sábado, 22 de abril de 2017

Hiperatividade e Défice de Atenção: O problema estará nas crianças?

A nossa sociedade tem tendência para considerar patológicos comportamentos que não são socialmente aceites e, consequentemente, tratá-los como se fossem um problema médico suscetível de ser controlado por medicamentos.

Desde 2010 duplicaram em Portugal as vendas de medicamentos indicados para a Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA). Será que isto não nos faz pensar? Será que a hiperatividade aumentou assim tanto entre as nossas crianças?

Se sim, temos de pensar o que levou a isso. É mais fácil para todos quando o problema está na criança. É mais fácil quando arranjamos um nome para algo que não percebemos. Principalmente, é mais fácil quando esse comportamento que ‘incomoda’ corresponde a uma doença e, se essa doença já tem um tratamento e este tratamento é um comprimido, mais fácil se torna. Identificado como problema médico individual, cuja causa estaria apenas na criança, dispensa confortavelmente questionar a família, a escola, os profissionais de saúde e/ou o meio social.

Há, não tenho dúvida, crianças que necessitam de tomar medicação, mas também para essas a medicação ajuda a controlar o comportamento não o modificando. Há, provavelmente, muitas outras que não necessitam e que são medicadas.

Não pondo em causa a Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA) como entidade nosológica, ponho em causa muitos dos diagnósticos realizados e tratamentos recomendados.

Quando é diagnosticada PHDA numa criança e/ou num jovem, tanto este como os seus pais ou cuidadores deveriam ser adequadamente informados sobre que possibilidades de tratamento existem, quer tratamentos psicológicos, quer tratamento farmacológico e possíveis efeitos secundários deste último.

Programas de treino educacional para pais e cuidadores devem ser a primeira linha de tratamento para as crianças.

Quando é decidido o tratamento farmacológico é fundamental que este seja acompanhado por intervenções psicológicas, de modo a ajudar a criança a lidar com diferentes situações de modo mais adequado.

Mas é difícil aceitar que a Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA), cuja prevalência estimada se situa entre os 3 e 4%, resulte num volume gigantesco de vendas de medicamentos para PHDA prescritos a crianças até aos 14 anos.

Com base no conhecimento que dispomos e nos dados que existem, é portanto forçoso concluir que são hoje prescritos medicamentos que podem ter impacto negativo no desenvolvimento das nossas crianças e jovens, nomeadamente a nível psicológico.

Os psicólogos podem e devem colaborar no estabelecimento de medidas preventivas face ao surgimento dos problemas que muitas vezes redundam na medicação de crianças e jovens sem diagnóstico de PHDA e apenas com perturbações do comportamento que resultam normalmente de situações relacionais e de contexto (nomeadamente o “mau comportamento”, a irrequietude, o não respeito de regras, a falta de concentração, a falta de motivação).

A Ordem dos Psicólogos Portugueses não pode deixar de manifestar a sua apreensão com este sério problema que afeta a vida de crianças e famílias.

Deixo a questão: Será que o problema estará mesmo nas crianças?…

Isabel Trindade

Vice-Presidente da Ordem dos Psicólogos Portugueses

Fonte: Observador por indicação de Livresco

2 comentários:

Ki disse...

Interessante o que li nesta pagina, cheguei a ela por mero acaso, quando fazia algumas buscas sobre crianças abrangidas pelo decreto lei 3/2008 principiante quanto aos Artigos 17, 18 e 20. Isto porque a adotei uma criança com 10 anos em 2014, que por incrível que pareça e apesar de se encontrar no àquela data no 3º ano do 1º ciclo, fui informada no final do processo de adopção que esta não sabia ler nem escrever...estamos em 2017 e a minha filha está no 5º ano, abrangida por um PEI)já lê, escreve com alguns erros ortográficos e lá vai seguindo o seu percurso com algum esforço adicional quer por parte dela, quer por minha parte, quer também por parte dos professores do ensino especial que têm tido até agora, que sem duvida tem acreditado na minha filha. Este ano parece-me que a sorte não esteve a nosso favor, e tem existido alguma desentendimento entre a professora do ensino especial e ela, que estão a dificultar o desenvolvimento da criança. Hoje numa reunião, foi-me proposto,que seria o mais indicado para a minha filha lhe ser atribuído um SEF?? Como professor do ensino especial, será que me pode dar alguma indicação sobre isto, legislação ou informação mais objectiva. Bem haja

João Adelino Santos disse...

Olá Ki. O CEF (curso de educação e formação) é destinado a alunos com 15 anos de idade (ou que os façam até ao início do ano letivo seguinte ou, ainda, com autorização expressa do Ministério da Educação). Trata-se de uma formação que, para além da formação geral, integra uma componente de formação profissional. No final, o aluno fica com dupla certificação: certificado de habilitações e certificado de qualificação profissional. Para informações mais detalhadas, veja esta ligação http://www.anqep.gov.pt/aaaDefault.aspx?f=1&back=1&codigono=56225801AAAAAAAAAAAAAAAA
Abraço