sábado, 4 de maio de 2024

Cinco práticas do ensino da Matemática validadas pela Ciência: Foco em Problemas de Palavras


Prática #5: Foco em Problemas de Palavras
Que prática é esta?

Os problemas de palavras baseiam-se em textos que os alunos resolvem para testar os seus conhecimentos de matemática. Podem ser particularmente complicados devido às inúmeras capacidades que requerem por parte dos alunos. Por exemplo, o êxito na resolução de problemas de palavras envolve:
  • ler um problema;
  • perceber o vocabulário;
  • perceber o conteúdo;
  • identificar um plano para resolver o problema;
  • identificar a informação relevante e ignorar a informação irrelevante;
  • ter um bom desempenho aritmético; e
  • verificar se a lógica está certa.
Quando os resolvem, os alunos aprendem a pôr em prática os princípios de matemática e tentam resolver problemas cada vez mais complexos. Além disso, de acordo com uma investigação de Kenneth R. Koedinger e Mitchell J. Nathan (2004), através da associação de conceitos matemáticos a um contexto de problemas de palavras, os alunos sentem-se incentivados a usar e adaptar estratégias de forma mais flexível para alcançar uma solução «correta».

Em que consiste a investigação?

Vários professores ensinam problemas de palavras definindo a sua modelação matemática (por exemplo, problemas de adição) e associando palavras-chave (por exemplo, em conjunto significa adição) a operações específicas. Como evidenciam os estudos de Karen S. Karp, Sarah B. Bush e Barbara J. Dougherty (2019), ou de Sarah R. Powell e Lynn S. Fuchs (2018), normalmente, estas estratégias não incentivam um pensamento matemático e originam uma resposta errada. Por exemplo, os alunos normalmente aprendem que a expressão em conjunto significa adicionar. Isto, no entanto, nem sempre é verdade.
  • Temos este exemplo: «A Alice comprou três sacos com mercearias. Cada saco custa 15 €. Quanto dinheiro é que a Alice gastou em conjunto?» 
Neste exemplo, os alunos não devem adicionar 3 e 15, mas sim multiplicar os dois números para obter o produto.

Esta regra não se aplica só à expressão em conjunto, mas também a termos como mais, menos, resto, cada, dobro, partilhar e dividir. De acordo com uma investigação de Sarah R. Powell, Jessica M. Namkung e Xin Lin (2022), na verdade, analisando a frequência com que as palavras-chave associadas a operações ajudam os alunos a resolver um problema de palavras corretamente, verifica-se que esta corresponde a menos de 10% dos problemas de palavras com vários passos.

Para ajudar, existem várias abordagens para a resolução destes problemas que têm uma base de investigação forte: o uso de uma estratégia de ataque e um foco em esquemas de resolução. Independentemente do tipo de problema de palavras, os alunos precisam de uma estratégia de ataque. Esta consiste numa série de passos fáceis de recordar que os alunos usam para definir a sua abordagem de resolução de problemas de palavras. Décadas de investigação educativa comprovaram que o uso de uma estratégia de ataque é eficaz para melhorar o desempenho de resolução de problemas de palavras — destacam-se, por exemplo, os trabalhos coordenados por Shaqwana M. Freeman-Green (2015), Jennifer Krawec (2012) ou Yan Ping Xin e Dake Zhang (2009).

Estas estratégias são essenciais para a resolução das principais componentes e de todos os passos do problema de palavras, e usam normalmente acrónimos para ajudar os alunos a recordar as componentes da resolução. Apesar de os acrónimos poderem ajudar os alunos a recordá-las, os professores precisam de ensinar cada componente do acrónimo e certificar-se de que a estratégia se usa de forma continuada.

Outra abordagem para a resolução destes problemas, que normalmente se usa em conjunto com uma estratégia de ataque, é um foco em esquemas. Um esquema é a estrutura essencial de um problema de palavras e normalmente tem como base o(s) conceito(s) salientados na pergunta. Quando os alunos reconhecem o esquema e têm uma estratégia para a resolução com esse esquema, torna-se mais fácil resolvê-lo. O ensino de esquemas é uma prática recomendada pela investigação para vários alunos.

Como é que isto funciona em sala de aula?

Independentemente da estratégia de ataque usada, esta deve ser claramente modelada e os alunos devem ter várias oportunidades de a praticar para verem como pode ser útil. Isto pode relacionar-se com técnicas de pensamento em voz alta (ver a prática #3), de foco no vocabulário (ver a prática #1) e com o uso de representações (ver a prática #2), para ajudar os alunos a perceberem o significado de diferentes problemas de palavras. O principal objetivo é a estratégia de ataque tornar-se natural para ser usada pelos alunos com fluência.

Em problemas de palavras no ensino básico surge normalmente seis esquemas (ver a figura 1). Nos primeiros anos deste nível de ensino, os alunos resolvem problemas aditivos (ou seja, usam a adição ou a subtração para a resolução). Existem três esquemas aditivos comuns: total, diferença e troco (ver a figura 1).

Figura 1. Esquemas de problemas de palavras

No esquema total, as partes são reunidas num total (por exemplo, P1 + P2 = T, onde P1 é parte 1, P2 é parte 2 e T é o total).
  • Por exemplo: «O Manuel ganhou 45 € no sábado e 72 € no domingo. Quanto dinheiro ganhou o Manuel?»
Neste problema de palavras, os alunos têm acesso a duas partes (45 € e 72 €) e têm de encontrar o total. Estes problemas também se podem apresentar com um total, e aos alunos cabe determinar uma parte:
  • Por exemplo: «O Manuel ganhou 117 € no fim de semana. Se ganhou 45 € no sábado, quanto é que ganhou no domingo?»
Muitos problemas têm mais do que duas partes (por exemplo, três partes e um total, ou quatro partes e um total).

O próximo tipo de esquema denomina-se diferença ou esquema de comparação. Aqui, comparam-se os montantes superior e inferior para obter a diferença (por exemplo, G – L = D, onde G é o montante superior, L é o montante inferior e D é a diferença). No problema da diferença na figura 1, os alunos comparam as 3721 canções da Simone com as 4028 canções da Maria para determinarem a diferença. Também é possível escrever problemas de diferenças nos quais os alunos têm de identificar o montante superior desconhecido ou o montante inferior desconhecido.

Outro esquema de problemas de palavras aditivo comum é o de troco. Neste caso, os alunos trabalham com um montante que aumenta ou diminui (por exemplo, S ± C = E, onde S é o montante inicial, C é o montante de troco e E é o montante final). Tais problemas têm um aumento enquanto outros têm uma diminuição (como o problema de troco na figura 1). É importante notar que muitos deles têm um montante de início com dois trocos, e isto é particularmente verdade nos últimos anos do ensino básico e no ensino secundário.

Quando os alunos transitam para os últimos anos do ensino básico, prevalecem três esquemas de multiplicação. Com estes esquemas, os alunos podem multiplicar ou dividir para resolver os problemas. Existem três esquemas de multiplicação comuns: grupos iguais, comparação e combinações.

Em problemas de grupos iguais, multiplicam-se os grupos pelo número em cada grupo para obter um produto (por exemplo, G × N = P, onde G representa grupos, N é número em cada grupo e P é produto).Por exemplo: «A Rita comprou 6 caixas de lápis de cera com 24 lápis de cera em cada caixa. Quantos lápis de cera tem a Rita?»

Neste exemplo, existem 6 grupos (G) com 24 em cada grupo (N). Como acontece noutros esquemas, o desconhecido podem ser os grupos, o número em cada grupo ou o produto.

No esquema de comparação, multiplica-se um conjunto por um número de vezes para se obter um produto (por exemplo, S × T = P, onde S significa conjunto, T é número de vezes e P é o produto). No problema na figura 1, o conjunto é ½ e o número de vezes é 6. Normalmente, com problemas de comparação, o desconhecido é o produto.

Outro exemplo de multiplicação é o esquema de combinações. Neste caso, os alunos identificam todas as possíveis combinações com dois conjuntos (S1 × S2 = P, onde S1 é o primeiro conjunto, S2 é o segundo e P é o produto). No problema sobre a Carolina (ver figura 1), ela conseguiu criar 15 combinações de roupa diferentes com três pares de calças e cinco camisolas. Segundo duas investigações coordenadas por Asha K. Jitendra (2009 e 2013), à medida que os alunos transitam para os últimos anos do ensino básico ou para os primeiros anos do ensino secundário, começam a tentar resolver problemas de palavras relacionados com razões e proporções, que muitas vezes se consideram esquemas adicionais.

Conclusão

Em todos os esquemas, os professores devem usar um método de ensino explícito e dar tempo para praticar e resolver problemas. Segundo um estudo de Sarah R. Powell e Lynn S. Fuchs (2018), normalmente é uma vantagem criar e pôr em prática um esquema para várias aulas ou semanas antes de introduzir um novo. À medida que os alunos aprendem novos esquemas, devem participar em atividades onde seja posta em prática a distinção entre esquemas (por exemplo: «Este é um problema de diferença, e eu sei disso porque o problema pede uma comparação entre dois montantes»).

Este texto é uma adaptação da quinta prática do artigo «Maths Practices You Can Count On: Five Research-Validated Practices in Mathematics», disponível aqui. Esta adaptação resulta de uma parceria editorial com o Centre for Independent Studies (CIS).

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