segunda-feira, 6 de janeiro de 2025

O papel dos encarregados de educação nas escolas

Na sociedade contemporânea, testemunhamos um fenómeno cada vez mais preocupante no ambiente escolar: a excessiva interferência dos encarregados de educação em domínios que deveriam ser exclusivos dos profissionais do ensino. Esta realidade, que se tem intensificado nos últimos anos, merece uma reflexão profunda sobre os limites da participação parental na educação formal.

Imaginemos um cenário paralelo: quando chamamos um canalizador a nossa casa, confiamos plenamente no seu diagnóstico e expertise. Não nos aventuramos a questionar se deve usar esta ou aquela ferramenta, se deve substituir determinado tubo ou se o seu método de trabalho é o mais adequado. Reconhecemos que a sua formação técnica e experiência prática o qualificam para tomar estas decisões. Por que razão, então, assistimos a uma realidade tão diferente no contexto educativo?

Os professores, profissionais altamente qualificados com formação específica em pedagogia e didática, veem-se frequentemente confrontados com encarregados de educação que questionam métodos de ensino, estratégias pedagógicas e até decisões sobre avaliação. É como se um paciente entrasse no consultório médico e exigisse que lhe fosse prescrito um determinado exame em detrimento de outro, baseando-se apenas em pesquisas superficiais ou em opiniões não fundamentadas.

Esta intromissão excessiva tem consequências nefastas. Em primeiro lugar, mina a autoridade do professor na sala de aula. Quando um aluno percebe que os métodos do professor são constantemente questionados em casa, a sua postura face à aprendizagem e o respeito pelo docente ficam inevitavelmente comprometidos. Em segundo lugar, cria um ambiente de tensão constante que em nada beneficia o processo educativo.

Particularmente preocupante é a cultura de permanente justificação que se instalou nas escolas. Os professores veem-se forçados a despender uma parte significativa do seu tempo laboral a explicar e defender cada decisão pedagógica, cada método de avaliação, cada estratégia de ensino. Esta necessidade constante de justificação não só desgasta os profissionais como os desvia do seu propósito fundamental: ensinar.

A desconfiança sistemática no professor, que inevitavelmente contamina a perceção dos alunos, tem desviado o foco das verdadeiras questões que afetam o ensino. Em vez de nos concentrar em debates cruciais sobre a qualidade da educação, a inclusão, ou os recursos disponíveis, perdemo-nos em querelas sobre aspetos que deveriam ser residuais na discussão educativa.

É fundamental estabelecer uma distinção clara entre participação construtiva e interferência prejudicial. Os encarregados de educação têm, certamente, um papel importante na vida escolar: acompanhar o progresso académico dos educandos, participar nas reuniões agendadas, colaborar em atividades escolares quando solicitado. No entanto, questionar sistematicamente decisões pedagógicas ou metodológicas ultrapassa os limites do razoável.

Assim como confiamos em canalizadores para reparar as nossas instalações e em médicos para cuidar da nossa saúde, devemos confiar nos professores para educar os nossos jovens. A sua formação académica, experiência profissional e dedicação à causa do ensino credenciam-nos como os especialistas mais adequados para tomar decisões no domínio pedagógico.

É tempo de restaurar o equilíbrio nas relações escola-família. Os encarregados de educação devem compreender que, tal como não interferem no trabalho de outros profissionais especializados, também não devem interferir nas decisões pedagógicas dos docentes. A escola pública encontra-se, indubitavelmente, numa situação delicada, mas é crucial reconhecermos que, assim como todos podem contribuir para a sua recuperação, todos podem igualmente agravar os seus males. Só através de um equilíbrio saudável entre participação e respeito pela autonomia profissional poderemos garantir um ambiente educativo onde cada ator desempenha o seu papel específico em prol do sucesso dos alunos.

Alberto Veronesi

Fonte: CNN Portugal por indicação de Livresco

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