José Verdasca, professor universitário, coordenador do grupo de trabalho sobre recuperação das aprendizagens, analisa as medidas que estão a ser discutidas e que foram propostas ao Governo.
Por que motivo dar autonomia às escolas é a melhor forma de garantir a eficácia de um plano de recuperação de aprendizagens apresentado na terça-feira pelo Governo?
Sabemos hoje que tende a existir maior eficácia e qualidade educativas quando se estreitam interacções entre escolas e autarquias locais, mobilizando neste desiderato as famílias, instituições de ensino superior, centros de formação e outros actores com impacto sócio-educativo na comunidade. Daí fazer todo o sentido compaginarmos quatro princípios orientadores fundamentais, cuja interdependência garante muito maior eficácia educativa: o princípio da subsidiariedade educativa, da territorialização das políticas, do compromisso ético e deontológico na gestão de recursos, da autonomia da escola. Em primeiro lugar, porque inscreve uma cultura de responsabilidade quando se assume que a comunidade educativa dispõe de poder decisório. Tal constitui um importante factor indutor do exercício da cidadania activa. Depois, porque instituir modos de acção pública e de governança educacional que, sob a liderança da escola, requerem exercícios participados na produção local das medidas de acção educativa gera um comprometimento colectivo, potenciando sinergias. Por fim, porque o princípio da autonomia da escola e, sobretudo, o seu uso inteligente se afigura basilar na gestão integrada do currículo, do trabalho pedagógico com os alunos, dos recursos, do tempo escolar.
Como antecipa que possa concretizar-se a hipótese que consta do plano de que um aluno que reprove numa ou mais disciplinas, mas transitou de ano, possa frequentar as aulas dessa disciplina novamente no ano seguinte?
Um aluno que teve um desempenho com nível positivo numa disciplina, mas que ficou retido, pode, no ano seguinte, recuperar nas disciplinas em que teve negativa e não vai baixar o seu nível de proficiência nas disciplinas em que já tinha tido positiva. Parece-me, por isso, razoável e justo encontrar, ao nível de cada escola, novas respostas, que implicam obviamente rupturas com a tradicional gramática escolar, sobretudo no 2.º e 3.º ciclos do ensino básico regular. Pensar numa lógica de ciclo abre novas possibilidades na reconfiguração pedagógica e na gestão integrada do currículo. Desde logo, a plurianualidade do tempo escolar e do currículo, abre mais espaço para outras reconfigurações de relação entre alunos e professores e de apoio individualizado e tutorial.
Uma ideia como a criação de Escolas de Verão, que chegou a ser aventada, acaba por não constar no plano apresentado pelo Governo. Essa proposta chegou a ser apresentada pelo grupo de trabalho que liderou e foi rejeitada pelo Governo? Ou foi ainda durante as conversas entre os peritos do grupo de trabalho que ela acabou por ser abandonada?
De algum modo, são actividades que podem estar contempladas nos planos integrados e inovadores de combate ao insucesso escolar dos próprios municípios e entidades intermunicipais, pelo que poderão ser sempre oferecidas e organizadas pelas autarquias, em parceria com associações de pais ou com outras entidades da comunidade, promovendo sobretudo actividades desportivas e artísticas e aprendizagens de natureza académica com o apoio de tutores.
Fonte: Público
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