Na entrega dos resultados de uma avaliação, da qual resulte o diagnóstico de uma perturbação do desenvolvimento, surgem quase invariavelmente as perguntas da parte dos pais: “E agora, o que devemos fazer, devemos informar a escola? Devemos explicar ao nosso filho? Deve ficar integrado na legislação da educação especial? Que consequências virão daí?”.
As respostas obviamente devem ser de acordo com a situação particular de cada família, e apesar dos dilemas que existem em torno ao diagnóstico, acredito que os pais e o próprio individuo têm o direito de saber o diagnóstico, pois é a forma de poderem finalmente ter a resposta aos seus porquês e comos, “porque reage ela assim?”, “porque não aprende como os outros?”, “como posso ajudar?”, “como vai ser o seu futuro?”. Acredito que a escola também precisa dessa informação para poder compreender o aluno, activar as medidas necessárias e munir-se dos recursos adequados para levar este aluno a alcançar o seu potencial máximo.
Só faz sentido uma avaliação e um diagnóstico se tivermos em vista a resposta às necessidades da criança. O objetivo de uma avaliação, de um diagnóstico, não é simplesmente dar um nome clínico às características da criança. A avaliação deve ser vista apenas como um ponto de partida, como uma ferramenta que visa ajudar na tomada de decisões, nomeadamente para determinar a elegibilidade para a educação especial e respetivos serviços e para fornecer linhas orientadoras para intervenção. A avaliação deve estar integrada num processo, que daí se inicia, tem uma continuidade e aí há de retornar, pois deve-se continuar a avaliar, para monitorizar os progressos e esclarecer diagnósticos que nem sempre são claros.
É natural que os pais tenham receio que o diagnóstico venha a marcar o seu filho negativamente, que leve à estigmatização, desvalorização, que seja reduzido apenas a um rótulo, a uns códigos e que deixe de ser visto como o João, aquela criança divertida, cheia de vida e de graça. Passa a ser o caso com dislexia e eles passam a ser os pais do aluno complicado e o docente passa a ser o professor daquele aluno com necessidades educativas especiais. Outro receio é que o João deixe de ter desafios na sua aprendizagem, que haja um desinvestimento nas suas capacidades e apenas sejam vistas as suas incapacidades.
Mas, por outro lado, é natural que se um aluno não estiver devidamente identificado e tiver algum tipo de dificuldade, especialmente no caso das dificuldades mais “invisíveis”, como as de aprendizagem, perturbações da linguagem ou perturbações comportamentais, comecem a ser-lhe atribuídos alguns tipos de rótulo, pelo próprio individuo e por quem o rodeia, como “o preguiçoso”, “o mal-educado”, “o desleixado”, “o burro”, “o que tem mau feitio”, “o que vive no mundo da lua”, o que obviamente vai ter um impacto na sua confiança e na sua autoimagem. Estes são os rótulos negativos, os que não vão ajudar a compreender, a aceitar, a apoiar, a incluir…
Estes receios dos pais podem ter algum fundamento se pensarmos “Será que a escola, a sociedade está realmente sensibilizada e disponível para aceitar, compreender e receber a diversidade?”
Provavelmente ainda não… mas penso que por falta de informação. Acredito que se houvesse mais informação disponível para toda a comunidade, diminuiriam os impactos negativos de um diagnóstico, aumentaria a verdadeira inclusão.
Fiquei agradavelmente surpreendida com os testemunhos de utentes do CADIn sobre o diagnóstico, pois vão ao encontro desta perspetiva: os pais valorizaram de forma positiva tomarem conhecimento do diagnóstico e darem a conhecer o diagnóstico aos filhos e à escola. As respostas foram unânimes quanto à razão para ainda existirem algumas situações de não inclusão das pessoas com necessidades educativas especiais – a falta de informação.
Na minha opinião deve-se portanto dar a conhecer à família, ao individuo e à comunidade escolar o diagnóstico, mas com um objetivo claro, de levar a uma aceitação do próprio e dos outros, de levar a um ajustamento das expectativas, de serem identificadas as necessidades de forma a serem implementadas as melhores respostas, pois o aluno não tirará proveito nenhum da sua presença na sala de aula se houver uma indiferença em relação às suas caraterísticas e se não forem feitas as adaptações necessárias para que consiga atingir o seu potencial máximo. Para além disto, se os alunos com necessidades educativas especiais não forem referenciados, avaliados e identificados, o Ministério da Educação não toma conhecimento da urgência de recrutar mais recursos materiais e humanos para as escolas, o que leva à escassez de respostas adequadas.
Obviamente nunca se deve esquecer que o diagnóstico não define o individuo enquanto pessoa e é essa pessoa que devemos aceitar, receber, respeitar e incluir. Não devemos esquecer que o João é aquela criança divertida, cheia de vida e de graça, e que também tem dislexia, pelo que devemos compreender quando tem algum receio em ler em voz alta. Devemos ver a família do João, como os pais da criança alegre, que souberam procurar respostas e que querem ajudar o filho a superar as dificuldades. E o professor do João é o professor daquela turma, mas não deve sentir-se sozinho, deve ter toda uma comunidade escolar que também se responsabiliza para responder às necessidades daquele aluno com vontade de aprender.
Leonor Ribeiro
Técnica Superior de Educação Especial e Reabilitação do CADIn
Fonte: Público
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