segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

A degola dos Inocentes

É com incredulidade que continuo a ouvir na “praça pública” as maiores incongruências sobre o caso do menor de Massamá , comentários vindos de quem não conhece minimamente os contornos do processo e que em nada contribuem para se dar o passo em frente que a justiça de menores tanto necessita.


O que a maior parte dos comentadores se esquece de referir e que traduz uma das grandes lições que se pode retirar destes processos com menores é que, quando se soma a exigência de celeridade processual inerente à Lei Tutelar Educativa que enquadra este caso com o perfil habitual dos menores presentes à Justiça de Menores , esta torna-se numa verdadeira “degola dos inocentes”.

É que a quase totalidade dos menores indiciados pela prática de crimes provém de um extrato social que não tem possibilidade de custear a contratação de advogados, sendo a sua defesa habitualmente garantida por defensores oficiosos que pouco mais podem fazer do que “pedir justiça” e, quando isso acontece , a celeridade torna-se numa armadilha para as garantias mínimas de defesa dos menores.

O cariz da jurisdição de menores e da Lei Tutelar Educativa implica uma subvalorização tutelar do menor enquanto arguido face ao desequilíbrio de meios perante o Ministério Público , entidade que controla a produção da prova na fase de Inquérito e que, perante a habitual “ausência” de defesa dos menores em Audiência, se habituou a ver o Tribunal ratificar sistematicamente a prova por si apresentada , bem como a medida tutelar que propôs .

E é quanto à medida tutelar a aplicar aos menores indiciados pela prática de crimes que a Justiça de menores tem o seu ponto mais vulnerável.

Enquanto forem o Ministério Público e os Juízes de Direito a escolherem a medida tutelar em cada caso em vez de essas medidas serem propostas por equipas multidisciplinares de técnicos habilitados para o efeito na área da educação , psicologia e psiquiatria , cada medida que se aplicar pode ser um verdadeiro “tiro às cegas” de consequências imprevisíveis para a viabilidade de recuperação e reintegração dos menores.

Aos profissionais do Direito deveria competir exclusivamente assegurar a legalidade processual. Aos profissionais da educação e da saúde mental deve incumbir a escolha da medida mais adequada ao perfil de cada caso. Era assim que deveria ser.

Enquanto a Justiça de menores recusar “dar a mão” à saúde mental dificilmente se pode falar em garantias dos menores neste tipo de processos.

No caso do menor de Massamá, exemplo paradigmático de um menor perturbado sem histórico criminal comprovadamente vítima de “bullying” e a necessitar de avaliação pedopsiquiátrica, o Tribunal de Família e Menores de Sintra optou por não dar o “passo em frente”.

Pedro M. Proença
Advogado
In: Público por indicação de Livresco

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