O agrupamento de escolas de Cristelo, em Paredes, prepara-se para ser pioneiro na avaliação de oito em oito semanas, o que perfaz quatro períodos escolares, já neste ano letivo. A decisão foi tomada depois de o agrupamento ter entrado no Projeto-Piloto de Inovação Pedagógica, há três anos, que deu essa autonomia às escolas.
A comunidade educativa não se revê na divisão do ano em dois semestres, explica Mário Rocha, diretor do agrupamento. Por isso, o projeto-piloto serviu para implementar outro tipo de inovações. A escola — que foi visitada esta quarta-feira pelo ministro da Educação — é, aliás, a única, entre as sete selecionadas pela Direção Geral de Educação, que não avançou para a semestralização.
Quando chegou, Tiago Brandão Rodrigues tinha já um microfone apontado e uma pergunta dos alunos: porque escolheu esta escola para marcar o início do ano letivo? “Não é uma escola qualquer”, anunciou.
Escolhi esta escola pelo projeto pedagógico, mas com isso não estou a atestar ou a dizer que este projeto se tem de impor aos projetos pedagógicos das outras escolas. Estes esforços de flexibilização, sempre baseados na autonomia das escolas, dão a cada uma delas a oportunidade de desenhar o seu projeto pedagógico”. Tiago Brandão Rodrigues, Ministro da Educação
O diretor do agrupamento diz que passar de três para dois momentos de avaliação — uma possibilidade alargada a todas as escolas desde 1 de setembro e que é uma das grandes novidades deste ano letivo — “não resolve problema absolutamente nenhum e pode inclusivamente acrescentar problemas, como estarmos muito tempo para fazer uma avaliação das aprendizagens”. Para aquela comunidade educativa, períodos de avaliação mais curtos e feedback mais frequente aos pais e alunos só trazem vantagens.
Todos os argumentos usados a favor da semestralização, para mim, são na verdade argumentos contra. Dizem que é bom porque temos mais tempo para avaliar o aluno, não temos a pressão de avaliar o aluno logo ao fim do primeiro período. Isto para mim é algo negativo porque não devemos pensar na avaliação como algo a longo prazo. Eu não preciso logo em novembro de saber como é que o aluno vai estar no final do ano. Eu preciso é de lhe dizer como é que ele está naquele momento e o que é que ele ainda tem para melhorar”, explicou Mário Rocha, diretor do agrupamento de escolas do Cristelo.
Com a entrada no projeto piloto do governo, no início do ano letivo de 2016-2017, foi dada uma maior liberdade a um pequeno grupos de escolas selecionadas para “reorganizarem turmas, horários, matriz curricular, programas e calendário escolar”, lê-se no site da DGE. Por essa altura, o agrupamento do Cristelo, com cerca de 1.000 alunos em turmas desde o ensino pré-escolar até ao 9º ano, testou uma primeira inovação: avançou com referenciais de integração curricular de oito em oito semanas, apesar de continuar a ter apenas os três períodos de avaliação para os alunos.
Os referenciais de integração curricular são “módulos” de disciplinas que trabalham articuladas durante oito semanas. Por exemplo, “Português pode trabalhar em articulação com Geografia, Ciências e Artes. Estas quatro disciplinas, durante oito semanas, trabalham em conjunto”, explica Mário Rocha ao Observador. Passado o tempo do módulo, Português poderá juntar-se a Matemática, a Inglês e a Físico-Química.
“Até aqui, os alunos mudavam o currículo de oito em oito semanas, mas não havia paragem porque o calendário escolar tinha os períodos tradicionais”. O que este ano letivo vem acrescentar é que, ao fim de oito semanas de aulas, os alunos terão uma semana de férias, que serve não só para marcar um momento de avaliação e de alteração no módulo, mas também para os professores poderem preparar o módulo seguinte.
Por terem mais momentos de pausa, os alunos têm menos uma semana de férias no Natal e na Páscoa e menos quinze dias no verão.
A acrescentar às inovações, Mário Rocha aponta também a criação da semana temática, a última de cada período de oito e, por isso, de cada módulo. Estas semanas dedicam-se “às áreas de competência do perfil dos alunos”, passando a ter as disciplinas mais típicas para cumprirem competências “como linguagem e texto, resolução de problemas, estado de saúde e ambiente”, enumera o diretor. As aulas passam a ser mais participadas, lúdicas e práticas.
Foi uma dessas aulas práticas que começou por visitar o Ministro da Educação. Lia-se, entre a turma do 5ºA, organizada em círculo, excertos de A árvore Generosa. No primeiro ciclo, a turma já tinha aulas do género, confirmou o Tiago Brandão Rodrgues, num “intercâmbio de ideias absolutamente fundamental”.
Para o Ministro, as medidas adotadas pelas diferentes escolas nos diferentes projetos educativos “não são um fim em si mesmo, mas instrumentos para chegarmos a um fim”: combater o insucesso escolar. Os RIC’s – referenciais de integração curricular – apesar de “terem um nome complicado”, diz o Ministro, parecem ter feito a diferença, nos últimos três anos, nesse sucesso de que fala o Ministro.
“Quando nos foi feito este convite pela DGE, foi-nos dito para nos colocarmos o nosso foco no 7º ano, no qual cerca de um quinto dos alunos reprovava”, explica Mário Rocha. Há três anos, a escola tinha 48% de alunos sem negativas. Este ano, o valor sobe para quase 80% dos alunos com sucesso pleno.
“Com este indicador, percebemos a importância do projeto não só nas taxas de retenção dos alunos, como na excelência apresentada”. Mas as taxas de retenção “também praticamente desapareceram”, conta-nos Mário Rocha. E apesar de a escola ter implementado a regra da não retenção até ao final do ciclo,e por isso passar os alunos automaticamente de ano, acontece que entre ciclos, onde há exames nacionais e, por isso, critérios de aprovação nacionais, os resultados melhoraram bastante. No 4º ano, há 0% de reprovações, assim como no 5º e no 6º anos. No terceiro ciclo de escolaridade, a escola tinha uma taxa de retenção que rondava os 20% no 7º ano, os 28% no 8º ano e 33% no 9º ano. Em três anos, passou a ter 7% de retenções no 9º ano, “mas praticamente nenhumas no 7º e no 8º”, reforça o diretor.
Talvez seja pelos resultados que Tiago Brandão Rodrigues perguntou mais tarde, num auditório onde se falava de inclusão, se os alunos já tinham visto notícias sobre a escola. É que “apesar de ser de Paredes de Coura”, o Ministro vem poucas vezes a Paredes, mas é cá que “os professores têm mostrado que a escola pode fazer diferente”.
E com votos de um bom ano letivo, o Ministro comentou que “se calhar era importante nas câmaras municipais e no Ministério adotarmos algumas destas estratégias”.
Mais liberdade para as escolas, desde que com um plano educativo previamente aceite
Depois do projeto piloto, a portaria 181/2019, publicada em junho pelo Ministério da Educação e em vigor desde 1 de setembro, passou a permitir a todas as escolas — já este ano letivo e sejam elas de ensino público, privado ou cooperativo — organizarem-se como quiserem, desde que, previamente, apresentem um plano de inovação pedagógica e que ele seja aprovado pelo governo. Há apenas uma obrigação: as aulas têm de começar e acabar ao mesmo tempo para todas as escolas e os exames nacionais também serão no mesmo dia.
Ao contrário do que acontece em Cristelo, a maioria dos 50 agrupamentos que viram ser aprovados pelo governo os seus planos de inovação pedagógica vão transitar de três períodos para dois semestres.
No ano letivo passado já tinha sido alargada a todas as escolas a “flexibilidade curricular”, previamente testada em 225 estabelecimentos de ensino, em 2017. Com a medida, as escolas puderam gerir sozinhas 25% da carga horária semanal, criando novas disciplinas, substituindo as aulas pelo tratamento de temas comuns a várias disciplinas ou até fundir disciplinas.
Fonte: Observador
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