Marinus van IJzendoorn, professor do Centro de Estudos da Criança e da Família, da Universidade de Leiden (Holanda), está hoje em Lisboa, no ISPA, para falar sobre a teoria da suscetibilidade diferencial no desenvolvimento infantil. O investigador tem surpreendido o mundo com a ideia de que há um gene que pode determinar a propensão para crescer bem num mau ambiente, e vice-versa.
Na sua perspetiva, a sensibilidade da criança define a maneira como um ambiente positivo ou negativo pode interferir no seu desenvolvimento, e um ambiente negativo não é necessariamente determinante e prejudicial para a criança. Como é que os estudos sustentam esta ideia?
A ideia fulcral é que algumas crianças (e adultos também) são mais abertas do que outras ao meio ambiente, para o melhor e para o pior. Isto significa que algumas crianças são mais vulneráveis a desenvolverem-se negativamente num ambiente mau, mas estas mesmas crianças poderiam desabrochar num ambiente ideal. Chamamos a estas crianças suscetíveis ao ambiente, comparativamente àquelas que são mais indiferentes à qualidade do ambiente, por exemplo, à maneira como os seus pais agem. As crianças suscetíveis retiram mais benefícios do apoio e da intervenção dos pais, mas também podem sofrer mais com uma parentalidade de baixa qualidade. Por exemplo: as crianças de temperamento difícil que se irritam e perturbam facilmente sofrerão mais com uma parentalidade severa, mas, se os pais mudarem para melhor e se tornarem mais recetivos, estas crianças "difíceis" poderão desabrochar melhor do que qualquer outra criança de temperamento fácil. Por isso, o temperamento difícil não é um fator de risco determinante do mau desenvolvimento, pelo contrário, é um fator de suscetibilidade com grandes oportunidades para o desenvolvimento se o meio ambiente for propício.
Vários investigadores apontam a imitação do comportamento dos pais como sendo um aspeto-chave do crescimento, bem-estar e felicidade das crianças. De acordo com os seus estudos, é efetivamente assim ou o comportamento dos pais tornou-se um fator menos importante para o desenvolvimento das crianças?
A parentalidade é de uma importância crucial para o desenvolvimento da criança, certamente das crianças mais vulneráveis. Estas crianças dependem, para o seu desenvolvimento, da qualidade do meio ambiente e uma parentalidade severa pode influenciá-las no sentido de direções desviantes, enquanto os pais fantásticos podem transformá-las em pessoas de grande sucesso em vários domínios.
Na sua perspetiva, a genética tem um forte impacto no desenvolvimento das crianças. Se uma criança possuir o gene associado à depressão, quer dizer que será mais sensível a ambientes adversos? E o oposto será também verdade, isto é, se uma criança não possuir esse gene, será menos afetada por contextos negativos?
Demonstrámos de facto que o gene recetor da serotonina é um marcador de suscetibilidade ao meio. Se as crianças com a variante curta do gene recetor da serotonina se encontrarem num mau ambiente, desenvolverão mais rapidamente sinais de depressão e de outros problemas do desenvolvimento comparativamente com crianças que possuam a variante longa deste gene. Mas estas mesmas crianças com o chamado gene "de risco" ultrapassarão as crianças que vivem num ambiente ideal e têm pais calorosos e recetivos, mas que também sabem definir limites e criar uma estrutura para os seus filhos.
Que mensagem sublinharia como mais importante para transmitir à audiência portuguesa que o irá escutar na conferência, no ISPA?
Devemos deixar de chamar vulneráveis às crianças quando elas têm um temperamento difícil ou genes de "risco"; em vez disso, devemos encará-las como orquídeas que precisam de cuidados ideais para florescer, mas que murcharão se o jardineiro for desajeitado. E pode-se aprender jardinagem, tal como a formação parental pode ajudar os pais a cuidarem melhor dos filhos.
O que é um ambiente ideal e como descreveria os cuidados ideais com as crianças-orquídeas?
Um ambiente ideal para todas as crianças consiste em relações estáveis e continuadas com pais/cuidadores que dedicam tempo a interagir com as crianças quando cuidam delas de uma maneira calorosa, sensível e sincronizada, e que estão disponíveis especialmente como refúgio quando as crianças estão agitadas, ansiosas ou doentes; e estes cuidadores/pais deveriam também ser capazes de impor limites de uma maneira calorosa mas firme e estruturar o comportamento dos seus filhos. A sensibilidade parental e a disciplina sensível são conceitos cruciais de uma parentalidade suficientemente boa e exigem relações estáveis e continuadas, com tempo suficiente para a comunicação, a brincadeira e atividades em conjunto.
Fonte: DN
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