terça-feira, 14 de outubro de 2025

A urgência de cuidar da Educação Especial

Sou diretora de um agrupamento de escolas com cerca de 2300 alunos, dos quais 66 beneficiam de medidas adicionais de suporte à aprendizagem, dispondo de seis salas de Ensino/Apoio Estruturado. A Educação Especial tem, pois, uma importância significativa no nosso trabalho quotidiano, exigindo bastante dos nossos recursos humanos – professores de Educação Especial, técnicos especializados, assistentes operacionais – que, apesar do admirável sentido de missão e profissionalismo com que se dedicam a estas crianças e jovens, são claramente insuficientes, pondo em causa o princípio da escola inclusiva. Senão, vejamos:

i) O número de alunos com medidas adicionais tem vindo a aumentar. Face ao ano letivo anterior, passámos de 50 para 66 alunos a beneficiar destas medidas de suporte à aprendizagem. As problemáticas com maior incidência remetem para um quadro clínico de Perturbação do Espectro do Autismo e Multideficiência. Muitas destas crianças apresentam dificuldades e comprometimento significativo ao nível da funcionalidade e da autonomia (necessidade de cuidados alimentares, agitação psicomotora, alterações significativas em termos sensoriais, manutenção de comportamentos de auto e heteroagressão súbitos e espontâneos, incapacidade de comunicação, dificuldades de controlo de esfíncteres e necessidade de muita supervisão ao nível da segurança).

Estes alunos frequentam as salas de Ensino/Apoio Estruturado, espaços físicos limitados que vão ficando progressivamente lotados, pois a lei obriga a que a sua inscrição seja aceite – alunos com programa educativo individual (PEI) têm prioridade na renovação de matrícula – independentemente da sua área de residência, ficando apenas sujeitos a existência de vaga em turma. Com salas cheias há menos condições para apoio individualizado e técnico, menos tempo para cada aluno;

ii) O número de assistentes operacionais é definido por lei, sendo o rácio atualizado (ou não), anualmente, pelo Ministério da Educação. Infelizmente, a realidade demonstra que as necessidades específicas de cada aluno não são consideradas, mesmo havendo relatórios técnicos pedagógicos que especificam as necessidades de aqueles alunos terem acompanhamento diário por parte de adultos, no que resulta numa clara insuficiência de recursos humanos. Tudo em nome de um rácio. Ora, a educação não pode ficar refém de rácios. Os nossos alunos com necessidades precisam de apoio, os nossos professores precisam de apoio para fazerem bem o seu trabalho, todos os alunos merecem ter as melhores condições para crescerem e aprenderem;

iii) O número de docentes de Educação Especial não é o suficiente. No caso do meu agrupamento, além dos 66 alunos com medidas adicionais, temos 163 alunos a beneficiar de Adaptações Curriculares Não Significativas e a necessitar de acompanhamento de um docente de Educação Especial. Apesar de termos solicitado um reforço de docentes neste grupo disciplinar, sabendo que o reforço de horas é dependente do número de horas de redução da componente letiva dos docentes, o que se verificou foi a diminuição das horas de reforço – assim, não conseguimos dar resposta às necessidades dos alunos.

Perante este cenário, entendo que há medidas que deviam ser consideradas para melhorar a resposta a este nível. Desde logo, a existência de salas de Ensino/Apoio Estruturado nos diferentes ciclos de escolaridade em todos os agrupamentos de escolas, possibilitando o aumento da oferta e das condições dos espaços, sendo que a inscrição de um novo aluno com PEI só deveria ser aceite havendo vaga nessas salas.

Ao mesmo tempo, a contratação de técnicos especializados podia passar para a alçada dos municípios, de forma a permitir uma gestão mais eficaz entre os diferentes agrupamentos do respetivo concelho. Ainda ao nível dos recursos humanos, a contratação de assistentes operacionais para acompanhar diariamente alunos nas suas diferentes atividades escolares, tal como está previsto no Relatório Técnico Pedagógico de alguns alunos, devia ser assegurada considerando a necessidade específica do aluno, mesmo estando acima do rácio definido por lei, enquanto a contratação de mais docentes de Educação Especial, grupo 910, deveria obedecer às necessidades específicas de cada Agrupamento.

Queremos ter uma Escola Pública de todos e para todos. Mas será que temos?

Sónia Soares Lopes

Fonte: Publico por indicação de Livresco

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