terça-feira, 25 de junho de 2024

Todos os viram nos ecrãs do Rock in Rio: intérpretes de língua gestual (também) deram espetáculo

Inclusão é um conceito cada vez mais presente no Rock in Rio. Os pormenores que passam despercebidos a alguns festivaleiros, são fundamentais para quem não consegue ver ou ouvir um concerto.

Certo é que, entre o público, ouvem-se com frequência comentários à prestação dos intérpretes de língua gestual portuguesa que aparecem nos ecrãs gigantes, aos olhos de todos, no Parque Tejo. “Olha, olha”, diz um festivaleiro, enquanto aponta para a tela onde dança a intérprete. Apesar de este ser o trabalho mais visível, há também quem esteja numa pequena mesa na bancada das acessibilidades a transmitir via áudio, a quem não consegue ver o espetáculo, os pormenores do que se passa em cima do palco.

“Está linda a lua”, relata Patrícia Saiago, responsável pela acessibilidade e audiodescrição, aos invisuais que se juntam na lateral da bancada.

No sábado, dia 22 de junho, bateu-se um recorde: 12 pessoas invisuais estiveram, em simultâneo, a ouvir a audiodescrição. Por média, nos quatro dias de festival, sete a oito pessoas recorreram ao serviço disponibilizado pelo Rock in Rio.

“Ontem tivemos várias pessoas aqui com deficiência visual e foi lindo ver os casais a dançar, ver as expressões…”, conta à SIC Notícias Patrícia Saiago. “Tudo isso completa a imersão”, acrescenta.

De edição para edição, o Rock in Rio tem apresentado melhorias na acessibilidade ao festival, recorrendo a meios que poucos festivais utilizam. “O Rock in Rio traz uma maior imersão a esse público [pessoas com deficiências] para tentar que eles sintam tudo da forma mais próxima possível”, diz a responsável pela acessibilidade.

O serviço de audiodescrição, utilizado pela primeira vez nesta edição da Cidade do Rock, é exclusivo ao Palco Mundo. Já a tradução dos concertos por intérpretes de língua gestual acontece em dois palcos, de forma diferente: no principal, através dos ecrãs gigantes, e no Palco Galp (o secundário) com a presença do próprio intérprete na frente de palco, em contacto direto com o público.

As palavras e emoções dos artistas nacionais e internacionais que pisam estes dois palcos passam pelas mãos dos sete intérpretes de língua gestual portuguesa que compõem o grupo. É deles o corpo que exalta a alegria ou a tristeza do momento, são deles as ancas que vão marcando o ritmo da canção.

A preparação é meticulosa. Para além do número exigente de concertos, é preciso tempo para ler as letras, ouvir as músicas, antes de o espetáculo arrancar. Nos intervalos, e se houver acesso prévio à setlist dos artistas, é tempo de ensaiar. Por concerto, na pequena sala de onde são lançados para o Palco Mundo estão três intérpretes.

“Nem sempre é fácil. Gostávamos de ter acesso à setlist com um bocadinho mais de antecedência para podermos preparar melhor o nosso trabalho, mas tentamos sempre fazer o melhor”, conta a intérprete Ângela Ricardo.

Na sala, estavam também Ana Rita Amaral e Márcio Antunes. Preparavam-se para o concerto de Ne-Yo, depois do espetáculo da espanhola Aitana.

“Tentamos passar ao máximo o que se está a viver em cima do palco. Quando o cantor é mais emotivo, mais expressivo”, acrescenta a intérprete em entrevista à SIC Notícias.

O trabalho desta equipa de sete intérpretes não tem passado despercebido e o feedback não tem partido apenas de pessoas surdas que têm assistido ao festival.

“Há pessoas que não percebem nada de língua gestual mas que gostavam de ver o nosso entusiasmo a trabalhar”, conta.

O ciclo está-se a quebrar, diz a responsável pela acessibilidade. Há cada vez mais pessoas que participam no Rock in Rio por saberem que, à espera, têm uma experiência inclusiva.

Fonte: SIC Notícias, com vídeo, por indicação de Livresco

sexta-feira, 21 de junho de 2024

Como adaptar o ensino da leitura às necessidades dos alunos

Introdução

Adaptar o ensino da leitura ao progresso dos alunos é uma tarefa desafiadora, especialmente devido à diversidade de necessidades, dificuldades e níveis de desempenho. Parsons et al. (2018) destacam que os professores eficazes reconhecem a relação bidirecional entre o ensino e o desempenho, ou seja, que o ensino da leitura influencia o desempenho dos alunos, e que este influencia as estratégias de ensino. No entanto, a investigação desta relação ainda é limitada, não estando claro de que forma os professores ajustam as suas estratégias ao longo do ano para atender às necessidades dos alunos e promover a leitura.

Alguns estudos, como os de Carlisle et al. (2011) e Ruotsalainen et al. (2022a, 2022b), exploraram a relação entre o desempenho dos alunos e o ensino da leitura. Os autores sugerem que alunos com desempenhos mais baixos beneficiam de uma abordagem mais estruturada e com instruções explícitas, enquanto os que têm melhor desempenho beneficiam de uma aprendizagem mais independente e auto-dirigida. No entanto, Ruotsalainen et al. (2023), juntamente com Connor et al. (2004), Juel e Minden-Cupp (2000), Nurmi et al. (2013) e Pressley et al. (2001), consideram que esses estudos não abordaram dois aspectos fundamentais: i) a variação das estratégias e métodos de ensino ao longo do ano lectivo; e ii) a influência do desempenho dos alunos na seleção dessas estratégias e métodos.

Genericamente, os investigadores consideram que o desempenho dos alunos pode determinar o ritmo do ensino, bem como as actividades e métodos utilizados, mas sublinham a necessidade de um entendimento mais profundo desta relação.

O estudo de Ruotsalainen e colaboradores (2023)

Ruotsalainen et al. (2023) procuraram colmatar as lacunas da investigação, explorando a relação bidireccional entre o desempenho dos alunos e o ensino a leitura, ao longo de um ano lectivo do 1.º ano de escolaridade. Para o efeito, analisaram os dados de um estudo realizado na Finlândia, em 2016, por Lerkkanen e Pakarinen. Nesta investigação, os investigadores gravaram (em vídeo) aulas de leitura de 30 turmas, abrangendo, no total, 537 alunos do primeiro ano de escolaridade. Em cada turma gravaram-se duas aulas: a primeira no Outono (Momento 1) e a segunda na Primavera (Momento 2). Cada aula teve uma duração de 28 a 80 minutos (média de 41,55 minutos) no Momento 1, e de 22 a 76 minutos (média de 37,32 minutos) no Momento 2. As actividades realizadas em cada aula foram codificadas pelos investigadores a partir das directrizes do sistema de observação «Individualizando a Instrução do Aluno» (Individualizing Student Instruction, de Connor et al., 2010).

A codificação das actividades de ensino da leitura teve em conta dois parâmetros. Por um lado, a gestão das actividades, distinguindo entre i) actividades geridas pelo professor e pelos alunos (AGPA) e ii) actividades geridas apenas pelos alunos (AGA). Por outro lado, o tipo de actividades realizadas, em particular as i) de descodificação (DES), isto é, relacionadas com o conhecimento de letras, consciência fonológica, soletração e fluência de leitura; e as ii) centradas no significado (SIG), incluindo actividades relacionadas com o vocabulário, gramática, compreensão oral e compreensão da leitura. Os investigadores avaliaram, ainda, o desempenho dos alunos em fluência (precisão e velocidade, especificamente) e compreensão da leitura, nos dois momentos do estudo, Outono (entre Setembro e Dezembro) e Primavera (entre Fevereiro e Maio).

Principais Resultados e Conclusões
  1. O desempenho dos alunos na leitura e as actividades realizadas em sala de aula não têm uma relação bidireccional. Existe, porém, uma relação unidireccional, já que os professores tentam adaptar o ensino ao nível de conhecimento dos alunos. Especificamente, alunos com melhor desempenho em leitura no início do ano realizam, na Primavera, actividades centradas no significado, sem ajuda do professor (AGA-SIG); enquanto alunos com mais dificuldades no início do ano realizam, na Primavera, actividades centradas na descodificação e orientadas pelo professor e pelos alunos (AGPA-DES).
  2. As actividades realizadas no início do ano lectivo (combinando gestão e tipo: AGPA-DES, AGPA-SIG, AGA-DES e AGA-SIG) não estão relacionadas com a proficiência de leitura na Primavera. No entanto, algumas actividades do Outono têm relação com a compreensão de leitura na Primavera.
Os resultados do estudo sugerem que actividades centradas no significado e orientadas pelo professor e pelos alunos (AGPA-SIG), realizadas no início do ano, podem estar relacionadas com melhores níveis de compreensão de leitura na Primavera, e que actividades centradas no significado, geridas por professores e alunos, são fundamentais para a aprendizagem, promovendo o vocabulário e estratégias de compreensão (Connor et al., 2020; Kikas et al., 2018; Lerkkanen et al., 2016). A realização de actividades como fazer perguntas relacionadas com o texto e explicar o significado das palavras de uma história pode promover a aquisição e desenvolvimento do vocabulário e a compreensão dos alunos.

Apesar da correlação positiva entre actividades centradas na descodificação, realizadas sem ajuda do professor (AGA-DES) no Outono, e o desempenho na leitura, essas actividades não estão relacionadas com a compreensão de leitura na Primavera. Verificou-se mesmo uma relação negativa entre actividades AGA-DES no Outono, e a compreensão na Primavera, podendo concluir-se que a persistência excessiva na descodificação leva à redução do tempo disponível para actividades centradas no significado, prejudicando a compreensão (Connor et al., 2004, 2013; Kikas et al., 2018; Lerkkanen et al., 2016). Além disso, a repetição excessiva de exercícios pode causar comportamentos disruptivos e diminuir o interesse pela leitura (Kikas et al., 2018; Ponitz & Rimm-Kaufman, 2011; Schwanenflugel et al., 2009).

Em resumo, os resultados sugerem que o nível de desempenho dos alunos assume um papel fundamental na forma como o professor organiza o ensino da leitura. Mais importante ainda, recomendam o investimento em actividades centradas no significado, nomeadamente actividades de vocabulário e de compreensão, mesmo que nem todos os alunos da turma sejam leitores fluentes. Dito de outra forma, o peso excessivo na descodificação pode, a partir de um certo ponto, ser mais prejudicial do que benéfico para o objectivo fundamental da leitura, que é a compreensão do texto.

Célia Oliveira e Soraia Araújo

quinta-feira, 20 de junho de 2024

Os desafios da integração numa escola cada vez mais diversa

Em dez anos, o número de alunos de origem imigrante a frequentar os três níveis de ensino em Portugal passou de 100 mil para 180 mil. Um facto que garante escolas cada vez mais diversas mas que também levanta desafios de integração

Nunca tantos alunos estrangeiros frequentaram as escolas portuguesas. No ano letivo2023/2024, e apenas do pré-escolar ao secundário, foram mais de 130 mil alunos com origem imigrante. Nos últimos anos houve uma verdadeira “explosão” de nacionalidades nas escolas, uma realidade que, para Pedro Freitas, investigador no departamento de Economia da Educação da Nova SBE, espelha uma abertura ao mundo mas que também coloca desafios. Este foi um dos temas em análise no episódio desta semana do Educar tem Ciência, um projeto da Iniciativa Educação em conjunto com a TSF e o Dinheiro Vivo.

“Se olharmos só para o ensino básico, esse número passou de 49 mil em 2010/2011, para cerca de 81 mil em 2020/2021, ou seja, não dobrou mas anda lá perto”, assume Pedro Freitas, lembrando que a composição do leque de nacionalidades também está a mudar. Os principais países de proveniência continuam a ser Brasil, Cabo Verde, Angola, Ucrânia e Guiné Bissau, mas foi registada uma subida significativa de outras nacionalidades. “Neste grupo, em 2010/2011 havia apenas 7 mil alunos e agora existem cerca de 21 mil”, explica o investigador.

Diversidade de resultados

“Quando olhamos para estes alunos, os resultados não são o que gostaríamos que fossem”, alerta Pedro Freitas. Os dados da última edição do PISA para Portugal mostram que, a matemática, os alunos de origem imigrante têm, em média, 32 pontos a menos do que os alunos de origem não imigrante, e em leitura têm menos 22 pontos. “Isto não tem de ser necessariamente assim”, garante o investigador da Nova SBE.

Pedro Freitas cita dois estudos recentes. O primeiro, publicado nos Estados Unidos da América, com dados da Florida, reuniu informação de mais de um milhão de alunos entre o terceiro e o décimo ano e concluiu que a presença de alunos imigrantes na sala de aula aparecia associada a melhores resultados de toda a turma. “Os alunos de origem imigrante têm objetivos de longo prazo, mais definidos por virem de famílias que imigraram com uma vontade de melhorar as suas vidas. O facto de serem alunos focados e com objetivos definidos acaba por ter um efeito comportamental nos seus colegas”, explica.

Na Noruega, outro estudo analisou cerca de 200 mil alunos do quinto ano e um grupo específico de alunos imigrantes - os alunos refugiados. “O estudo mostra que ter alunos de origem imigrante na sala de aula leva a melhores resultados a norueguês e a inglês, mas a piores resultados a matemática”, conta Pedro Freitas. Para os investigadores, o que marca a diferença é o apoio extra que estes alunos têm em norueguês e inglês. “E isso permite-me fazer a ponte com o caso português”, diz Pedro Freitas para quem há que conciliar a integração com os colegas e um período de transição que garanta a aprendizagem da língua. “É onde estamos a falhar. Integramos os alunos diretamente nas turmas e muitas vezes estes apoios extra são dados com menor intensidade ou menor frequência do que devíamos ter”.

“O que alguns estudos nos mostram é que a integração destes alunos deve ser feita de forma intensiva: é importante que fora da sala de aula existam momentos de apoio estruturados e intensivos que permitam, sobretudo nos primeiros tempos, que estes alunos possam ter uma aprendizagem imersiva da língua”, defende Pedro Freitas. Só com esta aprendizagem imersiva poderão ter uma melhor convivência com os colegas portugueses e contribuir para a aprendizagem de todos, continua, lembrando casos como o do Reino Unido, onde os resultados do PISA 2022 mostraram que os alunos imigrantes de segunda geração têm melhores resultados do que os alunos de origem inglesa, e os alunos imigrantes de primeira geração têm resultados inferiores aos dos alunos britânicos, mas essa diferença é curta.

quarta-feira, 19 de junho de 2024

Mais de um quarto dos jovens tem medo do que os outros pensam de si nas redes sociais

Mais de um quarto dos jovens portugueses admite ter medo do que os outros pensam quando publica ou partilha algo nas redes sociais e cerca de 18% admite ficar angustiado com o que lhe escrevem nos comentários.

As conclusões são resultado de um inquérito a 1.500 jovens (amostra representativa da população portuguesa entre os 18 e os 30 anos), incluído no projeto de investigação MyGender - Práticas de Jovens Adultos Mediados, da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (FLUC).

De acordo com os resultados a que a agência Lusa teve acesso, apesar de mais de metade dos jovens assumir sentir-se confiante com aquilo que publica nas redes sociais (58,6%) e não se preocupar com o que os outros pensam das suas publicações (50,5%), apenas quase um terço assume ter a certeza de que os seus seguidores gostam do que publica.

Para além do medo do que os outros possam pensar deles nas redes sociais, quase um quinto (18,4%) dos inquiridos admite que lhe causa angústia ver o que escrevem nos comentários das suas redes sociais e mais de um quarto (26,6%) assume que se irrita a ler o que as outras pessoas publicam nas redes sociais.

Apesar disso, há também uma parte significativa (19,7%) que admite que já insultou pessoas nas redes sociais e 14,3% diz que quando não gosta do que lê ou vê deixa comentários críticos.

Segundo o estudo, cerca de 28% dos jovens portugueses assume que passa "muitas horas a ver o que outras pessoas partilham sobre a vida delas", com quase um terço (32,5%) a assumir que fica com ansiedade quando não tem o telemóvel.

O inquérito realizado para o projeto MyGender demonstra que o telemóvel é, de longe, o principal meio a que têm acesso (92,8%), seguido do computador (84,1%) e da televisão (78,5%).

O telemóvel é também aquele que os jovens usam com maior regularidade (90,2% todos os dias). No que toca às utilizações, os jovens vão sobretudo às redes sociais (mais de 80% todos os dias), veem séries (mais de 70% diariamente ou várias vezes por semana) e 'playlists' de músicas (mais de 60% todos os dias ou várias vezes por semana).

Mais de 50% dos jovens gasta entre duas a cinco horas diárias em aplicações

Mais de metade dos utilizadores (59,9%) gasta entre duas a cinco horas diárias em aplicações móveis, em que as mais usadas são as redes sociais (apesar de as considerarem como apenas a sexta aplicação mais importante), seguidas de email e mensagens, todas acima dos 60% de utilização diária.

Se a maior parte dos jovens utiliza as aplicações para criar ou partilhar conteúdo 'online', esse é sobretudo em forma de fotografia (62,3%), com o vídeo a representar 12,7% e o texto apenas 8,2% dos conteúdos criados.

Os jovens são uma espécie de "cobaias digitais", que vivem "completamente imersos na tecnologia", à medida que ela se foi desenvolvendo, com a realidade digital e física a pertencerem ao mesmo "contínuo", afirmou à agência Lusa Inês Amaral, que coordena o projeto juntamente com Rita Basílio Simões.

Segundo o inquérito, 66% joga em aplicações móveis, 42,4% usa aplicações para controlar os seus dados de saúde e 36% planeia o seu treino físico no mesmo meio.

Do universo da amostra do inquérito realizado no final de 2021, a maioria afirma-se heterossexual (83,5%), solteiro (76,3%), sem filhos (83,5%) e a viver com os pais ou familiares (63,5%).

Mais de metade tem ensino superior (53,1%), cerca de metade trabalha por conta de outrem e um pouco mais de um quarto (28,3%) da amostra é estudante. Para além do inquérito, o projeto incluiu entrevistas, grupos focais, diários e análise das próprias aplicações. O MyGender afirma-se como o primeiro estudo em Portugal a investigar como os jovens adultos se envolvem com a tecnicidade e os imaginários das aplicações móveis.

Fonte: SIC Notícias por indicação de Livresco

terça-feira, 18 de junho de 2024

"O bullying não é brincadeira". Casos de crianças com comportamentos autolesivos estão a aumentar

"O bullying que existe nas escolas não é uma brincadeira", alertou, esta quarta-feira, a presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ), Rosário Farmhouse, durante uma audição parlamentar na Comissão de Educação para analisar o dever de reporte das escolas face às suspeitas de violência sobre crianças.

Rosário Farmhouse revelou que as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) receberam "um aumento enorme de comportamentos autolesivos, grande parte delas vítima de bullying, de qualquer tipo de bullying, mas muito deste bullying que os pais não tem noção do que se está a passar, porque é mais invisível e só em casos extremados é que se apercebem".

Farmhouse referia-se ao "bullying social", dando como exemplos histórias em que todos os colegas da turma são convidados para uma festa menos um: "Ela percebe que foram todos a uma festa e ela foi excluída. E fazem-no sistematicamente".

"O bullying social é mais invisível mas tem trazido consequências enormes nas crianças, principalmente com comportamentos autolesivos", alertou, voltando a reforçar que o bullying é muitas vezes desvalorizado pelos próprios colegas, "que acham que é só a brincar". "Não é a brincar quando se faz um ato repetido, quando se exerce poder e quando a outra pessoa não quer, sejam humilhações, violência verbal ou física", salientou.

Alguns destes casos chegam à Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), que hoje também esteve no parlamento e disse receber em média oito denúncias por dia de famílias que se queixam de falta de apoio por parte das escolas quando sentem que os seus filhos são vítimas de um qualquer tipo de agressão.

"As crianças são confrontadas com formas perversas de violência dolorosas", disse David Cotrim, da APAV, apontando como as situações mais comuns na escola a indisciplina em sala de aula, os comportamentos antissociais e delinquentes, o bullying e atos de agressão contra profissionais de educação.

Apesar das críticas, tanto a coordenadora nacional das CPCJ como o representante dos diretores escolares Filinto Lima, defenderam que são "casos pontuais" aqueles que não são reportados às autoridades.

Dez mil casos de crianças em perigo

No ano passado, as escolas denunciaram quase dez mil casos de crianças em perigo às comissões de proteção de menores: Houve "9.929 comunicações de perigo vindas diretamente das escolas", disse Rosário Farmhouse, citando dados do relatório anual que será entregue ainda este mês no parlamento.

Este número revela um aumento em relação a 2022, quando houve 9.082 comunicações à CPCJ por parte de estabelecimentos de ensino, acrescentou a deputada Isabel Mendes Lopes, do Livre, partido que requereu a audição parlamentar de hoje.

Durante a audição, a presidente nacional das CPCJ aproveitou ainda para alertar para o modelo de proteção de dados que "muitas vezes protege os dados e não protege as pessoas".

Farhmouse disse que tal como está desenhada a legislação, a comissão nacional acaba por ter muita dificuldade em ter acesso a informações básicas, mesmo "quando uma criança está desaparecida".

Questionados por um tribunal sobre se existem processos a favor da criança desaparecida, "nós temos de dizer ao tribunal que escreva para as 312 comissões para saber se existe processo porque não temos acesso a isso", lamentou a presidente, apelando a um modelo semelhante ao de outros países, onde "são bastante mais protetores das crianças".

"As nossas plataformas correm o risco de serem vedadas pela proteção de dados de não termos este acesso transversal aos dados, respeitando na integra os dados das crianças, mas por uma questão de proteção das crianças termos acesso para as melhor proteger", concluiu.

Fonte: JN por indicação de Livresco

sábado, 15 de junho de 2024

Conectados ou desconectados? O impacto dos dispositivos digitais no desempenho académico e bem-estar dos estudantes

Um relatório recente da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), com dados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) 2022, destaca dois aspetos-chave da relação entre as tecnologias digitais e o desempenho académico. Por um lado, o uso intencional e direcionado das tecnologias digitais em atividades de aprendizagem está associado a melhor rendimento académico, tanto em Portugal como na média da OCDE. Por outro, o uso excessivo de dispositivos digitais (smartphones, tablets, computadores, etc.) em atividades de lazer prejudicou o desempenho dos alunos.

Efeitos na literacia matemática

Em Portugal, os alunos que usaram dispositivos digitais até uma hora por dia em atividades de aprendizagem e lazer tiveram melhores resultados em literacia matemática, em comparação com alunos que não os usaram ou que os usaram de uma a três horas por dia (ver Figura 1). A diferença na pontuação a Matemática entre os alunos que os usaram uma hora por dia comparando com os que os usaram mais de sete horas diárias em atividades de aprendizagem é de 41 pontos — equivalente a cerca de um ano e meio de aprendizagem. Os alunos que usaram dispositivos entre uma e duas horas por dia em atividades de lazer obtiveram 68 pontos a mais em Matemática, quando comparados com alunos que os usaram de cinco a sete horas por dia. Esta diferença equivale quase a três anos de aprendizagem. Observaram-se tendências semelhantes, ainda que menos acentuadas, na média da OCDE.

Figura 1. Pontuação média a Matemática vs. Tempo de utilização de dispositivos digitais

Estes resultados indicam um efeito claramente nefasto da utilização excessiva (mais de três horas por dia) na escola, para atividades sejam de aprendizagem, sejam de lazer.

Efeitos na distração

Os resultados observados na Figura 1 podem explicar-se, pelo menos em parte, com o efeito distrator do uso excessivo de dispositivos digitais. Em média, dois em cada três alunos (65%) da OCDE disseram distrair-se quando usam dispositivos digitais em pelo menos algumas aulas de Matemática. Em Portugal, a percentagem é ainda maior: 73%. Além disso, cerca de 60% dos alunos da OCDE indicaram que, em pelo menos algumas aulas, se distraem com outros alunos que usam dispositivos digitais, o que faz com que o professor demore mais tempo para que os alunos se acalmem e iniciem o trabalho. Em Portugal, esta percentagem de alunos distraídos pelos colegas chega aos 67%.

Este efeito distrator prejudica o rendimento dos alunos — como ilustra a Figura 2. Os resultados do PISA enfatizam, pois, a necessidade de se minimizar o efeito distrator da tecnologia na sala de aula. Quando o tempo de utilização é excessivo, os alunos podem ser facilmente distraídos por tentarem realizar várias tarefas ao mesmo tempo, desviarem as atenções para outro software ou para as atividades disponíveis nos dispositivos, usar o navegador da internet para atividades não-académicas, entrar em redes sociais, receber notificações de chat, etc.

Figura 2. Diferença (pontos) nas pontuações de Matemática


Estes resultados complicam o debate acerca do uso destas ferramentas no ensino e na aprendizagem. Se, por um lado, os recursos digitais expandem o acesso a atividades interativas e a simulações, dão feedback imediato e permitem aceder a conteúdos digitais que podem facilitar a aprendizagem, por outro a possibilidade de se realizar tarefas sem relação com a aula pode prejudicar a concentração e a realização das atividades propostas.

Neste contexto, o principal problema identificado é a distração causada por outros alunos que usam dispositivos digitais. Em Portugal, os alunos que reportaram distrair-se com colegas em pelo menos algumas aulas de Matemática tiveram, em média, 27 pontos a menos no PISA (equivalente a um ano de escolaridade) do que os colegas que nunca se distraíram (a mesma diferença na média da OCDE é de 22 pontos).

O relatório da OCDE destaca ainda que nem todos os dispositivos contribuem de igual modo na distração. Os alunos que usam frequentemente smartphones na escola são mais suscetíveis de perder a concentração, ao passo que o uso de software educativo apresenta uma associação negativa mais moderada.

Estas observações corroboram estudos recentes que indicam ser tão importante o que os jovens consomem nos ambientes digitais quanto o tempo que passam neles. É irónico que os países menos desenvolvidos procurem aumentar o acesso a recursos educativos digitais, enquanto os mais ricos se preocupam com o uso excessivo de ecrãs, conteúdos comerciais e tecnologias que invadem a autonomia e a privacidade [1].

Efeitos no bem-estar

O relatório também aborda o bem-estar dos alunos relacionado com a disponibilidade e o uso dos equipamentos digitais. Um em cada dois alunos da OCDE refere sentir-se nervoso e ansioso sem o smartphone. Em Portugal, esta percentagem é de 45%, sendo mais acentuada nas raparigas (43%, comparados com 32% nos rapazes). Embora esta ansiedade tenha impacto negativo na aprendizagem, a diferença na literacia matemática entre alunos ansiosos e não-ansiosos é relativamente moderada na média da OCDE (menos 8 pontos). Em Portugal, esta diferença, de menos 16 pontos, é o dobro.

Além disso, os alunos que não reportam ansiedade na ausência do smartphone apresentam melhores indicadores de satisfação com a vida, resistência ao stresse e controlo emocional, com diferenças particularmente relevantes (0,7 desvios-padrão) na satisfação com a vida. Isto evidencia que a ansiedade causada pela não-proximidade do smartphone condiciona muitíssimo o bem-estar psicológico dos jovens que participaram no PISA 2022, com implicações tanto no seu desempenho académico quanto no seu funcionamento socioemocional.

Figura 3. Diferença entre indicadores de desempenho e bem-estar

O que devem fazer as escolas?

A pandemia de covid-19 demonstrou a importância da educação digital, com aulas remotas e ferramentas e aplicações educacionais a tornarem-se componentes essenciais da aprendizagem. Ficou claro, porém, que as disparidades no acesso a dispositivos e à internet, bem como as limitadas competências digitais de alunos e professores, prejudicaram a aprendizagem nesse período.

Embora as competências digitais sejam fundamentais na cidadania atual, o uso excessivo de recursos digitais na escola pode ter consequências negativas nas aprendizagens e no bem-estar dos alunos. Contudo, a solução não parece ser, pelo menos em grande medida, por proibir os dispositivos digitais, em particular os smartphones, no espaço escolar. Os dados do PISA sugerem que estas proibições podem ser eficazes, embora muito dependa da sua implementação. Mesmo em escolas com proibição de smartphones, 29% dos alunos da OCDE disseram usar estes equipamentos várias vezes ao dia; 21% usam-nos todos ou quase todos os dias na escola.

Em Portugal, apenas 15% dos alunos que participaram no PISA indicaram frequentar escolas onde não se permitem smartphones no recinto escolar; na OCDE, a percentagem é de 34%. Ainda assim, em Portugal, estes alunos tiveram em média mais 8 pontos a Matemática (o que não é significativo) do que os colegas que frequentavam escolas sem essa proibição.

Para equilibrar os benefícios e desafios da tecnologia digital, as escolas podem adotar várias estratégias. Podem começar por integrar os recursos digitais de forma cuidadosa e equilibrada nos programas escolares, garantindo que os alunos tenham acesso a uma variedade de perspetivas e opiniões, com sentido crítico na avaliação da informação online. Além disso, é importante dar orientações claras de uso responsável e ético da tecnologia, ensinando os alunos a gerir as distrações, respeitar a propriedade intelectual e proteger a saúde mental. Algumas escolas já proíbem os smartphones nas salas de aula para minimizar os efeitos nefastos da tecnologia digital, promover as interações presenciais e prevenir a fraude académica.

Estas políticas visam criar um ambiente de aprendizagem focado, desenvolver habilidades interpessoais, manter a integridade académica e garantir uma atmosfera ética, segura e inclusiva. As escolas podem ainda dar apoio adicional aos alunos que precisem de ajuda para lidar com os desafios da tecnologia, como a dependência digital ou o ciberbullying. Estas abordagens, combinadas, podem ajudar a maximizar os benefícios da tecnologia digital, mitigando os seus impactos negativos.

Considerações finais

É crucial abordar as preocupações com o bem-estar dos alunos associadas ao uso de dispositivos digitais, tais como a ansiedade causada pela dependência dos smartphones, que pode afetar negativamente o desempenho académico e o bem-estar emocional.

Embora se possa considerar a proibição total de dispositivos digitais nas escolas, os dados do PISA sugerem que a sua eficácia pode variar. É importante adotar abordagens equilibradas que integrem os recursos digitais nos programas escolares, promovendo o uso responsável e ético da tecnologia e dando apoio a professores e alunos para lidarem com os desafios que ela apresenta.

Em última análise, as escolas desempenharão um papel fundamental na preparação dos alunos para o mundo digital, garantindo que estes desenvolvam competências críticas para navegar nesse ambiente, sem deixarem de proteger o bem-estar e promovendo um ambiente de aprendizagem saudável.

Referências bibliográficas

Lissak, G. (2018). Adverse physiological and psychological effects of screen time on children and adolescents: Literature review and case study. Environmental Research, 164, 149-157. https://doi.org/10.1016/j.envres.2018.01.015

Livingstone, S., Lemish, D., Lim, S. S., Bulger, M., Cabello, P., Claro, M., … e Wei, B. (2017). Global perspectives on children’s digital opportunities: An emerging research and policy agenda. Pediatrics, 140(Supplement_2), S137-S141. https://doi.org/10.1542/peds.2016-1758S

OECD. (2024). Students, digital devices and success (OECD Education Policy Perspectives n.º 102), OECD Publishing, Paris. https://doi.org/10.1787/9e4c0624-en

Yu, D. J., Wing, Y. K., Li, T. M. H., e Chan, N. Y. (2024). The Impact of Social Media Use on Sleep and Mental Health in Youth: a Scoping Review. Current Psychiatry Reports, 26(3), 104-119. https://doi.org/10.1007/s11920-024-01481-9

João Marôco

sexta-feira, 14 de junho de 2024

Realização da despesa relativa aos contratos de cooperação no âmbito dos centros de recursos para a inclusão para o ano letivo de 2024-2025

A Resolução do Conselho de Ministros n.º 75/2024 autoriza a Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares a realizar a despesa relativa aos apoios financeiros aos centros de recursos para a inclusão, decorrentes da celebração de contratos de cooperação para o ano letivo de 2024-2025, até ao montante global de 13 112 500 EUR.

Realização da despesa relativa aos contratos de cooperação a celebrar no âmbito da educação especial para o ano letivo de 2024-2025

A Resolução do Conselho de Ministros n.º 74/2024 autoriza a Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares a realizar a despesa relativa aos apoios financeiros decorrentes da celebração de contratos de cooperação com os estabelecimentos de ensino particular de educação especial, com as cooperativas e as associações de ensino especial e com as instituições particulares de solidariedade social, para o ano letivo de 2024-2025, até ao montante global de 9 650 000 EUR.

quarta-feira, 12 de junho de 2024

"Bullying nas escolas não é brincadeira." Há "um aumento enorme" de crianças com comportamentos autolesivos

As comissões de proteção das crianças e jovens estão a receber cada vez mais casos de crianças com comportamentos autolesivos, muitas delas vítimas de bullying nas escolas, alertou esta quarta-feira a presidente da comissão nacional.

"O bullying que existe nas escolas não é uma brincadeira", afirmou a presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ), Rosário Farmhouse, durante uma audição parlamentar na Comissão de Educação para analisar o dever de reporte das escolas face às suspeitas de violência sobre crianças.

Rosário Farmhouse revelou que as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) receberam "um aumento enorme de comportamentos autolesivos, grande parte delas vítima de bullying, de qualquer tido de bullying, mas muito deste bullying que os pais não tem noção do que se está a passar, porque é mais invisível e só em casos extremados é que se apercebem".

Farmhouse referia-se ao "bullying social", dando como exemplos histórias em que todos os colegas da turma são convidados para uma festa menos um: "Ela percebe que foram todos a uma festa e ela foi excluída. E fazem-no sistematicamente".

"O bullying social é mais invisível, mas tem trazido consequências enormes nas crianças, principalmente com comportamentos autolesivos", alertou, voltando a reforçar que o bullying é muitas vezes desvalorizado pelos próprios colegas, "que acham que é só a brincar".

"Não é a brincar quando se faz um ato repetido, quando se exerce poder e quando a outra pessoa não quer, sejam humilhações, violência verbal ou física", salientou.

Alguns destes casos chegam à Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), que também esteve no parlamento e disse receber em média oito denúncias por dia de famílias que se queixam de falta de apoio por parte das escolas quando sentem que os seus filhos são vítimas de um qualquer tipo de agressão.

"As crianças são confrontadas com formas perversas de violência dolorosas", disse David Cotrim, da APAV, apontando como as situações mais comuns na escola a indisciplina em sala de aula, os comportamentos antissociais e delinquentes, o bullying e atos de agressão contra profissionais de educação.

Apesar das críticas, tanto a coordenadora nacional das CPCJ como o representante dos diretores escolares Filinto Lima, defenderam que são "casos pontuais" aqueles que não são reportados às autoridades.

No ano passado, as escolas denunciaram quase dez mil casos de crianças em perigo às comissões de proteção de menores: Houve "9.929 comunicações de perigo vindas diretamente das escolas", disse Rosário Farmhouse, citando dados do relatório anual que será entregue ainda este mês no parlamento.

Este número revela um aumento em relação a 2022, quando houve 9.082 comunicações à CPCJ por parte de estabelecimentos de ensino, acrescentou a deputada Isabel Mendes Lopes, do Livre, partido que requereu a audição parlamentar.

Durante a audição, a presidente nacional das CPCJ aproveitou ainda para alertar para o modelo de proteção de dados que "muitas vezes protege os dados e não protege as pessoas".

Farhmouse disse que tal como está desenhada a legislação, a comissão nacional acaba por ter muita dificuldade em ter acesso a informações básicas, mesmo "quando uma criança está desaparecida".

Questionados por um tribunal sobre se existem processos a favor da criança desaparecida, "nós temos de dizer ao tribunal que escreva para as 312 comissões para saber se existe processo porque não temos acesso a isso", lamentou a presidente, apelando a um modelo semelhante ao de outros países, onde "são bastante mais protetores das crianças".

"As nossas plataformas correm o risco de serem vedadas pela proteção de dados de não termos este acesso transversal aos dados, respeitando na integra os dados das crianças, mas por uma questão de proteção das crianças termos acesso para as melhor proteger", concluiu.

Fonte: RR

terça-feira, 11 de junho de 2024

Educação Inclusiva – Um direito Inegociável


INTRODUÇÃO

A salvaguarda de que todas as crianças e jovens têm direito a uma educação de qualidade, que respeite a sua individualidade, leva-nos a refletir sobre o que tal implica em diferentes domínios, nomeadamente ao nível do papel dos decisores, da organização das escolas e respetivos espaços, dos ambientes de aprendizagem, da gestão do currículo e das competências a desenvolver, da finalidade das avaliações das aprendizagens, da natureza e colaboração entre todos os agentes educativos, da gestão dos recursos humanos e materiais, dos intervenientes internos e externos e das vozes que devem ser respeitadas.

Por outro lado, urge, a diferentes níveis da intervenção educativa, que nos questionemos sobre os valores que nos devem reger e sobre as práticas que desenvolvemos, no sentido de procurar garantir que toda e qualquer escolha que façamos respeita aquela que deve ser uma educação que seja capaz de garantir a inclusão de todos e de cada um e a equidade no acesso às aprendizagens.

A Escola deve pois assumir-se como o espaço onde se aprende a respeitar a diversidade, onde se aprende a conhecer outras culturas e línguas, outros hábitos, outras vivências, outras realidades. A Escola é o espaço privilegiado da construção da comunidade que se torna mais rica, na medida em que aceita a riqueza que decorre da diversidade.

Este E-book surge então no âmbito do Seminário: Educação Inclusiva – um direito inegociável, realizado no ISEC Lisboa, em maio de 2023.

Este seminário teve como grande objetivo o debate e a reflexão em torno da Inclusão em vários contextos e sob diferentes perspetivas. O intuito desta iniciativa foi ainda o de abordar a temática de forma diversificada, holística, realçando a forma como, ao momento, é entendida a Inclusão: enquanto “processo que visa responder à diversidade das necessidades e potencialidades de todos e de cada um dos alunos, através do aumento da participação nos processos de aprendizagem e na vida da comunidade educativa” (Dec-lei 54/2918).

Esta publicação encontra-se estruturada em duas partes: 1) Parte I - integra textos que decorrem do desenvolvimento do Seminário, sendo ainda apresentada a estrutura e organização do evento; 2) Parte II - incorpora textos que complementam a primeira parte e direcionam para outros olhares e abordagens, em diferentes contextos.

sexta-feira, 7 de junho de 2024

"Chumbos" de alunos imigrantes estão a diminuir mas ainda há 40% de insucesso

Os "chumbos" entre os estudantes estrangeiros estão a diminuir, mas ainda há 40% de insucesso entre os alunos do ensino secundário, segundo dados do ministério da Educação.

No ano letivo de 2021/2022, 60% dos imigrantes concluíram os cursos científico-humanísticos em três anos, segundo dados disponibilizados no portal Infoescolas, que se baseiam em informações reportadas pelas escolas e pelo Júri Nacional de Exames.

Nos últimos três anos, registou-se um aumento gradual dos que conseguiram concluir o secundário no tempo esperado. Em 2019/2020 eram apenas 47% e no ano seguinte já eram 54% do total. Os estrangeiros representavam apenas 6% do total de alunos do ensino secundário que frequentam as 589 escolas do continente no ano letivo 2021/22.

Nesse ano, 81% de todos os alunos inscritos conseguiram terminar o secundário sem nunca perder um ano, sendo o sucesso menos notado nas escolas situadas em zonas económica e socialmente mais desfavorecidas, conhecidas como escolas em Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP). Há uma ligeira diferença de um ponto percentual entre o universo de todos os alunos (80%) e os que frequentavam as escolas TEIP (79%).

Olhando apenas para os alunos mais carenciados, os dados mostram que frequentar uma escola que não está integrada numa zona mais pobre é benéfico, uma vez que a taxa de sucesso dos alunos que frequentam as escolas TEIP é de 75%, um ponto percentual abaixo dos alunos com Apoio Social Escolar que frequentam as outras escolas (76%).

Também entre os alunos mais pobres houve uma melhoria ao longo dos três anos em análise, passando de uma taxa de sucesso de 62% no ano letivo de 2019/2020 para 76%. Os dados mostram ainda que os alunos do curso de ciências e tecnologias são os que menos chumbam (82% terminaram no tempo esperado), seguindo-se os de Línguas e Humanidades (78%), Ciências Socioeconómicas (78%) e finalmente Artes Visuais (74%), segundo dados de 2021/2022.

quarta-feira, 5 de junho de 2024

Alunos estão a chumbar menos mas insucesso ainda é maior entre os mais pobres

O relatório "Resultados Escolares: Sucesso e Equidade", hoje divulgado, mostra que houve menos retenções e abandono escolar em todos os níveis de ensino entre 2017/18 e 2021/22.

Ao longo desses quatro anos letivos, aumentaram sempre os alunos que terminaram o ciclo de ensino no tempo esperado, sendo o 2.º ciclo o que apresenta maior percentagem de sucesso em 2022 (96%).

Por oposição, os cursos profissionais destacam-se por terem as taxas mais baixas de sucesso, com apenas 71% dos alunos a terminarem os estudos com sucesso em 2022.

Os dados dão ainda destaque aos alunos dos cursos científico-humanísticos, que registaram o maior salto: Em 2018, tinham terminado o curso sem chumbar nenhum ano apenas 60% dos alunos, mas em 2022 a percentagem subiu para 80%.

O estudo ressalva, no entanto, que esta evolução positiva nos últimos três anos, deve "ser interpretada ponderando as alterações introduzidas no quadro excecional decorrente da pandemia de covid-19".

Por causa do confinamento e do ensino à distância durante a pandemia, os exames nacionais para conclusão do ensino secundário foram suspensos e as escolas aliviaram a exigência sobre os alunos, uma vez que muitos estiveram sem acesso às aulas `online` por falta de equipamentos ou internet.

A estes casos, somaram-se todos aqueles alunos que em casa não tinham condições para trabalhar.

O estudo, hoje divulgado, analisou também a evolução dos alunos abrangidos pelo programa de Ação Social Escolar (ASE), que continuam a ter menos sucesso, mas que se vão aproximando da média nacional com o avançar da escolaridade.

Nos cursos científico-humanísticos, a diferença da taxa de sucesso entre a totalidade de alunos e os estudantes carenciados é de quatro pontos percentuais (80% para a totalidade dos alunos e 76% para os do ASE) e nos cursos profissionais é de apenas um ponto percentual (71% vs 70% entre os alunos mais carenciados).

As raparigas continuam a ter mais sucesso, segundo o relatório, que salienta que esta desigualdade tem vindo a diminuir ao longo dos últimos anos em cada ciclo de ensino.

O estudo revelou ainda que há mais insucesso nas escolas de ensino básico onde a maioria dos alunos advém de um contexto mais desfavorecido, uma regra que não se aplica no secundário, uma vez que há menos chumbos nas escolas com menos percentagem de alunos carenciados.

No ensino básico, mais de 90% dos alunos de escolas com poucas crianças com ASE nunca chumbam, enquanto nas escolas em que a maioria dos alunos tem ASE o sucesso desce para os 85% no 1.º ciclo e 86% no 3.º ciclo).

Por oposição, nos cursos científico-humanísticos de "escolas de contextos mais desfavorecidos", a taxa de sucesso é de 85%, enquanto numa escola onde há no máximo 25% de alunos com ASE, a taxa de sucesso desce para 78%.

Nos cursos profissionais, a diferença é entre 69% de sucesso numa "escola de contexto socioeconómico favorecido" para 72% numa escola onde há muitos alunos carenciados.

Numa análise por regiões, a evolução é positiva em todo o território, mas o norte volta a ser a região com taxas mais altas de sucesso por oposição ao Alentejo e Algarve.

No 1.º ciclo, a assimetria entre regiões "é evidente, com níveis de conclusão no tempo esperado entre 97% e 96% a serem obtidos no Alto Minho e no Ave, Cávado e Tâmega e Sousa em 2022, em contraste com os 84% observados no Baixo Alentejo e os 87% no Algarve", refere o estudo.

O território do Alto Minho, do Ave e do Cávado surgem sempre entre as regiões com valores mais elevados, por oposição ao sul do país.

As regiões onde há maior equidade em 2022 são Ave e Alentejo Central, em contraste com os resultados negativos observados no Baixo Alentejo e na Grande Lisboa.

Fonte: RTP

Caui, Susana e Joe mostram como é possível “Vencer Autismo”

Há 15 anos, Susana e Joe, mãe e padrasto de Caui, não tinham perspectivas de que a filha, agora com 24 anos, pudesse ser autónoma e independente, mas sempre acreditaram e foram à procura de soluções para a poderem ajudar.

Aos oito anos, esta menina, diagnosticada com autismo, não olhava nos olhos nem conseguia acompanhar o ritmo da escola, mas hoje frequenta a universidade sem qualquer adaptação curricular. Como é que Caui começou a evoluir? Quando os pais se informaram, começaram a compreender o autismo e decidiram dedicar, numa fase inicial, 32 horas semanais de intervenção personalizada.

«O verdadeiro problema do autismo não é o autismo: é a falta de compreensão da sociedade e das pessoas que cuidam de pessoas com autismo. Como ninguém compreende o autismo, ninguém consegue arranjar soluções para este desafio que temos: em casa, nas escolas, empresas ou na sociedade», afirma Joe Santos, co-fundador e CEO da Vencer Autismo, em conversa com o Sul Informação.

Ao ver como a filha conseguiu evoluir, Joe e Susana decidiram que queriam ajudar mais pessoas e fundaram a “Vencer Autismo”.

«Inicialmente, tínhamos o nosso Centro no Porto, onde seguimos 35 miúdos com autismo. Fizemos o mesmo que fizemos com a Caui, a mesma forma de atuar para ver se podíamos ajudar, e tivemos muito sucesso. 33 dos 35 tiveram melhorias incríveis, dois não conseguimos porque era um autismo mais severo e muito complicado, mas claro que não é impossível, exige é muito mais trabalho. Não é com quatro horas por semana que se consegue fazer tudo», explica Joe.

Mas sabendo que em Portugal há 50 mil pessoas com autismo, os fundadores da associação pensaram que tinham de arranjar uma forma de chegar a mais pessoas.

«Assim mudou a estratégia da “Vencer Autismo”, que passou de fazer uma abordagem terapêutica para fazer uma abordagem focada no problema».

Joe e Susana começaram a dar palestras por todo o país – e é precisamente uma dessas palestras que passa por Albufeira esta terça-feira, 4 de Junho, no Auditório Municipal, entre as 18h00 e as 20h00.

«O que nós fazemos nestas duas duas horas é explicar às pessoas, independentemente da viagem em que estejam relacionada com o autismo, como o podem compreender melhor: sejam os pais que recebem agora o diagnóstico, um professor ou alguém que só tenha curiosidade. É uma palestra que está preparada para todos os níveis de compreensão de autismo, com uma linguagem super acessível e em que conseguimos dar mais informação à sociedade para depois ser agente de transformação positiva de pessoas com autismo».

Para que estas sessões sejam gratuitas, a “Vencer Autismo” conta com o apoio da Zurich Portugal.

«Eles queriam fazer algo de bom no seu departamento de responsabilidade social e por isso juntámo-nos para fazer palestras pelo país. Eles colaboram connosco com financiamento, voluntários e tudo, para podermos levar esta ação a diferentes locais», frisa Joe.

«A “Compreender Autismo” vem no enquadramento do pilar estratégico da Zurich que tem uma agenda muito forte virada para a responsabilidade social. A Zurich nos últimos anos tem feito um sólido compromisso com a melhoria do bem-estar e da qualidade de vida das pessoas e nesse sentido a Vencer Autismo vem trazer conhecimento e compreensão no autismo e tentar ajudar na inclusão», afirma Ana Pedro, Gestora de Negócio na Zurich Portugal.

Apesar de considerar que houve, nos últimos anos, avanços, Joe admite que a desinformação em relação ao autismo «ainda é gigante».

«No início, eu e a minha mulher chegámos a dar palestras a três pais, que apareciam de braços cruzados e com um ar muito negativo e agora nós enchemos auditórios de pessoas que querem compreender mais e melhor. Já passaram nas nossas palestras mais de 80 mil pessoas e isso são números muito bons», continua o fundador da associação.

Em relação aos cuidados prestados pelo Serviço Nacional de Saúde, Joe considera que «ainda estamos muito longe do que as pessoas com autismo precisam».

«Existem algumas soluções tipificadas que estão acessíveis a todos, mas são muito insuficientes, por muitos motivos. Primeiro na escola, onde até professores de educação especial não compreendem autismo porque ninguém os ensinou. Além disso, temos um sistema médico deficitário. Quando falamos de uma pessoa com autismo severo essa pessoa precisa, no mínimo, de 5 horas de terapia. Não é de instituição, onde está com mais pessoas, é preciso individualizar para eles poderem melhorar. O que acontece é que o governo ainda não compreender ou não quer compreender. As pessoas com autismo ainda são completamente incompreendidas, podem melhorar, todas, sempre, mas claro que há algumas que precisam de muito mais intervenção especializada para obter resultado», remata.

Fonte: Sul Informação por indicação de Livresco

terça-feira, 4 de junho de 2024

Famílias passam a ter creche gratuita no privado se não houver vaga na área da freguesia

As famílias vão passar a ter acesso a creche gratuita no setor privado se não houver vaga na rede social na área da sua freguesia de residência ou trabalho, e não na área do concelho como até agora.

Em comunicado, o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social diz que a ministra Rosário Palma Ramalho aprovou novas medidas que visam alargar as possibilidades de escolha das famílias na oferta existente de apoio à infância até aos três anos.

Os pais passam assim a poder ter acesso a creches gratuitas no setor privado, se na área da freguesia de residência ou de trabalho - até agora era tida em conta a área do concelho - não existir vaga na rede social e solidária.

Segundo o comunicado, esta medida vai permitir "reduzir as deslocações entre trabalho, a creche e a residência, melhorando a qualidade da vida familiar".

Alem disso, o Governo decidiu que as creches privadas poderão "beneficiar de financiamento público complementar quando pratiquem um horário de funcionamento para além das 11 horas diárias, nos mesmos termos de que já beneficiam as creches do setor social e solidário".

As medidas aprovadas por Rosário Palma Ramalho "inserem-se no âmbito das políticas de promoção da natalidade e de incentivo às famílias a terem mais filhos, garantindo a conciliação entre trabalho, vida pessoal e familiar", adiantou.

A iniciativa de conceder creche gratuita a todas as crianças até aos três anos foi anunciada em 2022 pelo Governo de António Costa e abrangia inicialmente apenas o setor público e o social e solidário.

Em janeiro de 2023, o programa foi alargado às instituições privadas.

Fonte: DN

segunda-feira, 3 de junho de 2024

DGS lança coleção de Manuais de Atividade Física Adaptada

Uma nova coleção de oito manuais, lançada pela Direção-Geral da Saúde (DGS), através do Programa Nacional de Promoção da Atividade Física (PNPAF), procura dar resposta à escassez de recursos para profissionais no âmbito da promoção da atividade física adaptada, com o objetivo de generalizar o conceito de estilo de vida fisicamente ativo como sinal vital de saúde e bem-estar.

A coleção de Manuais de Atividade Física Adaptada foi apresentada a 28 de novembro, numa sessão online, transmitida nas redes sociais da DGS. A Diretora-Geral da Saúde, Rita Sá Machado, destacou que "este tema é uma reflexão tardia. Exige mudança. E estes Manuais são o espelho dessa mudança. A DGS é impulsionadora da mudança para uma sociedade mais inclusiva".

A Professora da Universidade de Lisboa Leonor Moniz Pereira, incontornável especialista nesta área, é a editora desta coleção que conta com autores chave em cada uma das áreas.

Visando a promoção de estilos de vida ativos, essenciais para a melhoria da condição física, da qualidade de vida e do bem-estar, a coleção de Manuais está disponível aqui:









Fonte: DGS