quinta-feira, 27 de novembro de 2025

Os desafios de famílias de jovens com deficiência: "Na prática nada acontece, só vemos portas fechadas"

A falta de apoios a cidadãos com deficiência continua a ser uma dos maiores razões de queixa. As dificuldades são sentidas, por exemplo, pelas famílias com filhos com necessidades educativas especiais. Marlene, mãe de Sara, uma menina que tem trissomia 21 e autismo severo, reclama das "portas fechadas" e pede que a filha seja vista e respeita "como qualquer outra criança".

A rotina de Marlene é a mesma há três anos. A filha mais nova, Sara, tem trissomia 21 e autismo severo. Depende da mãe para praticamente tudo. Sara nasceu há 16 anos em Gondomar e é lá que vive com a irmã e a mãe, a única cuidadora.

Sem pai presente e sem retaguarda familiar, Marlene esteve em casa para cuidar da filha. Mas em 2022, quis retomar a vida profissional. Conseguiu um emprego em Castelo de Paiva e trouxe Sara para uma escola mais perto.

Conciliar tudo é "muito difícil". Nas tardes sem aulas e sobretudo nas férias, a dificuldade aumenta.

Marlene teme ter de deixar o emprego

Nos últimos anos, tentou inscrever a filha em campos de férias e programas sociais, mas nunca conseguiu. Diz que só após uma queixa à Provedoria da Justiça, foi ouvida pela Câmara de Gondomar.

“Propuseram-me uma técnica da Segurança Social, algo que eu já tinha tido no passado. Não vai resolver o problema central da Sara, que é encaminhá-la para um local justo, digno e inclusivo, para ter os mesmos direitos de qualquer outra criança”, frisa Marlene.

Em Castelo de Paiva, a falta de resposta mantém-se, agravada pelo facto de este não ser o concelho de residência. Quando, daqui a dois anos, Sara atingir a maioridade, a incerteza será ainda maior e Marlene teme ter de deixar o trabalho.

A única esperança passa por uma nova resposta especializada, prevista para o concelho, mas sem data nem garantia de vaga.

Este é um dos muitos casos que expõe um país ainda pouco preparado para as crianças e jovens com necessidades educativas especiais. À procura de ajuda, Marlene faz sua a voz de muitos pais.

quarta-feira, 26 de novembro de 2025

A Educação Inclusiva e o Orçamento do Estado 2026

O Ministério da Educação, Ciência e Inovação lançou o documento "Orçamento do Estado 2026: Nota Explicativa". Nesse documento, constam referências à Educação Inclusiva. Nesta área destaca-se o seguinte:

5.2. Rever o enquadramento legislativo da Educação Inclusiva e assegurar respostas diversificadas e ajustadas às necessidades dos alunos

O Decreto-Lei (54/2018, de 6 de julho) que estabelece o regime jurídico da educação inclusiva em Portugal considera a inclusão como princípio estruturante de toda a escola e não apenas como uma vertente ligada à educação especial. Contudo, a sua concretização nas escolas coloca muitos desafios , sendo frequentemente identificadas pelas equipas no terreno diversas áreas suscetíveis de melhoria. 

Entre as principais dificuldades destacam-se inconsistências conceptuais, falta de formação dos profissionais, falta de clareza nas responsabilidades e morosidade dos processos. 

Atendendo à natureza complexa dos desafios associados à inclusão, o diploma será revisto com vista a promover uma abordagem integrada e multissetorial, que assegure uma operacionalização mais clara e eficaz. Esta revisão envolverá as áreas da Educação, Saúde e Segurança Social, garantindo uma resposta articulada e coerente. 

Pretende -se reorganizar os processos e criar um sistema de intervenção mais eficiente, através da revisão dos critérios de atribuição de recursos materiais e humanos e do reforço da formação dos profissionais, com base em enquadramentos jurídicos claros e consistentes. 

Em 2026, está previsto no âmbito da educação inclusiva um orçamento de 39 0 milhões de euros para recursos, apoios e medidas que promovam a inclusão efetiva de todos os alunos . 

terça-feira, 25 de novembro de 2025

O que uma nova definição de dislexia pode significar para as escolas

Uma recente alteração na definição de dislexia proposta por um grupo internacional de investigadores e profissionais pode influenciar as decisões políticas que determinam quais crianças são identificadas como portadoras dessa dificuldade de leitura.

A dislexia, uma condição neurobiológica que afeta a forma como os indivíduos leem e soletram, ganhou destaque nas escolas de ensino básico e secundário na última década. Em grande parte, como resultado da crescente defesa dos pais, 34 estados exigem agora que as escolas examinem as crianças para detetar dislexia no início do ensino básico.

Agora, a influente Associação Internacional de Dislexia revisou a definição da dificuldade de leitura de uma forma que pode afetar a forma como alguns estados operam o seu processo de triagem — eliminando da definição de 2002 a referência à dislexia como «frequentemente inesperada em relação a outras capacidades cognitivas».

A dislexia não está relacionada à inteligência, e as crianças que têm essa condição ainda podem — e muitas vezes conseguem — ter sucesso académico. Quando os investigadores começaram a estudar essa deficiência nas décadas de 1960 e 1970, identificaram os alunos como disléxicos quando suas habilidades de leitura deficientes não podiam ser explicadas pela sua inteligência geral, medida por testes de QI.

Isso deu origem a um método de diagnóstico da dislexia que ainda hoje é popular, chamado modelo da discrepância, através do qual as crianças são identificadas como disléxicas se houver uma diferença inesperada entre as suas capacidades intelectuais e o seu desempenho na leitura.

Mas um conjunto crescente de evidências mostra que esse modelo pode estar deixando muitos alunos disléxicos sem diagnóstico, disse Charles Haynes, professor emérito do MGH Institute of Health Professions, uma universidade em Boston focada em ciências da saúde, e copresidente do comitê diretor para a nova definição.

Texto em inglês, com acesso restrito, disponível em Education Week por indicação de Livresco

segunda-feira, 24 de novembro de 2025

Ministro da Educação diz que desvalorizar ensino profissional foi um erro

O ministro da Educação, Ciência e Inovação, Fernando Alexandre, defendeu esta sexta-feira a importância dos centros tecnológicos especializados e disse que a desvalorização do ensino profissional durante muitos anos "foi um erro".

"Durante muitos anos, de facto, desvalorizou-se o ensino profissional. Foi um erro que cometemos, que felizmente já foi invertido há uns anos, porque aquilo que precisamos é ter percursos alternativos para os estudantes, adequados ao perfil dos estudantes e que garanta também a empregabilidade", declarou.

De acordo com Fernando Alexandre, "o ensino profissional, com os equipamentos que hoje estão cada vez mais disponíveis nas escolas portuguesas, permite a obtenção de competências que vão ser muito importantes para o mercado de trabalho".

Este é um percurso "que não fecha outras portas", já que "seguir a via profissional dá acesso na mesma ao ensino superior", sustentou o ministro.

O titular da pasta da Educação asseverou a necessidade "de um ensino mais diversificado e ajustado ao perfil dos estudantes", que pode ser respondida através do ensino profissional, uma solução também para as demandas empresariais.

O ministro da Educação, Ciência e Inovação falava na manhã desta sexta-feira com os jornalistas, à margem da inauguração do Centro Tecnológico Especializado (CTE) Industrial da Escola Secundária de Avelar Brotero, em Coimbra, que contou com um investimento de mais de 1,4 milhões de euros do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

Na mesma escola, está também prevista a criação do CTE de informática, financiado em cerca de um milhão de euros pela mesma fonte, cuja inauguração se estima para março de 2026.

Como relembrou Fernando Alexandre, em todo o território nacional continental foram aprovados 404 CTE, com a estimativa de concluir a totalidade dos projetos até junho de 2026, dentro do prazo do PRR, que financia a medida com 480 milhões de euros.

Até o momento, cerca de uma centena de CTE estão prontos, mas Fernando Alexandre garantiu que agora o processo será rápido, com alguns dos espaços já em fase de conclusão.

"Isto vai ser uma grande transformação da qualidade do ensino profissional, porque os estudantes passam a ter acesso a equipamentos modernos. Aliás, muitas vezes até mais atualizados do que os que vão encontrar em algumas empresas", frisou.

Atualmente, acrescentou o ministro, "cerca de 40% dos estudantes do secundário já estão na via profissional", sendo que o objetivo é atingir cerca de 50% dos alunos.

"Obviamente, as escolas têm que se ir adaptando à procura, fazer esse ajustamento", realçou.

Questionado sobre as críticas que a medida tem recebido, pela possibilidade de condicionar o acesso dos jovens ao ensino superior, o governante respondeu que esta "não é uma visão certa", porque foi através dela que o Governo conseguiu "reduzir muito o abandono escolar em Portugal".

Entre as razões para a diminuição do abandono escolar, está a possibilidade de alunos do ensino científico-humanístico, que poderiam "não ter um percurso de tanto sucesso e não terem a motivação", encontrarem no ensino profissional "a motivação e as condições" para concluir o secundário.

"Neste momento, os dados indicam que mais de 20% dos alunos que terminam a via profissional ingressam no ensino superior diretamente", reforçou.

"A passagem por um mercado de trabalho deve abrir a possibilidade de sempre, ou nunca fechar a porta, do ingresso no ensino superior. Aliás, esse é um dos desafios que o ensino superior tem: conseguir alargar a sua população estudantil, a partir não apenas de estudantes com 18 anos", reiterou.

A cerimónia de inauguração do CTE Industrial da Escola Secundária de Avelar Brotero contou com a presença da presidente da Câmara de Coimbra, Ana Abrunhosa, que reiterou ao ministro o compromisso do município com a educação e a valorização dos profissionais que trabalham em escolas.

Fonte: RR por indicação de Livresco

sexta-feira, 21 de novembro de 2025

Crianças que contam pelos dedos desenvolvem competências matemáticas mais avançadas

As crianças que contam pelos dedos entre os 4 e os 6,5 anos de idade apresentam um melhor desempenho em soma matemática aos 7 anos do que as que não utilizam os dedos, segundo um estudo.

A conclusão sugere que contar pelos dedos é um passo importante para o desenvolvimento de competências matemáticas mais avançadas, de acordo com uma investigação da Universidade de Lausanne, na Suíça, publicada pela Associação Americana de Psicologia na revista "Developmental Psychology".

"Contar pelos dedos não é apenas uma ferramenta para o sucesso imediato em crianças pequenas, mas também uma forma de apoiar o desenvolvimento de competências aritméticas abstratas avançadas", reflete a autora principal, Catherine Thevenot, da Universidade de Lausanne, citada na quinta-feira pela agência Europa Press.

Contar pelos dedos é muito utilizado pelas crianças pequenas como estratégia para resolver problemas matemáticos.

No entanto, muitos professores do ensino primário esperam que as crianças deixem de contar pelos dedos demasiado cedo.

Um estudo francês apurou que 30% dos professores do primeiro ano consideram a contagem pelos dedos um sinal de que a criança está com dificuldades em compreender conceitos numéricos.

Investigações anteriores avaliavam geralmente as crianças num único momento e constatavam que aquelas que utilizavam os dedos para contar tinham um melhor desempenho em aritmética do que as que não os utilizavam, até aproximadamente aos 7 anos de idade.

No entanto, após os 7 anos, a relação inverte-se, e as crianças que não usavam os dedos passam a ter um melhor desempenho do que as que os usavam.

O que permanecia incerto, porém, era se as crianças que não usavam os dedos aos 7 anos nunca os tinham usado ou se eram "ex-utilizadores dos dedos" que tinham abandonado a prática.

"O nosso estudo teve como objetivo clarificar esta distinção e compreender melhor o que o uso dos dedos, ou a sua ausência, revela sobre o desenvolvimento aritmético das crianças", explicou Thevenot.

Estudo envolveu 211 crianças desde o pré-escolar até ao 2.º ano do ensino básico

Para tal, Thevenot e a sua colega, Marie Krenger, acompanharam 211 crianças suíças entre os 4,5 e os 7,5 anos (desde o pré-escolar até ao segundo ano do ensino básico) para avaliar como as suas estratégias de contagem com os dedos mudaram ao longo do tempo e a sua relação com a capacidade matemática.

Duas vezes por ano, os investigadores pediam às crianças que resolvessem até três conjuntos de problemas de adição com dificuldade crescente: somar dois dígitos entre 1 e 5, somar um dígito entre 1 e 5 a outro entre 6 e 9 e somar dois dígitos entre 6 e 9.

Em cada teste, os investigadores só avançavam para o nível de dificuldade seguinte se a criança tivesse resolvido corretamente 80% do conjunto anterior.

Os investigadores filmaram as crianças e observaram se usavam os dedos durante as tarefas de adição.

De um modo geral, verificaram que a contagem com os dedos atingia o pico por volta dos 5,5 aos 6 anos de idade. Até aos 5 anos, mais crianças conseguiam somar sem usar os dedos do que com eles.

No entanto, aos 6,5 anos, 92% das crianças já tinham utilizado os dedos em pelo menos um dos itens do teste.

Aos 7,5 anos, 43% das crianças eram "ex-contadoras com os dedos" (tinham usado os dedos para pelo menos um item do teste, mas já não o faziam), enquanto 50% eram contadoras com os dedos atualmente e apenas 7% nunca tinham usado os dedos.

De um modo geral, os investigadores descobriram que as crianças com melhor desempenho eram aquelas que tinham usado os dedos no passado, mas já não dependiam deles.

A partir dos seis anos de idade, estas ex-utilizadoras dos dedos superaram tanto as crianças que nunca usaram os dedos como as que ainda os usavam.

"Isto tem implicações importantes, pois demonstra que não há razão para desencorajar as crianças na escola de usar os dedos para resolver problemas aritméticos", defendeu Thevenot.

Um quarto dos alunos com pais estrangeiros reprova ou desiste no secundário

Alunos de origem imigrante chegam a chumbar três vezes mais do que os colegas de origem nacional. Diferenças podem estar relacionadas com integração e frequência de Português Língua Não Materna.

As desigualdades na progressão escolar entre os alunos filhos de pais estrangeiros face àqueles cujos pais têm nacionalidade portuguesa continuaram sem recuar no ano lectivo de 2023/ 2024. No secundário, as taxas de retenção e desistência ascenderam a 25,5%, entre os alunos cujos dois pais tinham nacionalidade estrangeira (ou um dos pais e o próprio aluno). É uma diferença de 17,3 pontos percentuais face à taxa verificada nos alunos com ambos os progenitores portugueses (8,2%).

Um quarto dos alunos com pais estrangeiros reprova ou desiste no secundário
Na prática, os alunos com pais estrangeiros chumbam três vezes mais do que os colegas de origem portuguesa, como apontam os dados que constam do Perfil Escolar de Alunos Filhos de Pais com Nacionalidade Estrangeira 2023/ 2024, publicado há dias pela Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC). (...)

Fonte: Público por indicação de Livresco

quinta-feira, 20 de novembro de 2025

Pais de filhos com deficiência ou doença crónica terão subsídio de 80%

A proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 2026 (OE2026) ainda não foi votada na Assembleia da República, mas já se sabe que será aprovada: o subsídio para os pais com licença para assistência a filho com deficiência ou doença crónica será aumentado dos actuais 65% para 80% da remuneração de referência. O limite máximo para o subsídio também irá aumentar de dois para três IAS - indexante de apoios sociais, o que significa, a valores actuais, que aumenta de 1045 para 1567,5 euros. No caso de filhos com cancro, o subsídio vai aumentar para 100% da remuneração, sem qualquer limite máximo.

Fonte: Público

quarta-feira, 19 de novembro de 2025

Dificuldades de leitura: um problema que exige resposta imediata nas escolas

Segundo um artigo de Andreia Sanches, um estudo recente que avaliou mais de 92 mil alunos do 2.º ano do ensino básico revela que cerca de um quarto das crianças apresenta dificuldades de leitura. O mesmo estudo indica que os rapazes obtêm resultados superiores às raparigas e que os alunos das escolas privadas têm desempenhos melhores do que os das escolas públicas. Estes dados, porém, exigem uma leitura cuidada, pois refletem realidades educativas, sociais e estruturais que vão muito além da performance imediata dos alunos.

A perceção de que os rapazes são melhores na leitura não corresponde ao que a investigação internacional revela: de forma consistente, as raparigas superam os rapazes na competência leitora. As diferenças encontradas no estudo podem resultar de fatores como preconceito de género na avaliação, maior encaminhamento de rapazes devido a comportamentos perturbadores ou ainda práticas educativas que favorecem determinados perfis de desempenho. Outro fator possível é a recente transição dos testes em papel para formatos digitais, que alguns estudos sugerem poder beneficiar os rapazes em determinadas tarefas, alterando assim os padrões habituais de desempenho.

Também a diferença entre escolas públicas e privadas não deve ser interpretada de forma linear. A investigação mostra que uma parte importante do desempenho mais elevado nas escolas privadas resulta da composição social mais favorecida do seu corpo discente. Alunos provenientes de contextos socioeconómicos mais elevados tendem, por razões multifatoriais, a apresentar melhores resultados escolares, independentemente da eficácia pedagógica da escola que frequentam. Assim, a homogeneidade social mais elevada das escolas privadas contribui para elevar os seus resultados médios. Isto significa que, em muitos casos, mesmo que a sua eficácia pedagógica não seja superior à das escolas públicas, os alunos das escolas privadas continuam a apresentar desempenhos elevados devido às condições socioeconómicas e culturais de origem.

Um outro fator a considerar é o de que uma parte significativa das dificuldades de leitura observadas no estudo pode relacionar-se com as dificuldades de aprendizagem específicas (DAE). Estas desordens de origem neurobiológica são permanentes e afetam cerca de 15% das crianças em idade escolar, atingindo 5% nos casos mais severos, o que corresponde, no nosso país, a cerca de 50 mil alunos. As DAE afetam o processamento da informação, interferindo na receção, integração e expressão de estímulos visuais, auditivos, linguísticos ou motores. A literatura é clara: quanto mais precoce for a identificação — idealmente no final do 1.º ou 2.º ano— mais eficaz é a intervenção, podendo permitir que 75 a 90% destes alunos atinjam níveis de sucesso idênticos aos dos colegas sem DAE.

A falta de recursos especializados, a formação limitada de docentes e outros agentes educativos, lacunas legislativas e a perceção insuficiente de alguns pais sobre a relevância destas intervenções reforçam esta vulnerabilidade. As dificuldades de leitura nos primeiros anos tendem a condicionar a aprendizagem em todas as disciplinas, afetar a autoestima e a motivação e limitar oportunidades académicas e profissionais futuras.

Neste contexto, os resultados do estudo não surpreendem. Revelam tanto a iniquidade do sistema como a incapacidade estrutural de garantir respostas eficazes e equitativas. A leitura é muito mais do que um indicador escolar: é a base para o desenvolvimento intelectual e cívico. Garantir que todas as crianças aprendem a ler bem, no tempo certo, é uma responsabilidade coletiva — e urgente. O país não pode continuar a aceitar que dezenas de milhares de crianças vejam o seu potencial comprometido por falhas evitáveis do sistema.

Luís de Miranda Correia

Fonte: Público em acesso livre

7.ª Edição ROMA Educa | Candidaturas abertas

O período de candidaturas ao Programa ROMA Educa abriu esta quarta-feira, dia 19 de novembro de 2025, prolongando-se até ao dia 12 de dezembro, às 18 horas.

Sendo a educação considerada um pilar básico para o desenvolvimento pessoal e para a integração social das pessoas ciganas, a Agência para a Integração e Asilo, I.P., lança a 7.ª edição do programa ROMA Educa, que visa atribuir 210 bolsas de estudo para o apoio à frequência e permanência do 3.º ciclo do ensino básico e ensino secundário de estudantes provenientes das comunidades ciganas, no ano letivo de 2025/2026.

Podem aceder a este programa estudantes provenientes de comunidades ciganas, residentes em território nacional, que estejam matriculados/as e a frequentar o 3.º ciclo do ensino básico (7.º, 8.º e 9.º ano de escolaridade) ou o ensino secundário (10.º, 11.º ou 12.º ano de escolaridade), ou ainda curso equiparado a estes níveis de ensino (com exceção dos cursos do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) e Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências Escolares (RVCC)) e que tenham até 23 anos de idade, inclusive, à data da apresentação da candidatura

As candidaturas devem ser apresentadas até ao dia 12 de dezembro, às 18 horas, através do preenchimento e submissão do formulário online e dos restantes documentos previstos no número 1 do artigo 10.º do Regulamento:

a) Documento comprovativo da matrícula no 3.º ciclo do ensino básico (7.º, 8.º e 9.º anos de escolaridade) ou no ensino secundário (10.º, 11.º ou 12.º anos de escolaridade), ou ainda em curso equiparado a estes níveis de ensino, relativamente ao ano letivo 2025/2026;

b) Carta de motivação para a frequência do Programa ROMA Educa, redigida por cada candidato/a, na qual deverá ser demonstrada a sua proveniência de comunidades ciganas (sem modelo definido);

c) Declaração de compromisso, na qual ficarão expressas as obrigações a que os/as bolseiros/as se comprometem por força da atribuição das bolsas de estudo (anexo do Regulamento, disponível no site da candidatura).

Qualquer candidatura que não seja acompanhada de todos os documentos que a instruem poderá ser excluída do processo de análise.

O formulário encontra-se disponível em: https://dsroma.limesurvey.net/645316?lang=pt

Documentação e mais informação em: https://aima.gov.pt/pt/noticias/roma

Para qualquer esclarecimento: roma@aima.gov.pt

terça-feira, 18 de novembro de 2025

Saúde Mental/Suicídio: É necessário «mais pele real» e menos «pele virtual» nas relações, afirma Vítor Cotovio


O psiquiatra Vítor Cotovio afirmou que é necessário “mais pele real” nas relações para prevenir depressões e tentativas de suicídio, lembrando que “o que funciona melhor é o que está interligado”.

“Esta ligação, esta interceção, este carácter sistémico de olhar para o problema e ajudar a resolver faz com que as coisas sejam mais bem-feitas”, disse o diretor do Departamento Clínico e Técnico Assistencial do Instituto de São João de Deus, esta segunda-feira, em entrevista à Agência ECCLESIA.

Vítor Cotovio considera que se vai tendo a “sensibilidade de valorizar a importância da saúde mental” nas suas várias vertentes e naquilo que são as suas “consequências mais complicadas”, nomeadamente a “ideação suicida, tentativas de suicídio, ou suicídio”.

“Sabemos que o suicídio ocorre mais nas pessoas que tenham uma doença psiquiátrica de base, não quer dizer que ocorra só, nomeadamente as depressões. A depressão é uma doença de muitos ‘d’s: depressão, desespero, desalento, desesperança, desvalor, desistências”, explicou o psiquiatra e psicoterapeuta.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, todos os anos, cerca de 720 mil pessoas tiram a própria vida; mais de metade dos suicídios globais (56%) ocorre antes dos 50 anos, sendo particularmente afetada a faixa etária dos 15 aos 29 anos.

O tema da prevenção do suicídio foi lembrado pelo Papa Leão XIV, no apelo que faz no vídeo deste mês de novembro, na apresentação da intenção mensal de oração.

Para Vítor Cotovio, é necessário garantir “atempadamente que as pessoas possam ter o apoio necessário”, desde o apoio que cada um poderia “garantir aos outros, se a vida não fosse tão acelerada”, se cada um fosse mais disponível, “e não houvesse tanta pele virtual e mais pele real”.

Vítor Cotovio acrescentou, neste contexto, que ‘pele’ é “presença, escuta, ligação/laços, empatia/esperança”, e alertou para os riscos de “uma comunidade virtual não filtrada”, porque qualquer jovem tem “uma necessidade enorme de pertença”, e os grupos com que ele se cruza nas redes sociais podem desvirtuar “a essência das coisas”, porque “ele escolhe pertencer mesmo que corra riscos”.


Se é verdade que não devemos endeusar as tecnologias digitais, também é verdade que não as devemos diabolizar, mas, atenção, este equilíbrio é fundamental. Os pais, os professores não podem passar procuração às tecnologias digitais naquilo que é o processo educacional.”

O Papa Leão XIV convocou as comunidades católicas a um esforço conjunto na prevenção do suicídio, na sua intenção de oração para este mês de novembro, e pede que as pessoas saibam estar próximas, “com respeito e ternura, ajudando a curar feridas, criar laços e abrir horizontes”.

O diretor do Departamento Clínico e Técnico Assistencial do Instituto de São João de Deus destacou a expressão “muito interessante” do Papa para ‘criar laços e abrir horizontes’, porque é “fundamental”, quando se refere aos jovens, que precisam “de presença e de pertença”.

Na entrevista transmitida no programa ECCLESIA desta segunda-feira, 17 de novembro, Vítor Cotovio explicou que “não é incompatível” ter a ajuda espiritual de um sacerdote e também a de um terapeuta.

Fonte: Agência Ecclesia por indicação de Livresco

sábado, 15 de novembro de 2025

Mariana é médica, surda e a primeira nativa de língua gestual no SNS

Mariana Couto Bártolo nunca ouviu um som na vida. A surdez passou despercebida quase até aos dois anos, mas o diagnóstico foi contundente: “Surdez neurossensorial profunda.” Aos 29 anos, é médica interna no ano comum de formação – é médica com surdez profunda desde que nasceu e a primeira falante nativa de língua gestual portuguesa no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Diz que ser surda lhe dá “uma sensibilidade e uma maneira diferente de observar os doentes”.

A médica, nascida em Setúbal e criada em Lisboa, conseguiu “mascarar” a surdez até aos dois anos – “vivia numa casa antiga com soalho de madeira e, quando sentia as vibrações, do chão virava-me” —, mas foi denunciada pelo ladrar de um cão: “Na creche havia um cão que ladrava sempre que os pais iam buscar as crianças”, recorda. Todas as crianças reagiam quando ouviam o cão, excepto Mariana, que continuava absorta nas suas brincadeiras.

Ironicamente (ou não), o seu primeiro sonho foi ser médica veterinária. Só no 9.º ano é que mudou de ideias, depois de uma professora de Matemática lhe ter “plantado a semente” da Medicina. “Esta professora perguntou-me por que é que eu não considerava ser médica e ajudar outras pessoas surdas”, lembra. E assim foi.

O percurso até lá chegar foi “desafiante”. Em conversa com o P3, lembra que as barreiras tiveram de ser ultrapassadas com “criatividade”, mesmo no curso de Medicina da Universidade Nova de Lisboa. As aulas tinham de ser “gravadas e transcritas” em conjunto com os colegas, que também reviam “o conteúdo cientificamente”.

O exame oral da “temível cadeira de Anatomia” foi outro dos momentos que lhe ficaram na memória: o professor não acedeu ao pedido de uma avaliação por escrito. “Não por discriminação”, ressalva, mas porque achou que reunia condições para a prova oral.“No dia do exame estava muito assustada, sobretudo porque não me ia expressar de uma forma que é natural para mim — tenho voz de surda”, confessa.

“Deaf gain”

Foi com esforço (e uma boa dose de criatividade) que chegou ao consultório. Hoje, admite, a comunicação com os doentes pode tornar-se desafiante, mas isso não a assusta: “Ao longo de toda a minha vida sempre me adaptei aos outros, tentando várias formas de comunicar até me entenderem”.

“Começo pela via oral, esclarecendo que sou surda e que faço leitura labial. Se me compreenderem e eu a eles, o que acontece na maioria dos casos, o atendimento prossegue assim”, exemplifica. Quando a comunicação não é clara, escrever num papel ou no computador as perguntas que precisa de ver esclarecidas é a estratégia que usa.

No contacto com os doentes, acredita que a surdez a dotou de uma “sensibilidade” e forma de observar as pessoas e a sua expressão facial que se revela muito útil. Explica que na comunidade surda existe o conceito de deaf gain, que alude à surdez não como uma deficiência, mas como algo positivo e vital para a diversidade humana, o “reconhecimento e valorização das experiências e habilidades únicas das pessoas surdas”, esclarece Mariana.

Ainda há quem acredite que Mariana não pode “exercer qualquer especialidade, especialmente as que envolvem muita comunicação”, mas a médica rejeita essa opinião: são “barreiras impostas pela sociedade e pelo que é considerado a norma” e que podem ser facilmente ultrapassadas, especialmente com o recurso à tecnologia.

“Tenho as mesmas responsabilidades do que qualquer outro colega no mesmo patamar e cumpro as minhas funções com rigor.”

A língua gestual como primeira língua

A principal diferença surge quando, à sua frente, encontra alguém que também é surdo. É a primeira médica falante nativa de língua gestual portuguesa e, na comunicação com doentes surdos (especialmente nos casos mais complexos de doentes oncológicos ou internamentos psiquiátricos), já teve um papel essencial.

“A informação, transmitida com clareza, pode ser um factor determinante para a forma como os doentes surdos controlam e encaram o seu estado de saúde”, acredita. “Ainda há um longo trabalho por fazer” no SNS para que as pessoas surdas “possam ter acesso universal à saúde”, admite.

Essa diferença sente-se não apenas no acesso à saúde, mas também no acesso à educação. Depois de ter passado os primeiros anos de formação no Instituto Jacob Rodrigues Pereira (com ensino especializado para crianças surdas), a médica escolheu o ensino regular e chegou a ter “algumas horas de aulas por semana com recurso a intérpretes de língua gestual portuguesa”. Contudo, Mariana descobriu que “não gostava desse tipo de comunicação”, por ver o intérprete como um “intermediário”.

Preferindo sempre uma comunicação directa com as pessoas, optou, a partir do 9.º ano, por não ter intérprete nas aulas e esclarecer as suas dúvidas directamente com os professores.

Para ela, um ensino verdadeiramente eficaz para crianças surdas, que se equipare ao de crianças ouvintes, “tem de incluir o bilinguismo o mais precocemente possível”. É através da exposição constante, “tanto na escola como em casa”, com o português escrito e com a língua gestual portuguesa enquanto língua materna que as crianças surdas conseguem “ter um bom contacto com o mundo que as rodeia” e atingir o mesmo nível de aproveitamento escolar “que as demais crianças”, refere Mariana Bártolo. (...)

Continuação da notícia em Público com acesso livre

sexta-feira, 14 de novembro de 2025

Ciclo de Webinars 'Educação Inclusiva: um desafio permanente' (CNE)

O Conselho Nacional de Educação (CNE) está a realizar um Ciclo de Webinares, no âmbito das atividades da 5.ª Comissão Especializada Permanente Democratização e Desigualdades Educativas, da qual é Conselheiro o Professor David Rodrigues.

O Ciclo de Webinars tem como tema 'Educação Inclusiva: um desafio permanente' e como objetivo discutir a implementação da educação inclusiva e os desafios que ainda permanecem. Também se enquadra na discussão sobre os valores e práticas vigentes em escolas portuguesas no contexto da educação inclusiva.  

Estes webinars focam-se em três aspetos críticos da melhoria da educação inclusiva nas escolas e são transmitidos no canal de Youtube do CNE, onde podem ser (re)vistos:

  • A organização da escola para a inclusão ----- 22/10 - Pode ser (re)visto AQUI
  • A rentabilização de recursos --------------------- 05/11 - Pode ser (re)visto AQUI
  • formação de docentes ----------------------------- 12/11 - Poderão assistir AQUI

Fonte: Pró-Inclusão

quinta-feira, 13 de novembro de 2025

Sala Inclusiva estreou este ano letivo para garantir acessibilidade e momentos de sossego


O que em tempos era a Sala de Acesso Adaptado à Informação estreou, no início deste ano letivo, como Sala Inclusiva. O local é o mesmo de sempre e, como anos anteriores, continua situado dentro do espaço de Biblioteca, no edifício C4 da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (CIÊNCIAS). Mas há alterações a registar: a renovada Sala Inclusiva arrancou com o funcionamento após uma atualização de equipamentos e aplicações informáticas que facilitam o estudo por parte de quem tem limitações visuais ou motoras. Além disso, a renovada sala passou a contar com um espaço resguardado para quem, por algum motivo, precise de fazer uma pausa a meio das rotinas diárias.

“Esta sala pode ser usada por qualquer pessoa da nossa comunidade académica que precise um local seguro e confortável”, descreve Cláudio Pina Fernandes, coordenador do Gabinete de Apoio Psicológico (GAPsi) de CIÊNCIAS. “Vamos ter pessoas que vêm aqui por causa dos equipamentos e pessoas que procuram apenas um lugar resguardado. Neste último caso, tanto podemos encontrar alguém que está diagnosticado dentro do espectro do autismo, como podemos ter alguém que sofreu de um ataque de ansiedade ou recebeu uma muito má notícia, por exemplo”, acrescenta o responsável do GAPsi.

Na Sala Inclusiva há quatro postos de trabalho preparados para receberem qualquer utilizador com necessidades específicas, incluindo utilizadores de cadeira de rodas. Três desses postos têm equipamentos adaptados para que pessoas com limitações visuais ou motoras possam desenvolver o seu trabalho. E há ainda um quarto posto de trabalho que pode ser usado por quem traz equipamento de casa. O espaço conta ainda com cacifos para os utilizadores da sala poderem deixar algum equipamento ou material de estudo no dia-a-dia. Ao fundo da sala, há ainda um espaço recolhido, com um cadeirão, para quem precisa de algum resguardo.

“É um espaço que pode ser útil para ajudar pessoas que estão a passar por situações de sobre-estímulo de luzes ou sons, por exemplo”, refere Madalena Pintão, psicóloga do GAPsi. “Além da renovação de equipamentos, alterámos a organização do espaço para podermos responder às mais variadas necessidades dos estudantes”, acrescenta a psicóloga do GAPsi.

Todos os membros da comunidade académica podem usar a Sala Inclusiva, mediante solicitação aos serviços da biblioteca. “Esta sala dispõe de equipamento complexo e oneroso, que implica conhecimentos para poder ser usado. Além disso, a ideia é ter um espaço resguardado que garanta centralidade dentro de CIÊNCIAS”, conclui Cláudio Pina Fernandes.

Fonte: Universidade de Lisboa, por indicação de Livresco

quarta-feira, 12 de novembro de 2025

29% das crianças apresentam problemas audiológicos em idade pré-escolar, revela estudo da ESTeSC-IPC


Um estudo realizado pela Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Politécnico de Coimbra (ESTeSC-IPC) revelou que 29% das crianças apresentam problemas audiológicos à entrada para o 1º Ciclo do Ensino Básico. Os dados reforçam a importância da realização de rastreios em idade pré-escolar, uma vez que as dificuldades auditivas podem ter impacto significativo na aprendizagem da leitura e da escrita.

O estudo “Preschool Hearing Screening: Nineteen Years of the Coração Delta Project in Campo Maior, Portugal”, publicado na revista Audiology Research, analisa os resultados de dezanove anos de rastreios audiológicos realizados por docentes e estudantes da ESTeSC-IPC em Campo Maior, ao abrigo de um protocolo com a associação Coração Delta. Durante este período, foram realizados rastreios a 1068 crianças, com idades entre os cinco e os seis anos. Dessas, 310 (29 por cento) apresentaram algum tipo de problema audiológico. As ocorrências mais frequentemente registadas foram alterações no timpanograma, manifestadas unilateralmente em 104 crianças (9,7%) e bilateralmente em 81 crianças (7,6%).

“Embora os rastreios auditivos neonatais estejam largamente implementados em Portugal, a prevalência de alterações auditivas quase duplica em idade pré-escolar”, explica Margarida Serrano, docente da ESTeSC-IPC e coordenadora do estudo (que conta também com a participação da docente da ESTeSC-IPC, Cláudia Reis, e dos estudantes de licenciatura em Audiologia, Joana Pereira, Joana Teixeira, João Mendes e Mariana Pereira). A investigadora explica que estas alterações podem manifestar-se através de perda de audição (que se revela tardiamente) ou de uma sensação de “som abafado” e longínquo, provocada pela presença de secreções no ouvido médio.

Estas disfunções dificilmente são detetadas por pais e professores, mas podem ter um impacto negativo na aprendizagem escolar. “No processo de aprendizagem da leitura, é essencial ter uma audição clara”, frisa Margarida Serrano, acrescentando que “a deteção precoce destes problemas é essencial para um desempenho académico de sucesso”.

Cerca de 91% das crianças observadas pelo otorrinolaringologista no local do rastreio foram encaminhadas para uma avaliação hospitalar formal, uma vez que foram confirmadas patologias ou necessidades de saúde que exigiam intervenção médica.

“Estes dados demonstram, uma vez mais, a importância da realização de rastreios audiológicos em cuidados de proximidade”, frisa Margarida Serrano, lembrando o impacto que as dificuldades audiológicas não detetadas podem representar a longo prazo. “Um estudo recentemente publicado na revista Lancet mostra que a baixa literacia é o principal fator de risco de declínio cognitivo em idade jovem”, aponta. “O papel do audiologista é fundamental para despistar eventuais problemas audiológicos, que comprometem a aprendizagem à entrada no ensino básico e, consequentemente, a capacidade cognitiva no futuro”, defende.

Desde 2007 que, anualmente, a ESTeSC-IPC colabora com a associação Coração Delta, realizando rastreios audiológicos a todas as crianças que ingressam no 1º ano de escolaridade no concelho de Campo Maior. O protocolo prevê a realização de três avaliações: otoscopia (para analisar a presença de cerúmen), timpanograma (para avaliar a membrana timpânica e o ouvido médio) e rastreio de audição. Todas as crianças que apresentam algum tipo de desvio são, imediatamente, observadas por um otorrinolaringologista, presente no local.

Fonte: Beira Digital TV por indicação de Livresco

terça-feira, 11 de novembro de 2025

Educação Inclusiva: um caminho de colaboração

A educação inclusiva é um desafio e, ao mesmo tempo, uma oportunidade de construir escolas mais justas e acolhedoras para todos. Um dos principais desafios deste processo é a adaptação do currículo, de modo a responder às necessidades individuais de cada aluno. É aqui que o professor de educação especial desempenha um papel crucial, identificando as alterações necessárias para apoiar o desenvolvimento de cada criança, independentemente das suas competências ou dificuldades.

Hoje, o paradigma da inclusão reconhece que o professor do ensino regular é um agente ativo e responsável por todos os alunos, contando com o apoio do professor de educação especial para definir estratégias adequadas. Esta colaboração permite criar atividades diversificadas, que estimulam diferentes formas de aprendizagem e promovem a participação de todos, tornando o processo educativo mais justo e eficaz.

A planificação de aulas inclusivas permite que todas as crianças se sintam envolvidas e valorizadas. Por exemplo, os professores podem recorrer a material adaptado, como textos em formatos diferentes (simplificados ou com pictogramas), atividades práticas em grupo que respeitem diferentes ritmos de aprendizagem ou tarefas que permitem que cada aluno avance ao seu próprio ritmo. Outra estratégia eficaz é a diversificação de métodos de ensino, combinando explicações orais, recursos visuais, jogos educativos e atividades digitais, de forma a atingir vários estilos de aprendizagem.

Mais do que ensinar conteúdos, os professores trabalham para criar um ambiente seguro e emocionalmente acolhedor, onde cada criança se sinta apoiada. A colaboração entre os profissionais da educação envolve não apenas a adaptação do currículo e da avaliação, mas também a promoção do bem-estar emocional dos alunos. Quando os professores atuam de forma coordenada, conseguem identificar dificuldades precocemente, reforçar a autoestima das crianças e criar estratégias que favoreçam o sucesso de todos.

Além das adaptações curriculares, também a avaliação deve ser ajustada, tendo em conta as diferentes formas de aprender. Avaliar não é apenas medir conhecimentos é, sobretudo, compreender o progresso de cada aluno e perceber se as estratégias usadas estão a resultar. Para que cada aluno possa evoluir, é necessário que a avaliação seja flexível, adaptada às necessidades e ao ritmo de aprendizagem de cada criança. Os professores podem usar avaliações diferenciadas, como trabalhos práticos, apresentações orais, portefólios ou autoavaliações, adaptando os critérios às necessidades de cada aluno. Estas estratégias permitem reconhecer e valorizar os esforços de todos, promovendo motivação e autoestima.

Outro aspeto essencial é a sensibilização para a diferença. As crianças devem aprender desde cedo a compreender e aceitar que todos somos diferentes e que é essa diversidade que enriquece a escola e a sociedade. Os alunos devem compreender que cada pessoa é única e que a inclusão beneficia toda a comunidade escolar. Este processo ajuda a construir um ambiente de respeito, empatia e cooperação, onde cada criança se sente aceite e valorizada pelo que é. Professores podem implementar dinâmicas de grupo, debates e atividades colaborativas criando uma comunidade escolar mais inclusiva e acolhedora.

Para que a inclusão seja uma realidade em todas as escolas, é fundamental que os profissionais da educação invistam na formação contínua. Através da aprendizagem e da partilha de experiências, os professores conhecem novas metodologias, exploram recursos e encontram estratégias eficazes para promover a participação de todos. Este investimento permite que todos os alunos tenham acesso a oportunidades iguais de aprendizagem, independentemente das suas características ou dificuldades.

Em suma, a verdadeira inclusão constrói-se em equipa através da colaboração e do compromisso conjunto dos professores. A articulação entre professores de educação especial e de ensino regular, a adaptação curricular, a avaliação diferenciada, a sensibilização para a diversidade e a formação contínua são pilares que tornam a escola um espaço de aprendizagem, respeito e desenvolvimento para todos os alunos.

Quando todos os profissionais trabalham em equipa, constroem-se verdadeiras pontes para a inclusão, permitindo que cada criança encontre o seu lugar, desenvolva todo o seu potencial e sinta orgulho de pertencer à comunidade escolar.

Inês Ferraz

Fonte: Público por indicação de Livresco

domingo, 9 de novembro de 2025

Regulamento do Estatuto do Estudante com Necessidades Educativas Específicas da Universidade de Aveiro

O Regulamento n.º 1220/2025, de 7 de novembro, cria o Regulamento do Estatuto do Estudante com Necessidades Educativas Específicas da Universidade de Aveiro.

1 - O presente Regulamento estabelece a disciplina aplicável aos estudantes com necessidades educativas específicas da Universidade de Aveiro, abreviadamente designadas por NEE, entendendo-se como estudante com NEE, os que apresentam dificuldade no processo de aprendizagem e participação no contexto académico, decorrentes da interação dinâmica entre fatores ambientais, como fatores físicos, sensoriais, sociais ou emocionais e ou limitações auditivas, visuais, motoras e de saúde física ou mental, e que comprometem a atividade e participação em condições de equidade e igualdade com os demais estudantes.

2 - As NEE podem ser caracterizadas como permanentes ou temporárias, sendo que, para as temporárias, as medidas expressas no presente Estatuto produzem efeitos apenas durante o período em que se verifiquem as necessidades, nomeadamente durante o período de situação de risco clínico durante a gravidez, cirurgias e pós-operatório.

3 - Enquadram-se ainda neste Estatuto os estudantes com doenças de longa duração, associadas a tratamento periódicos e frequentes e ou a tratamentos agressivos, designadamente radioterapia, quimioterapia, que os coloquem, em termos de desempenho académico numa situação desfavorável.

Rúben tem autismo e não o deixam ir à escola. “Está a perder competências”

Em Setembro, Rúben Silvestre, um adolescente de 16 anos que tem uma perturbação do espectro do autismo, foi conhecer aquela que devia ser a sua nova escola: o Estabelecimento de Educação Especial da Associação Portuguesa para as Perturbações do Desenvolvimento e Autismo – APPDA de Lisboa. "Gostou muito", conta Inês Neto, a directora pedagógica que o conhece "desde pequenino". Mas depois disso não voltou. "O meu filho está em casa, sem acesso ao que tem direito: educação escolar", lamenta o pai, Bruno Silvestre.

A razão? Uma "pescadinha de rabo na boca": os serviços do Ministério da Educação alegam que no processo de inscrição de Rúben não havia provas de que ele teria transporte para a escola, por isso informou que pretendia indeferir o pedido de ingresso na APPDA; a família diz que só pode tratar do transporte nos serviços da câmara quando tiver a confirmação da matrícula, mas que, de qualquer modo, ela própria pode transportar o filho o tempo que for preciso; o tempo passa, e o ministério não responde. (...)

Continuação da notícia em Público, por indicação de Livresco

sexta-feira, 7 de novembro de 2025

A importância da Educação Especial na construção de uma sociedade inclusiva

A Educação Especial ocupa um espaço central no debate sobre os direitos humanos e sobre a qualidade da educação em sociedades democráticas. Ao longo da história, as pessoas com deficiência foram marginalizadas, tratadas como incapazes ou relegadas ao convívio apenas familiar, sem acesso aos espaços de escolares. Essa exclusão, além de injusta, reforçou preconceitos e contribuiu para a perpetuação da desigualdade social. É justamente contra esse cenário que a educação especial se mostra imprescindível, pois, não só assegura o direito a aprender, mas também promove uma transformação cultural que valoriza a diversidade humana.

É fundamental reconhecer que a educação especial não deve ser encarada como um privilégio concedido a um grupo específico, mas sim como a materialização do princípio da equidade. Enquanto a igualdade procura oferecer as mesmas condições a todos, a equidade dita o que cada pessoa necessita de recursos diferenciados para alcançar oportunidades semelhantes. Nesse sentido, a educação especial garante que as barreiras físicas, pedagógicas ou discriminatórias, sejam eliminadas ou minimizadas, assegurando a plena participação do estudante no processo de ensino.

A falta de professores com a formação adequada, a carência de recursos pedagógicos e tecnológicos, e a insuficiência de investimentos públicos ainda limitam a efetividade das práticas inclusivas. Ainda há escolas em que a inclusão se restringe ao espeto físico, o aluno com deficiência está presente em sala de aula, mas não recebe os apoios necessários para aprender de forma significativa. Esse cenário revela a urgência de repensar políticas públicas que garantam não apenas o acesso, mas também a permanência e o sucesso escolar desses estudantes.

Do ponto de vista social, a educação especial desempenha um papel estratégico, ao favorecer a convivência entre alunos com habilidades diferentes, promovendo a empatia, o respeito e a valorização da diversidade. As crianças e jovens que crescem em ambientes inclusivos tendem a tornar-se adultos mais conscientes da importância da igualdade de direitos e mais preparados para construir relações sociais pautadas pela solidariedade. Trata-se, portanto, de um processo que extrapola os limites da escola e impacta diretamente a qualidade da vida democrática.

Por outro lado, é preciso combater a visão redutora de que a Educação Especial se resume a adaptações curriculares ou ao uso de tecnologias de apoio. Mais do que isso, a educação especial deve ser compreendida como uma prática pedagógica que reconhece cada estudante como uma pessoa com direitos, potencialidades e trajetórias singulares de aprendizagem. Isso implica um compromisso ético e político de toda a comunidade escolar, romper com padrões exclusivos e promover condições de participação plena para todos.

Em suma, a educação especial é indispensável, não apenas para atender às necessidades das pessoas com deficiência, mas também para consolidar uma educação inclusiva que beneficie toda a sociedade. Ao investir em políticas consistentes, formação de docentes, recursos adequados e valorização da carreira dos docentes nesta área, o Estado contribui para a construção de uma escola que acolhe as diferenças e forma cidadãos mais críticos, justos e solidários. Não podemos continuar a ignorar a importância da educação especial na nossa sociedade.

Uma sociedade que se pretende democrática não pode abrir mão da diversidade, muito pelo contrário, deve reconhecê-la como uma das suas maiores riquezas. Nesse sentido, defender a Educação Especial é, acima de tudo, defender a dignidade humana e o direito universal à educação.

Fernando Camelo de Almeida

Fonte: SOL por indicação de Livresco

Ler para escrever, escrever para ler

Introdução

Investigadores como Kim e colaboradores (2024) têm sublinhado a importância de incluir a escrita na Ciência da Leitura. Estes autores têm defendido especificamente que a Ciência da Leitura se encontra incompleta sem a Ciência da Escrita. Porquê? A resposta a esta questão é muito simples. Décadas de investigação mostram a interdependência entre as habilidades de leitura e escrita (Graham et al., 2021; Katusic et al., 2009; Kim et al., 2024). O que isto significa exactamente? Ler e escrever não são processos autónomos. Constituem duas aptidões que se desenvolvem de forma simultânea, influenciando-se e complementando-se mutuamente. A título de exemplo, a leitura beneficia o desenvolvimento de diversas competências fundamentais para uma escrita clara e eficaz, como o vocabulário, o conhecimento gramatical e a compreensão das estruturas textuais. Por sua vez, a escrita consolida o conhecimento do significado das palavras, o domínio das regras gramaticais e a capacidade de compreender e organizar textos de forma lógica, dando origem a um ciclo de aprendizagem que beneficia tanto a leitura quanto a escrita.

De acordo com o Modelo de Literacia Interactiva e Dinâmica (Kim, 2020; figura 1), a leitura e a escrita baseiam-se essencialmente nas mesmas habilidades, a saber:

Habilidades de literacia lexical: referentes à capacidade de reconhecer, compreender e produzir palavras de forma eficiente. Estas competências envolvem processos cognitivos essenciais para a leitura e escrita, tais como a codificação, o armazenamento e a recuperação de informações relacionadas com a fonologia (sons), a ortografia (a forma escrita) e a semântica (significado) das palavras.

Habilidades de literacia discursiva: envolvem a capacidade de compreender e produzir textos coesos e coerentes. Segundo Kim (2020), estas habilidades baseiam-se nas habilidades lexicais, embora também dependam do domínio do vocabulário, das regras gramaticais e das estruturas sintáticas, além de exigirem conhecimento prévio e competências cognitivas de nível superior, como a capacidade de estabelecer inferências.

Habilidades de linguagem oral: habilidades como o vocabulário e as competências sintáticas são essenciais para analisar a informação linguística e construir uma representação mental do texto (isto é, compreendê-lo). Além disso, as competências de linguagem oral são fundamentais para expressar e comunicar as ideias do texto de forma clara e coerente.

Capacidades cognitivas de nível superior: As capacidades cognitivas de nível superior permitem estabelecer conexões entre as proposições do texto e o conhecimento prévio dos leitores, assim como associar as diferentes partes do texto para estabelecer inferências e preencher lacunas de informação. Neste sentido, estas exercem um papel fundamental na organização das ideias do texto de forma lógica e coerente.

Auto-regulação: Segundo Kim (2020), a leitura e a escrita dependem da auto-regulação, que envolve a capacidade de monitorizar e controlar os processos cognitivos. Leitores auto-regulados conseguem estabelecer metas, monitorizar a compreensão do texto e ajustar estratégias de leitura conforme necessário. Da mesma forma, escritores auto-regulados destacam-se na definição de objectivos, planeamento, auto-avaliação, monitorização, mantendo a atenção e a persistência, além de usar estratégias adequadas de escrita.

Conhecimento de conteúdo e discursivo: O conhecimento de conteúdo ajuda a integrar as informações do texto e a construir uma representação mental sólida, que facilita a compreensão. Além disso, fornece material para a escrita e permite um acesso mais rápido ao conteúdo. Por sua vez, o conhecimento discursivo envolve a compreensão das estruturas textuais e das características linguísticas associadas, assim como os procedimentos e estratégias para a produção de texto. Conhecer a estrutura textual facilita a identificação de informações relevantes e a compreensão das relações entre as partes do texto. Na escrita, esse conhecimento, frequentemente denominado «conhecimento de estrutura de género», ajuda a organizar e apresentar ideias de forma coerente, alinhada com o género e os objectivos de escrita.

Competências sócio-emocionais: As competências sócio-emocionais, como crenças, sentido de auto-eficácia e motivação, influenciam a forma como os leitores se envolvem com a leitura e a escrita. Estas afectam diretamente a disposição dos alunos para aprender, perseverar perante as dificuldades e acreditar na sua capacidade de progredir. Por exemplo, um aluno motivado tende a envolver-se mais activamente nas tarefas, o que frequentemente se traduz em melhor desempenho, tanto na leitura como na escrita.

Neste sentido, a literatura científica sobre a leitura e a escrita indica que estas habilidades não devem ser ensinadas de forma isolada, mas sim de maneira integrada. Mais especificamente, a investigação revela que o ensino integrado da leitura e da escrita proporciona oportunidades significativas de aprendizagem, promovendo um desenvolvimento equilibrado e eficaz em ambas as áreas.
Estudo de Kim e colaboradores (2024)

Kim e colaboradores (2024) analisaram o impacto de um programa de instrução (SRSD1 Plus) focado no ensino integrado da leitura e escrita, na aprendizagem de alunos do primeiro e do segundo ano. O estudo envolveu a participação de 10 professores e 232 alunos de quatro escolas localizadas no sudoeste dos Estados Unidos.


Figura 1. Modelo de literacia interactiva e dinâmica (Kim, 2020)


Os alunos foram distribuídos em dois grupos: o grupo de intervenção, que foi exposto ao programa SRSD Plus, e o grupo de controlo, que manteve as práticas de ensino habituais. O programa foi composto por duas componentes: a componente de ensino da leitura e escrita, baseada no modelo SRSD (componente A), e a componente Plus (componente B). A estrutura, conteúdos e métodos de ensino abordados no programa estão apresentados na tabela 1.

Tabela 1. Estrutura, conteúdos e métodos de ensino do programa SRSD Plus


Os alunos foram avaliados antes e após a administração do programa SRSD Plus em três eixos diferentes:

1) Composição escrita de textos informativos e expositivos, incluindo:
  • Qualidade da escrita: Extensão e clareza no desenvolvimento e organização das ideias;
  • Produtividade/comprimento do texto: Número de palavras escritas;
  • Planeamento: (a) planeamento da composição (i.e., medida em que o texto elaborado na folha de planeamento foi incorporado na composição final); (b) número de ideias relevantes; (c) organização estrutural das ideias do texto; (d) notas organizacionais (e.g., numeração, setas, símbolos e mnemónicas).
2) Conhecimento discursivo, a partir das seguintes questões:
  • «O que fazem os bons escritores quando escrevem?»;
  • «Porque achas que algumas crianças têm dificuldade em escrever?»;
  • «Quando te pedem para escrever um texto para a aula ou como trabalho de casa, o que podes fazer para planear e redigir o texto?»;
  • «Quando escreves, pensas se o teu professor vai conseguir entender o que escreveste?»;
  • «Quando escreves, pensas se os teus amigos vão conseguir entender o que escreveste?»;
  • «Por que razão as crianças escrevem?»;
  • «Por que razão os adultos escrevem?»;
  • «Quando escreves, relês o que escreveste? Se sim, porque o fazes?»;
  • «Imagina que o teu amigo tem de escrever um texto informativo para uma aula. O que lhe dirias sobre as partes que um texto informativo deve ter?»;
  • «O que mais dirias aos teus amigos sobre o que é importante considerar ao escrever um texto informativo?».
3) Competências de linguagem oral, transcrição e leitura de palavras, nomeadamente:
  • Vocabulário: definição de palavras;
  • Proficiência na organização ou combinação de frases;
  • Soletração de palavras (proximais, quase distais e distais);
  • Fluência de escrita: Copiar o maior número possível de frases em um minuto;
  • Leitura de palavras.
Os alunos foram avaliados por colaboradores de investigação previamente treinados, num espaço silencioso da escola. Os avaliadores não tinham conhecimento do grupo a que os alunos pertenciam. As tarefas de composição escrita, ortografia e fluência foram realizadas em grupos de três a quatro alunos, enquanto as demais tarefas foram administradas individualmente.

Principais resultados:
  1. Os resultados evidenciam a eficácia do ensino integrado da leitura e escrita. O programa SRSD Plus produziu melhorias nas habilidades de escrita, conhecimento discursivo, planeamento, linguagem oral e ortografia dos alunos do primeiro e do segundo ano de escolaridade. No entanto, comparando os resultados do presente estudo com os obtidos num estudo anterior que aplicou o mesmo programa (Harris et al., 2023), os resultados observados por Kim e colaboradores (2024) foram globalmente inferiores. Segundo os investigadores, esta diferença pode dever-se ao facto de, neste estudo, o ensino da leitura e escrita ter sido realizado em grande grupo (turma), enquanto no estudo de Harris e colaboradores (2023), a instrução ocorreu em pequeno grupo. Esta poderá ter permitido maior individualização do ensino, resultando em efeitos mais expressivos.
  2. O programa SRSD Plus revelou impactos positivos na escrita de textos de opinião, principalmente na produtividade e qualidade da escrita. Embora a instrução tenha sido direccionada para a escrita de textos expositivos, os alunos mostraram capacidade para transferir as habilidades adquiridas para a produção de textos de opinião. Segundo os autores, esta transferência de conhecimento poderá estar relacionada com o ensino de estratégias comuns a ambos os tipos de texto, como a organização textual, a construção de frases claras e a inclusão de detalhes relevantes. Além disso, o ensino de estratégias de auto-regulação, vocabulário e ortografia poderá ter contribuído para esses resultados.
  3. Não foram observados efeitos significativos na leitura de palavras e fluência da escrita, apesar de o programa ter incluído treino específico nestas áreas. Este resultado pode ser explicado por dois factores. Em primeiro lugar, os alunos já apresentavam um nível de leitura dentro da média antes da implementação do programa, sem indícios de dificuldades em comparação com outros alunos, o que poderá ter limitado o potencial de melhorias adicionais nesta competência. Em segundo lugar, o tempo dedicado ao treino de fluência da escrita foi relativamente curto, somando 56-70 minutos durante o programa (8-10 minutos por sessão), o que poderá ter sido insuficiente para promover mudanças significativas nesta área.
Os resultados deste estudo mostram a eficácia do ensino integrado da leitura e escrita no ambiente de sala de aula nos primeiros anos de escolaridade. Embora a leitura e a escrita devam ser abordadas de forma independente, o ensino da leitura que não inclui oportunidades e práticas de escrita, tal como o ensino da escrita que não integra oportunidades e práticas de leitura, provavelmente prejudica a aquisição e desenvolvimento de ambas as habilidades. Os resultados deste estudo, aliados a uma vasta literatura sobre as relações entre leitura e escrita, sugerem que a Ciência do Ensino da Leitura (Kim & Snow, 2021) e os esforços políticos e de apoio à investigação devem considerar as conexões entre leitura e escrita (Graham, 2020; Kim et al., 2024).

Este texto é um resumo do artigo «The science of teaching reading is incomplete without the science of writing: A randomized control trial of integrated teaching of reading and writing», disponível aqui.

quinta-feira, 6 de novembro de 2025

Estudo-piloto ajudou a inverter atraso na linguagem dos “bebés da pandemia”

Há efeitos da pandemia que continuam presentes. As dificuldades na comunicação e na linguagem das crianças que nasceram nesse período têm sido estudadas um pouco por todo o mundo. O antídoto também. Em Portugal, um estudo-piloto numa creche de Alcabideche, em Cascais, testou a música como peça central de um plano para recuperar os atrasos identificados nestas crianças e melhorar a aprendizagem de palavras, por exemplo. Conclusão: a estratégia resultou e não só ajudou a inverter estas dificuldades nas crianças abrangidas pelo estudo, como melhorou as capacidades de aprendizagem face ao expectável. Agora, fica ainda a faltar um plano a nível nacional.“Não só diminuímos a diferença como, no final da intervenção, a idade de desenvolvimento era superior à idade cronológica”, diz Sónia Frota, coordenadora do Baby Lab, laboratório de fonética da Universidade de Lisboa que conduziu o estudo-piloto numa creche em Alcabideche – uma instituição particular de solidariedade social que pertence ao Centro Social Paroquial de São Vicente de Alcabideche.

Há vários anos que a equipa de Sónia Frota defende a realização de um rastreio nacional que identifique os atrasos no desenvolvimento da linguagem dos “bebés da pandemia”, em comparação com os bebés nascidos antes deste período. Essa avaliação nacional nunca avançou.

No entanto, alguns estudos do Baby Lab, circunscritos à região de Lisboa e Vale do Tejo, indicam, por exemplo, que há mais dificuldades na capacidade de segmentar palavras (ou seja, partir as palavras em sílabas sonoras como “pa” ou “ma”) aos 12 meses, um menor número de palavras aprendidas aos 20 meses ou obstáculos à linguagem mesmo aos 30 meses (ou seja, dois anos e meio de idade) nos bebés nascidos até Abril de 2022. Há, no fundo, uma aprendizagem mais lenta da linguagem e, por consequência, das capacidades de comunicação – atrasos esses que têm sido associados a maiores dificuldades na vida adulta. (...)

Fonte: Extrato de notícia de Público por indicação de Livresco