Avassalado pelo comportamento do filho, Jorge Silva pensa muito nele em bebé. Tão fácil de levar, então. O oposto do miúdo de 7 anos que é hoje. “Aos 3 anos o Filipe fazia birras colossais, mas diziam-nos que essa fase passaria”, conta o pai.
Aos 4 era sobretudo impaciente. Aos 5 tornou-se exigente, intolerante com as suas falhas e as dos outros. “Nessa altura começou também a chorar descontroladamente se não realizava alguma tarefa ou não conseguia o que queria”, recorda Jorge.
Tudo sinais, segundo a psicóloga clínica Filipa Jardim da Silva, de que a criança ainda não sabe lidar com a frustração: “Mesmo que pareça um contrassenso na nossa atual cultura vitoriosa e competitiva, apenas vivendo os desafios – e correndo o risco de falhá-los – é possível desenvolver-se certas competências de regulação emocional e resolução de problemas”, explica. Se se educa um filho num ambiente demasiado protetor ou artificial, as ligações neuronais que se criam associadas à resiliência nunca são geradas.
“Ninguém gosta de dor, tal como ninguém gosta de fracassar, porém ambos são necessários ao desenvolvimento pessoal”, garante a psicóloga, defendendo a urgência de se começar a encarar os fracassos de forma produtiva, com um mindset flexível e crítica construtiva.
Aprender é como subir uma escadaria, compara: “Não se pode passar do primeiro para o quinto degrau e certas escorregadelas fazem-nos voltar ao anterior.” Cabe aos pais reservarem um momento para explorar com a criança o que aconteceu.
“O Filipe atira coisas ao ar e volta costas, como se desistir lhe fosse mais fácil do que uma derrota, e de cada vez lhe digo que não pode fazer tudo bem à primeira”, admite Jorge Silva, tentando não ficar refém dos seus próprios receios.
“Reforço que errar é só uma primeira tentativa para algo novo.” Que insistindo chegará a uma zona de conforto. “Talvez quando ele crescer seja diferente”, supõe o pai, que entretanto desenvolveu uma firmeza serena a lidar com o filho.
E faz muito bem, elogia a psicóloga Teresa Andrade, docente no Instituto Universitário Egas Moniz. Por ela, há que dar algum controlo às crianças sobre decisões que as afetem, permitindo que insistam, desesperem e persistam até chegarem a uma solução.
“Há que ser firme sem discutir, perceber se o comportamento decorre de cansaço ou algo mais e felicitá-las pelo empenho e a persistência – mais do que pelos resultados”, enumera a especialista em desenvolvimento infantil.
Filipa Jardim da Silva concorda: “Sempre que o seu filho lhe disser que se sente burro porque falhou, ensine-lhe que de cada vez que ele erra o cérebro fortalece-se e cria novas ligações, como num treino”, diz.
Seguindo a máxima do falhe, falhe outra vez, mas falhe melhor, é importante diversificar-se os erros mas continuar a cometê-los “com qualidade”, para que o cérebro continue a fortificar-se. “Lidar com a frustração é bom e um sinónimo de ganho de competências, não de falta ou perda delas.”
Isto porque se os filhos não tiverem a oportunidade de passar pelas suas próprias dores de crescimento também nunca irão descobrir que podem dar a volta por cima, sublinha Kim Metcalfe, autora do livro Let’s Build Extraordinary Youth Together (Vamos Construir Juntos uma Juventude Extraordinária, em tradução livre).
Os pais têm de ser pragmáticos: quem cai levanta-se. “Falhar ajuda a desenvolver autoconfiança, foco, autocontrolo e paciência, habilidades emocionais para a vida”, acrescenta a professora em entrevista ao Huffington Post.
Não muito bem, revela a coach em parentalidade positiva Magda Gomes Dias, que acaba de participar num estudo da Marktest sobre a resiliência em Portugal, divulgado hoje a propósito do Dia Internacional da Família.
As conclusões preocupam-na por lhe parecer que as famílias não estão a preparar as crianças para que se tornem adultos capazes de lidar com a frustração no futuro, pelo contrário. “Acho que estamos a evitar que fracassem por não aceitarmos isso como natural, inevitável e necessário ao sucesso”, lamenta a autora do blogue Mum’s the boss.
Os números do estudo não a deixam mentir: 93,7% dos pais portugueses afirmam ter resiliência e saber o que significa, embora só 66,7% tenham conseguido defini-la como a capacidade de ultrapassar dificuldades e 46,4% pensem que umas pessoas nascem resilientes e outras não.
Mais preocupante ainda: 63,6% dos inquiridos consideram-se muito protetores, o que contraria o desenvolvimento da resiliência nos filhos e deixa os especialistas na dúvida sobre até que ponto compreendem, ou não, o conceito.
“Já nem defendo que os pais devem trabalhar isto nas crianças porque basta acompanhá-las”, sublinha Magda Gomes Dias. Vamos a meio caminho da escola com os miúdos quando percebemos que deixámos a mala do computador em casa? Podemos gritar e culpá-los por nunca se despacharem a horas, ou então atribuir ao sucedido um significado construtivo e fazer com que os filhos aprendam a reagir, connosco, às frustrações da vida.
“O que eu quero dizer é que a melhor forma de um pai ensinar um filho a lidar com a frustração é mostrando-lhe como agir pelo exemplo”, resume a especialista em parentalidade positiva.
Enquanto educador, é muito mais interessante ajudá-lo a analisar os porquês do revés, o que aprendeu, o que fará depois, o que significa que também os adultos precisam de aprender a fracassar, sim.
“Explorarem os seus próprios medos é só um meio de garantir que não os confundem com os medos dos filhos”, diz a coach.
Fonte: DN Life
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