Candidatou-se à universidade e entrou. Poderia ser uma história banal se não estivéssemos a falar de Carolina Ferreira Canais, que, aos 44 anos, se tornou a primeira surda-cega a ingressar no Ensino Superior.
Escolheu a licenciatura em Língua Gestual Portuguesa da Universidade Católica, um curso criado no ano passado especialmente direccionado para surdos, mas que teve que se adaptar para receber esta nova aluna.
Segundo Ana Mineiro, coordenadora da licenciatura, este foi um "investimento da universidade na promoção da igualdade de oportunidades", uma vez que aceitar a sua candidatura implicou a contratação de duas intérpretes tácteis, tradução de manuais para braille e aulas tutorais, pois este é um curso de "Blanded Learning", com formação on-line e presencial de 15 em 15 dias.
Surda de nascença, Carolina começou a debater-se com os problemas de visão há cinco anos. "Em 2005, a minha visão começou a reduzir devido ao Síndrome de Usher, tipo 1, e tem sido uma grande luta, bastante difícil".
Antes de a progressiva cegueira a afectar, fez um curso de contabilidade, trabalhou como funcionária administrativa e quando a visão lhe retirou competências viu-se obrigada a pedir a reforma. Incapaz de estar parada, esforçou-se para entrar no Centro de Reabilitação de Nossa Senhora dos Anjos, em Lisboa, onde aprendeu a cozinhar, passar a ferro e teve aulas de braille e de mobilidade com a bengala. "Aprendi de tudo", conclui. A energia, essa, vai buscá-la "ao desporto, às artes, à escrita ou aos amigos".
Hoje, a universidade é o grande desafio de Carolina Canais, que comunica com as intérpretes e com os colegas através de língua gestual apoiada, ou seja, o desenho das letras na palma da mão ou da leitura táctil do que é expresso em língua gestual. Apesar de utilizar esta língua desde criança, Carolina também aprendeu a falar, aos 24 anos, com um terapeuta, e é entre o gesto e a voz que melhor se expressa.
A viver sozinha num lar, para estar próxima da faculdade, Carolina divide o tempo entre o curso, a natação e as aulas de artes decorativas. O futuro é uma interrogação coroada por um objectivo que persegue há muito: o de ser escritora.
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