quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Abrandar o aumento da miopia em crianças

Projeto envolve 130 crianças e revelou que o recurso a umas lentes de contacto com um desenho especial pode ter 60% de eficácia, conseguindo que os olhos cresçam menos.

Estas lentes de contacto não travam por completo a miopia, nem tão pouco a conseguem curar fazendo com que regrida. Isso será para um futuro melhor que ainda está por vir. O que estas lentes serão capazes de fazer – e já não é pouco – é conseguir que a normal progressão da miopia aconteça bem mais devagar. São lentes de contacto “especiais” porque têm “um desenho diferente”, explica José González Méijome, diretor do Laboratório de Investigação em Optometria Clínica e Experimental (CEORLab) da Universidade do Minho, onde se realizam testes clínicos com um grupo de 25 crianças. 

As crianças que durante dois anos experimentaram estas lentes de contacto com um desenho especial progrediram de uma dioptria para “2,5 ou menos do que isso”. No mesmo período, o grupo de controlo que usou as lentes de contacto convencionais aumentou de uma dioptria para quatro. O projeto no CEORLab começou em 2012, quando as crianças tinham entre oito e dez anos, e os bons resultados obtidos fizeram com se decidisse prolongá-lo por mais dois anos. Nesta segunda fase, as 25 crianças envolvidas nos ensaios vão usar as lentes especiais e beneficiar do efeito de retenção observado na primeira fase do projecto

“O problema da miopia é que o olho cresce de mais. Se passar de uma bola redondinha a uma bola de râguebi que estica numa direção, a imagem vai ficando mais desfocada”, explica o investigador.

O tamanho do olho importa e uma diferença de meio milímetro pode parecer insignificante, mas não é. “Um milímetro de crescimento de olho pode significar três dioptrias ou mais nas suas lentes de contacto”, nota José González Méijome. A miopia moderada e alta inicia-se geralmente entre os cinco e os dez anos e progride de forma significativa até aos 16, altura em que tende a desacelerar. Assim, é sobretudo para crianças e jovens que a inovação pode ser eficaz.

“No grupo das crianças que usavam as lentes o olho cresceu menos 60 %”, explica o diretor do CEORLab, que exemplifica: “No grupo de controlo que usou lentes de contacto convencionais um olho com 20 milímetros cresceu, passados dois anos, para 21.” No grupo que usou estas lentes especiais passou para 20,4, acrescenta.

Mas afinal o que é que estas lentes têm de especial? “O seu desenho ótico, o modo como as dioptrias da lente são distribuídas à frente do olho”, responde o investigador. “Se uma criança tem duas dioptrias de miopia, a lente ‘normal’ tem a correção de duas dioptrias em toda a sua área de visão para proporcionar uma visão nítida”, explica José González Méijome. Nestas lentes, contrapõe, “o que se faz é uma manipulação ótica da distribuição da potência das dioptrias”.

As novas lentes de contacto hidrofílicas estão a ser testadas por 130 crianças em quatro centros de investigação em todo o mundo, incluindo o CEORLab em Portugal, num projeto associado a uma empresa multinacional norte-americana e já são comercializadas. O projeto de investigação em curso e que só terminará no final de 2018 serve para demonstrar a segurança e eficácia das lentes e, se necessário, corrigir o seu desenho.

Os alertas para o aumento da miopia na população mundial são conhecidos e há especialistas que defendem que a doença está a assumir “proporções epidémicas”. Um artigo na revista Nature, de março de 2015, referia que, até ao final desta década, cerca de 2500 milhões de pessoas de todo o mundo terão miopia – ou seja, mais de um terço da população mundial. Neste momento, na Europa e nos Estados Unidos, cerca de metade dos jovens têm este problema. É o dobro dos valores registados há 50 anos.

O que é que nos está a deixar míopes? Não há uma resposta simples. “Conseguimos identificar fatores que estarão a contribuir para isso, como hábitos de visão, a exigência educativa, a exposição a um trabalho visual a uma distância muito curta, a menor exposição à luz solar.” Depois há, claro, os factores genéticos que aumentam a probabilidade de ser míope.

Fonte: Público

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