domingo, 12 de março de 2017

Pode a Educação ser verdadeiramente Inclusiva sem serviços de Psicologia?

No centro da atual discussão sobre educação inclusiva em Portugal e do seu alinhamento com as exigências oficiais europeias e internacionais, torna-se imperativo perspetivá-la como um direito de todos os alunos, sem exceções.

Há quase 20 anos no exercício da psicologia em contexto escolar e enquanto recurso especializado, integro uma cultura educativa ela própria inclusiva dos seus diferentes participantes e serviços. Colaboro em experiências educativas que visam a inclusão plena dos alunos e a qualidade do ensino-aprendizagem. E é neste contexto que participo e observo mais-valias na construção de projetos educativos e de currículos, flexíveis e suficientemente diferenciados, verdadeira e legitimamente acessíveis para todos os alunos.

Contribuo para associar à educação e ao currículo oportunidades do aluno desenvolver as suas soft-skills, através de programas sustentados de promoção de competências socioemocionais ou de promoção da saúde e bem-estar psicossocial. E estou certa de que estes programas ajudam na prevenção de comportamentos de risco tão mediatizados como a violência escolar, entre outros.

Colaboro em projetos de tutoria especialmente pensados para o desenvolvimento global e sucesso escolar de todos os alunos, não apenas dos que experienciam insucesso escolar. E em outros tantos, que promovem neles competências para comunicar, interagir positivamente e resolver problemas, através do respeito mútuo, tolerância e aceitação do outro, colocando em perspetiva como a inclusão faz funcionar a diversidade. Incluo finalmente a promoção de valores que provoquem no aluno a responsabilidade social, preparando-o para ser socialmente interventivo e capaz de transpor a sua experiência de inclusão educativa para ações comunitárias de inclusão social.

Enquanto psicóloga escolar, apoio a escola e os professores na adequação das estratégias e respostas educativas, através de intervenções focadas na aprendizagem e/ou no comportamento, e na avaliação sistemática das necessidades e progressos dos alunos. Desta forma, professores e psicólogos garantem esforços conjuntos, soluções e práticas pedagógicas diferenciados e personalizados, de acordo com as necessidades, estilos de aprendizagem e o perfil de cada aluno em particular e do grupo-turma em geral, assegurando a respetiva qualidade educativa, em prol da equidade.

Um dos maiores contributos da intervenção psicológica para a educação inclusiva assentará, sem dúvida, na própria inclusão das famílias. Mais do que um ato pedagógico, a aprendizagem é um ato social de interação e a qualidade das relações e interações podem transformar os alunos, o seu desempenho e a escola. Por isso, é papel dos serviços de psicologia escutar também as vozes dos alunos e das suas famílias sobre quais as suas necessidades, facilitar a sua participação em tomadas de decisão e o seu compromisso com a escola.

Urge uma mudança de paradigma! Urge dotar as escolas de psicólogos em permanência, que possam estar na linha da frente do desenvolvimento de práticas que apostem na promoção, prevenção e na intervenção precoce, em detrimento da remediação. Urge reconhecer o seu contributo para o desenho de intervenções mais abrangentes e menos restritivas, portanto mais acessíveis a todos e mais conducentes ao sucesso educativo dos alunos e das escolas e a uma maior qualidade de vida destes. Creio que esta, sim, seria uma mudança efetivamente mais sustentadora do verdadeiro sucesso educativo e de uma educação verdadeiramente inclusiva!

Sofia Ramalho

Vice-presidente da Ordem dos Psicólogos Portugueses

Fonte: Observador por indicação de Livresco

Sem comentários: