O gosto pela escola diminuiu nos alunos do 6.º, 8.º e 10.º anos, que continuam a achar a matéria demasiada aborrecida e difícil, segundo os resultados e um estudo em 51 países que serão apresentados esta quarta-feira.
“Este valor tem vindo sempre a agravar e comparando com outros países (…) este é sempre aquele indicador que nós temos menos bom”, considerou a coordenadora do estudo, Tânia Gaspar, sublinhando a necessidade de a escola “fazer uma aproximação à realidade dos jovens”.
Esta investigação – Health Behaviour in School-aged Children (HBSC/OMS) 2022 – feita em colaboração com Organização Mundial de Saúde, indica que a pressão com os trabalhos de casa (muita pressão) aumentou (de 13,7% em 2018 para 22,4% em 2022) e que o que os alunos menos gostam na escola é a comida nos refeitórios.
Segundo os dados a que a Lusa teve acesso, o gosto pela escola baixou de 70,4% (em 2018) para 69,7%, as atividades extracurriculares passaram da terceira para segunda posição daquilo que os alunos menos gostam na escola, ao contrário do que aconteceu com as aulas, que são agora a terceira coisa de que os alunos menos gostam.
Os dados indicam ainda que os colegas são o que menos frequentemente os alunos não gostam, deixando de ser os intervalos/recreios, como acontecia em 2018.
Mostram ainda que as dificuldades com a escola e com os trabalhos da escola aumentaram de 2018 para 2022. A matéria continua a ser considerada demasiada (87,2% em 2018 para 87,9% em 2022), aborrecida (84,9% em 2018 para 87,4% em 2022) e difícil (82% em 2018 para 82,1% em 2022). Há 30,3% dos jovens que disseram não gostar da escola.
Tânia Gaspar sublinha, a este nível, a necessidade de a escola “se atualizar e conseguir acompanhar os jovens no seu modo de contacto com o conhecimento”.
Em declarações à Lusa, também a investigadora Gina Tomé, da equipa portuguesa do HBSC/OMS e Aventura Social/ISAMB/Universidade de Lisboa, considera que “a escola ainda está naquela estrutura de há anos” e “não evoluiu”.
“A escola está a perder terreno (…). A escola que a nossa geração frequentou não é a mesma que estes jovens estão a frequentar, mas no fundo a estrutura é a mesma”, considerou a investigadora, acrescentando: “os professores também acusam isso, estão motivados e têm vontade [de mudar], não têm é recursos”.
A referência ao stress das avaliações também aumentou nos dados recolhidos este ano, passando da quarta posição em 2018 para a terceira posição em 2022 (77% em 2018 para 83,1% em 2022). Alguns adolescentes referem também a pressão dos pais pelas boas notas (58,4%).
Comparando com o estudo realizado em 2018, baixou ligeiramente a relação com os colegas (de um valor médio de 11,89 para 11,77), enquanto a relação com os professores se manteve (11,36).
De qualquer forma, sublinha Tânia Gaspar, “a escola continua a ser um local de segurança e de proteção”.
Menos de um em cada quatro jovens (22,8%) refere existir um incentivo à comunicação e relação entre a escola e a família e 30,7% dos adolescentes consideram importante melhorar a comunicação entre a escola e a família.
Quase um em cada três jovens (31%) apontam a pouca participação dos pais na associação de pais como a principal barreira à relação entre a escola e a família.
“Quem trabalha nestas áreas sabe que esse envolvimento [dos pais na escola] vai decrescendo muito ao longo da escolaridade. Quando as crianças são mais pequenas há uma maior adesão, e depois, progressivamente, vai havendo menos”, explicou a coordenadora do estudo.
A responsável sublinhou ainda: “Temos que pensar em que moldes é que isso poderá continuar, porque se formos a ver, se perguntarmos a um jovem do 9.º ou 10.º ano se quer que o pai vá à escola, se calhar ele também não quer, porque quer ter o seu espaço, a sua autonomia“.
“Então temos todos de pensar como é que se serão formas boas e positivas para as várias partes, para os pais poderem fazer parte da escola, mas também sem se intrometerem no desenvolvimento e na autonomia natural dos filhos”, considera Tânia Gaspar, acrescentando: “Temos algumas boas práticas, relacionadas com atividades extracurriculares que são desenvolvidas e em que a escola está aberta aos pais“.
Tudo para que os pais “não sejam apenas chamados para as reuniões”, onde, por vezes, “as notícias não são as melhores”, concluiu.
Os resultados do estudo não surpreendem o presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP): “Não sentimos que haja muita novidade neste estudo, tendo em conta aquilo que ouvimos e sentimos dos nossos alunos”, disse Filinto Lima em declarações à Lusa.
“Há certas matérias que são extensas e nós também o achamos”, acrescentou, lembrando que as escolas têm atualmente alguma autonomia através do projeto de autonomia e flexibilidade curricular, mas ainda estão sob a pressão do acesso ao ensino superior que faz com que alguns professores estejam focados em preparar os seus alunos para os exames nacionais.
Filinto Lima lamenta o foco na preparação para “um exame de hora e meia”, quando se deveria estar a “preparar os jovens para a vida”, mas diz-se esperançado com as palavras da ministra do ensino superior, Elvira Fortunato, que recentemente prometeu rever o modelo de acesso ao ensino superior.
Filinto Lima acredita que o modelo de trabalho na escola está a mudar, lembrando que os telemóveis e os computadores passaram de “intrusos” a “convidados”.
“Os professores agora já dizem aos alunos para usarem os telemóveis e os computadores para fazerem pesquisas e trabalhos”, lembrou o também diretor de um agrupamento de escolas de Vila Nova de Gaia.
Filinto Lima alerta ainda para a desigualdade entre os alunos que têm apoio – através de ajuda em casa ou de explicações – e os que têm de fazer os TPC sozinhos.
Mas o que os alunos menos gostam na escola é da comida dos refeitórios, revela o estudo.
Para o presidente da ANDAEP esta situação poderá explicar-se pelo facto de “nas cantinas ser servida comida saudável, quando lá fora eles podem comer o que querem, como pizas ou hamburgers”.
Apesar das criticas, Filinto Lima lembra “a alegria dos alunos quando regressaram à escola” depois dos confinamentos forçados pela pandemia de Covid-19.
O estudo divulgado esta quarta-feira integrou cerca de seis mil questionários, em 40 agrupamentos de escolas do ensino regular (Portugal continental), num total de 452 turmas.
Este trabalho pretendeu estudar os estilos de vida dos adolescentes em idade escolar nos seus contextos de vida, em áreas como o apoio familiar, escola, saúde física, saúde mental e bem-estar, sono, sexualidade, alimentação, atividade física, lazer, consumo de substâncias, violência e saúde planetária.
Em Portugal, o primeiro destes estudos foi aplicado em 1998 e o último tinha sido em 2018. O estudo, que entre 1998 e 2019 foi coordenado pela psicóloga Margarida Gaspar de Matos, integrou este ano cerca de 6.000 questionários, em 40 agrupamentos de escolas do ensino regular (Portugal continental), num total de 452 turmas. As respostas são de alunos do 6.º, 8.º e 10.º anos de escolaridade.
Este trabalho pretendeu estudar os estilos de vida dos adolescentes em idade escolar nos seus contextos de vida, em áreas como o apoio familiar, escola, saúde física, saúde mental e bem-estar, sono, sexualidade, alimentação, atividade física, lazer, consumo de substâncias, violência e saúde planetária.
Fonte: Observador
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