professor de Educação Especial é procurar e encontrar respostas para problemas complexos. Na verdade, se os problemas fossem simples não chegariam até nós, não precisariam de uma atenção redobrada, especializada e recorrendo a outro tipo de competências e de conhecimentos. A prática ensinou-nos que não existem soluções simples para problemas complexos; existem, quando muito, patamares de soluções que vão vigorando até se encontrarem outras mais adequadas à natural evolução dos processos e dos casos.
Vem esta questão da complexidade a propósito de pedidos de informação que vários colegas, professores de Educação Especial, têm vindo a fazer chegar a nossa Associação. O assunto é se será correcto que os alunos que são abrangidos pelos serviços da Educação Especial sejam identificados como tal nas pautas ou mesmo até nas provas escritas que fazem. Este assunto é complexo e certamente não pode ser resolvido com uma única forma de actuação mas juntaria três reflexões:
1. O nosso sistema educativo faz uma opção inequívoca pela inclusão. Desenvolver políticas inclusivas significa que ninguém pode ser discriminado pelas suas condições (género, etnia, deficiência, …). Não ser discriminado pressupõe também um direito à (possível) privacidade. É provável, que no contexto de uma escola, não seja possível fazer passar desapercebidos os serviços que se proporcionam a alunos com dificuldades. Mas outra coisa é que se apregoe “urbi et orbi” as suas dificuldades.
2. Assinalar publicamente as dificuldades do aluno parece (repito parece) indicar alguma insegurança por parte da escola. Vejamos: para que serve assinalar que o aluno é “avaliado ao abrigo do Dec-Lei 3/2008”? Não serve para o aluno, não serve para a sua família (que já sabe), não serve para os colegas (que desconfiam) … Serve então para quem? Talvez para os outros pais porque a escola tem receio que os outros pais notem que a avaliação é “injusta” se não for assinalada. A questão é: será possível encontrar outra solução para este problema complexo? (ex: explicar numa reunião de pais, explicar-lhes/comprometê-los numa dinâmica de inclusão, etc.)
3. Precisamos de avaliações que relacionem o que investiu com o que se conseguiu, o que se semeou e o que se colheu. E isso é válido para todos os alunos. Estabelecer que a avaliação só diferente “para aquele aluno” é talvez uma forma arcaica de separar os alunos em “normais” e “diferentes”. E feita esta separação está-se certamente a ir ao contrário daquilo que nos aproxima da inclusão. O que nos aproxima da inclusão é sabermos que todos os alunos são diferentes e merecem a justiça de serem considerados como tal.
E retomo: “Ser pragmático é encontrar respostas complexas para problemas complexos”. Não é certamente assinalando que “o aluno é avaliado ao abrigo do Dec-Lei 3/2008 que se resolve a questão. Mas o problema fica aberto à discussão.
David Rodrigues
Presidente da Pró-Inclusão – Associação Nacional de Docentes de Educação Especial
Editorial da 2º Newsletter de Fevereiro
9 comentários:
Então que acções podem a escola desenvolver para assinalar estes alunos nas pautas? Deverá ser incluído no programa dos alunos para posteriormente sair nas pautas? Ou então como?
Nas pautas da turma não deverá constar nenhuma referência ao tipo de avaliação diferenciada destes alunos, entanto no boletim individual que é entregue aos pais, nas observações já deverá constar que o aluno foi avaliado de acordo com o disposto no artigo 20º do decreto-lei nº3/2008,assim como especificar quais as outras adequações no processo de ensino e de aprendizagem que este beneficia. Foi essa a minha interpretação e a dos restantes colegas do meu agrupamento e é assim que nós fazemos deste o ano passado.
Tenho uma amiga professora de ensino especial que me disse que no agrupamento onde ela trabalha consta nas pautas e referente a estes alunos uma área que diz" Autonomia e desenvolvimento pessoal e social" e a avaliação é aqui colocada mas em termos qualitativos. Poderá ser assim?
Confesso com alguma tristeza que ainda se tenha estas questões, ainda...O assunto se os alunos que são abrangidos pelo Decreto 3/2008 sejam identificados como tal nas pautas.Está em algum lado regulamentado? Inclusão é escolher as diferentes respostas para todos.Não será claro?
Nas pautas são afixadas as disciplinas e áreas que frequentam. Só isto. Penso até que são respostas simples. Muitas vezes somos nós que complicamos...Para quem tem ainda dúvidas consultar despacho normativo 6/2010 sobre avaliação, ponto 77.
Um abraço e bom trabalho a todos
A área "Autonomia e Desenvolvimento Pessoal e Social" e/ou outras são áreas específicas dos alunos com "Currículo Específico Individual" e que são acrescentadas nas pautas das turmas que estes alunos frequentam (estas disciplinas tem avaliação qualitativa - as restantes disciplinas comuns à turma tem avaliação igual aos outros alunos ).
Outros alunos com NEE, com adequações no processo de avaliação, mas sem CEI, frequentam as mesmas disciplinas dos restantes colegas e o sistema de avaliação qualitativa ou quantitativa é o mesmo.
Efetivamente, tal como referiu a colega EC está tudo bem claro e estipulado no despacho normativo6/2010, e é assim que fazemos no meu agrupamento.
Obrigado a todos pelas respostas
É uma anedota...é o País a trabalhar a vários ritmos...quando se trata de aplicação de leis ambiguas e cada Agrupamento a aplica como bem entende. Da minha experiência tenho conhecido um pouco de tudo, desde na pauta aparecerem notas qualitativas a Educação Especial, PIT, LP e MAT(dados pela educação especial), autonomia Pessoal e social, etc...enfim vale tudo. Depois também há Directores que não querem essa avaliação na pauta e fica apenas no programa aluno. Aliás esta solução não me parece mal...
Existem duas situações distintas: uma para os alunos NEE sem a medida de CEI e outra com CEI.
Para os alunos sem CEI, atendendo que frequentam as mesmas áreas dos restantes alunos da turma, não vejo grande pertinência em surgir na pauta a referência ao DL 3/2008. No entanto, penso que os restantes alunos da turma devem ter noção das diferenças, pois, como já constatei, há alunos e pais que reclamam porque determinados alunos têm testes diferentes, outras condições...
Para os alunos com CEI, na pauta tem de surgir as áreas curriculares não disciplinares que não fazem parte do currículo normal! Estas devem ter uma avaliação qualitativa! Como já referi em textos anteriores, no agrupamento a que pertenço, optou-se por criar três áreas: linguagem e comunicação; matemática para a vida; desenvolvimento pessoal e social. Estas áreas surgem na pauta apenas para os alunos com CEI.
De facto, concordo com "anónimo" na medida em que as práticas são muito divergentes entre os diversos agrupamentos/escolas.
Não posso deixar de comentar mais uma vez. É bem triste q se considere anedota as situações de ritmos e adopções diversas num único país como refere o comentador anónimo. Calculo q nenhuma legislação poderá elencar todas as hipóteses e não é ambígua no esclarecimento destas situações de q temos estado a falar. Como qualquer lei pode ter falhas mas penso q se trata de mais do q isso. Inclusão passa pelas medidas educativas diferentes para cada aluno. Muitas vezes é a falta do nosso compromisso que contribue para estas situações. Não me choca o leque de ofertas e áreas curriculares escolhidas de acordo com as diferentes respostas dos diferentes agrupamentos. Choca-me sim que não se utilize o bom senso face à diversidade e o respeito q o assunto merece.
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